Leia a primeira parte da entrevista aqui.
As alterações climáticas são uma realidade. O País está preparado?
Temos um passo decisivo a dar: capacitar os nossos decisores de que a ciência é fundamental. Soubemos do Leslie três dias antes e conseguimos precaver-nos. Em termos de socorro, a nossa adaptação aos desastres naturais tem sido positiva. Os números de feridos graves e mortos são cada vez menores. Temos desastres naturais que não conseguimos evitar, mas conseguimos prever onde vai ser pior. Estamos muito mais preparados e mais resilientes. O que temos feito começa a dar os seus frutos, sobretudo, nas escolas, onde ganhámos uma cultura de segurança. Já toda a gente sabe o que fazer perante um sismo. A exigência da população obrigou-nos a agir. Um dos aspectos onde demos um passo gigante foi na segurança contra incêndios em edifícios. Custa-nos chegar ao fim e dizer: isto não está em condições, é para fechar. Tivemos alguma resistência inicial, porque são equipamentos que encarecem a construção. Imagino quanto custa a segurança de uma grande superfície, mas estamos a falar de preservar a segurança de milhares de pessoas por dia. Hoje não se constrói nenhum edifício sem um projecto aprovado pelos nossos técnicos e é testado ao pormenor.
Há muitos simulacros para sismos, mas não há uma sensibilização nas escolas para a prevenção dos incêndios?
Em Pedrógão Grande muitas pessoas não faziam ideia de como se proteger. É uma lacuna que ainda temos. Faço mea culpa porque não tenho conseguido ter recursos humanos em número suficiente para fazer esse trabalho nas escolas. Defendendo eu que os incêndios previnem-se, não se combatem, temos de fazer cada vez mais essa prevenção. Portugal está numa zona sísmica. Sabe-se que um novo grande sismo irá acontecer de novo.
O País está preparado?
Cada dia que passa é menos um dia que falta para haver um grande sismo. Temos um plano de risco sísmico das duas áreas principais nesta matéria: Área Metropolitana de Lisboa e Algarve. No caso de haver um sismo em Lisboa, Leiria é o distrito de sustentação de Lisboa. Por exemplo, os bombeiros municipais de Leiria vão ocupar as instalações ou substituir o regimento de sapadores de bombeiros de Lisboa se estes ficarem inoperacionais. Se estamos preparados? Nunca estamos preparados para tudo.
E ao nível das estruturas? Os edifícios dos comandos da GNR, PSP e protecção de civil não parecem muito seguros.
Claramente. Este edifício não tem qualquer resistência sísmica. As forças de segurança e de socorro deveriam estar em construções anti-sísmicas. Isso tem vindo a ser feito paulatinamente, mas não tem chegado a tudo. Andamos num processo de construção de um novo quartel juntamente com a GNR, mas são processos muito demorados. As três forças de socorro (a Autoridade de Protecção Civil, a PSP e a GNR) [LER_MAIS]estão nos edifícios mais antigos da cidade. Não estamos numa zona de potencial risco sísmico, mas num sismo somos dos que ficarão com maiores danos nos edifícios. Independentemente de darmos as melhores condições às forças de segurança, há que transmitir à população um sentimento de segurança. Não podemos estar a dizer ‘faz o que digo e não o que eu faço’. Para exigir construções anti-sísmicas, devo dar o exemplo e isso não está a acontecer.
A parte centro/norte do distrito tem problemas graves de incêndios rurais. Temos uma população muito dispersa e envelhecida. Há pessoas que voltam ao campo e não são conhecedoras da terra. Chegam ao fim-desemana e querem fazer trabalhos que não sabem fazer, mas que viram o avô fazer. Depois cometem erros. Outro problema é a sinistralidade rodoviária. O distrito é atravessado pelas principais vias rodoviárias. Neste último ano, os números de acidentes, feridos graves e mortes têm vindo a decrescer. Gostava que se mantivessem. Normalmente, o problema dos acidentes está entre o banco e o volante.
Integrou a missão em Moçambique para apoiar as populações vítimas do ciclone Idaí. Que memórias lhe ficaram?
Era a segunda vez que estava em Moçambique em missão. Desta vez, num contexto mais devastador. O que me impressionou foi a resiliência daquela população perante a tragédia. Um dos exemplos que mais me marcou foi chegar a uma aldeia completamente isolada e ao perguntarmos se queriam que retirássemos as pessoas, o presidente da junta disse que dali não saía ninguém. ‘Preciso de x medicamentos e x alimentos até à água baixar, porque depois já vou ter acesso à horta, à fruta…’ No dia seguinte, o helicóptero da ONU deixou lá o que precisavam e as pessoas lá se mantiveram, sem exigir o que não era exigível. Outra coisa que me marcou foi a capacidade da ajuda internacional. O excelente trabalho feito pelas Nações Unidas e a capacidade que o mundo tem para ser solidário quando quer. Pela pobreza extrema, Guiné marcou-me noutra missão. As pessoas vivem muito mal, mesmo terceiro mundo. Mas, não tendo nada, são alegres e passam o dia a rir.