Não é a primeira vez que a produtora Casota deita fogo ao cenário, e, provavelmente, também não é a última, mas, no videoclipe do novo single de Surma, que chega esta sexta-feira, 7 de Outubro, a combustão tem um efeito pacificador. Destrói o passado, traz liberdade e ajuda a protagonista a existir sem amarras.
Com mais de seis minutos, “Islet” é o primeiro avanço do novo álbum de Surma. O nome da canção – um ilhéu é geralmente o resultado de um processo de erosão que cria novas formas – espelha a transformação experienciada por Débora Umbelino, pessoa e artista, dos dias de escola em Leiria até actuar em Manchester a convite dos James, já este ano.
Desta vez com letra escrita em inglês, e não em surmês, o tema entrega “uma mensagem de força” para as vítimas de bullying, diz ao JORNAL DE LEIRIA a cantora e compositora, que se inspirou nas próprias vivências para escrever “um hino” que considera “universal”.
A versão para as rádios, mais curta, fica abaixo dos três minutos.
Surma anuncia “um lado performativo” no regresso – o novo álbum, a lançar no mês de Novembro, é o segundo longa duração e surge cinco anos depois de Antwerpen, também editado pela Omnichord – e nos concertos vai “assumir uma personagem” em que está presente “a vertente da androginia”.
Pela primeira vez, a digressão conta com músicos de apoio: João Hasselberg e Pedro Melo Alves. Começa em Leiria, a 6 de Dezembro, no Teatro José Lúcio da Silva, de onde segue para Lisboa (Culturgest), Porto (Coliseu) e Braga (Gnration).
Assinado pela produtora Casota, também de Leiria, com realização de Telmo Soares, o videoclipe de “Islet” conta uma história de coragem, superação e capacidade de não ser “aquilo que o grupo de amigos ou a sociedade estão à espera”. O tom é épico e carregado de esperança.
Na cena de abertura, Débora Umbelino aparece numa sala de controlo, a observar a própria vida em ecrãs, como uma entidade externa. O caminho até ao mundo lá fora leva-a através de vários compartimentos, em que enfrenta o julgamento dos outros, destrói blocos de gelo com um taco de basebol e se oferece a um processo de metamorfose e conhecimento interior.
Os filmes Paris, Texas, de Wim Wenders, e A Voz Humana, de Pedro Almodóvar, com Tilda Swinton, estão entre as fontes que inspiraram o ambiente e a estética de “Islet”, onde também se encontram, directa ou indirectamente, influências de Bowie, Björk ou St. Vincent.
Na letra da canção, quase por sarcasmo, há uma referência a Hank Williams, ícone da música country, um dos favoritos de Débora Umbelino, e um dos motivos de incompreensão entre amigos na adolescência.
“É a maturação da minha pessoa enquanto artista”, resume, na conversa com o JORNAL DE LEIRIA. O que aí vem, no novo álbum, produzido a meias com o amigo Rui Gaspar, é mais pessoal e mostra-a mais vulnerável, mas, ao mesmo tempo, mais segura. “No momento certo”.
Entretanto, para a produtora Casota, “Islet” é o videoclipe mais ambicioso até à data. Telmo Soares, que o dirigiu, destaca a dimensão dos meios envolvidos, com cenários interiores construídos de raiz e mais de 20 pessoas em alguns momentos das gravações, que decorreram nos campos do Lis, numa fábrica nos arredores de Leiria e em instalações dos bombeiros da Ortigosa.
Baseado numa narrativa que vai aos lugares aonde a música leva Débora Umbelino, “Islet” evolui entre o real e o surreal e mistura horizontes sombrios e contemplativos com instantes vívidos e coloridos.
O resultado, segundo Telmo Soares, é “uma peça de cinema”, imaginada para suportar o retorno “em grande” de Surma.