Por estes dias, já na Aldeia Olímpica do Rio de Janeiro, Odete Fiúza prepara a participação nos Jogos Paralímpicos, evento que arranca esta quinta-feira.
A atleta de Santa Eufémia, Leiria, já nem contava com esta presença, mas o facto de os russos terem sido banidos devido ao uso recorrente de doping acabou por permitir que fosse repescada para a mais importante competição desportiva do planeta.
Odete tem noção de que se trata de um feito incrível. “Totalmente inesperado” para quem, há 23 anos, no início da carreira, nem sequer nutria uma grande paixão pela corrida. “É uma modalidade em que se sofre muito e é preciso aprender a gostar”, explica.
De tal forma que se nos primeiros anos em que se dedicou ao atletismo lhe dissessem que iria participar em seis Jogos Paralímpicos com certeza iria considerar ser uma tarefa “impossível”. “Diria que não era para mim.”
Quando falámos com esta advogada de 43 anos, ela já tinha tomado contacto com a pista do Estádio Engenhão, onde esta quinta-feira, pelas 16:45 horas portuguesas irá participar nas eliminatórias dos 1.500 metros para atletas com deficiência visual.
Apesar de somar nada menos do que 17 medalhas em Europeus e Mundiais, a verdade é que nunca chegou a um pódio nos Jogos Paralímpicos.
Em Sydney'2000 ficou perto, tendo sido quarta nos 5.000 metros e quinta nos 1.500. “Naturalmente todos sonhamos com uma medalha nos Jogos Paralímpicos, mas considero que fiz o que estava ao meu alcance”, sublinhou.
Agora, no Rio, pretende “passar à final”, marcada para as 23:07 horas do próximo sábado. Lá chegada quer classificar-se “o mais à frente possível”. Ainda para mais, no palco dos palcos. “Há todo um ambiente próprio que é difícil de traduzir em palavras.
É a quantidade de atletas de variadíssimas nacionalidade, e com muitas deficiências diferentes. E o público, enfim, é fantástico!”
Admite que sente falta da família e por isso, apesar de viver em Lisboa, Odete Fiúza desloca-se a Leiria com “bastante frequência”. Ainda por cima, agora encontrou alguém que a pode ajudar a não perder treinos quando se desloca à cidade natal, o que lhe facilita a vida.
“Para uma pessoa que depende do guia é sempre complicado, mas agora posso correr com a atleta Mónica Rosa que se disponibilizou para me ajudar”, salienta a antiga recordista do Mundo de 5.000 metros, marca obtida quando venceu os Jogos Mundiais de Madrid, em 1998, um dos melhores momentos da sua carreira.
A corrida, à qual aderiu quando se mudou para Lisboa para frequentar o primeiro ano de Direito, é de tal forma importante que já não admite passar sem ela.
“Tornou-me uma pessoa mais feliz, de bem com a vida e recompensada. É um excelente veículo de inclusão, uma vez que praticamos no mesmo local de qualquer outra pessoa.”
Depois de o dia ser passado com a pele de jurista, calça as sapatilhas, veste as licras e atira-se à pista durante duas horas. É aí que está a grande dificuldade: “conciliar o atletismo com a minha carreira profissional e coordenar o trabalho com a disponibilidade dos guias.”
Guias que são absolutamente fundamentais na carreira desta atleta. Para que tudo funcione, é necessário que exista “empatia, cumplicidade, compreensão e amizade”.
“Com uma carreira tão longa é óbvio que nem tudo são rosas, mas os problemas servem para crescer e fortalecer laços. Devo muito aos atletas-guias que ao longo destes anos trabalharam comigo, abdicando muitas vezes das suas próprias vidas”, agradece Odete Fiúza.
As histórias, essas, são mais do que muitas, como aquele dia em que entre o aquecimento e a prova lhe roubaram os sapatos de competição.