Já lhe chamam doutor gerente?
Não e espero que nunca. Prefiro manter uma certa discrição.
Além da arca cheia de minis, o que é mais importante na gestão de um bar?
Desde uma contabilidade assertiva à auditoria permanente do stock, há bastantes coisas a fazer. Primo por uma auto-exigência que tento expressar nos vários detalhes que possam agradar ao cliente. Apostar no conforto e na festa em comunhão. Fazer "respirar" um ambiente seguro e agradável. Apostar na simpatia e formação contínua do staff. Manter um olhar atento ao mundo e aproveitar a noite como reflexo primário de tendências sociais para fazer brotar novos conteúdos programáticos. Comunicar bem interna e externamente. Entre muitas outras coisas.
É justo dizer que vive mais tempo no Anubis do que em casa?
Justíssimo! Há perto de 20 anos. De dia e de noite vou passando lá mais horas, restando as horas de sono praticamente para a minha casa. Conciliar a posição de gerente e trocar uns discos ainda me dá água pelas barbas e a perda do (pouco) cabelo que me restava.
É desta que tira o pó ao canudo sacado na ESECS?
Já o fazia com regularidade. Nunca foi um objectivo per si, apenas quis desenvolver novas capacidades e aprender mais.
Licenciatura em Relações Humanas. Aprende-se mais na escola ou na cabina do DJ?
Tem graça que sempre disse que 30% na cabina era a passar música e os restantes 70% era observação. Aprendi muito sobre a condição humana on job, mas agreguei a esse conhecimento empírico todas as teorias de relações humanas e comunicação organizacional. Uma potenciou a outra claramente. Quando se entra com 30 anos para a faculdade já se leva a lição bem estudada da vida e do trabalho.
Porquê DJ Cuts?
Na época (1999) havia uma expressão para mistura em inglês que era cuts tal como era utilizada na produção electrónica. Eu também tinha a mania (e mantenho ainda um pouco, para irritação de alguns meus amigos) de cortar as músicas para manter as pessoas ligadas à corrente. Curiosamente uma prática muita utilizada nos dj sets do mainstream hoje em dia.
Imagine que o mundo acaba amanhã e alguém dá uma festa: sons obrigatórios no último set?
Prince – 1999; The Clash – Rock the Casbah; The Strokes – Hard to Explain; Jay Z – 99 Problems; Pearl Jam – Alive; N.E.R.D. – She Wants to Move; Motorhead – Ace de Spades; Daft Punk – Rock 'n' Roll; Surma – Voyager; Nick Drake – City Clock; Jeff Buckley – Last Goodbye.
E um som que o DJ Cuts não passa nem que o mundo acabe amanhã?
Não tenho complexos, mesmo que o mundo acabe amanhã!
É mais livre na cabina ou no vento das palavras?
Qualquer um dos dois tem em mim um efeito catártico. Passar música para pessoas aproxima-me de um músico que "toca" as pessoas. Já na escrita, tudo é meu de raíz, e aí sim, sou autor das palavras "dançantes" no vento. Umas encontram as pessoas, outras libertam-me!
Para onde é que voa a palavra de Jorge?
Para onde a palavra em si sinta que deve ir. Livremente. Como no processo da música que é produzida sem compromisso com o resultado. Apenas ela ser e chegar a quem a queira receber. Aí sim, terá uma alma para a acolher e fazer dela o que bem entender. Na música como na escrita. A beleza da arte.
Sente-se poeta ou está poeta?
Sempre fui estando muitas coisas e também fui estando poeta. Agora assumo-o sem receios. Bom ou mau, sinto-me também poeta.
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Citando Rui Vitória: há mais vida para além da noite ou pelo contrário quem lhe tira a noite tira-lhe tudo?
Há mais vida para além da noite. Mas na noite nasce o que um dia se verá ser das pessoas. Quem chega a dominar um dia a noite controlou o fogo, como nos primórdios da nossa existência.
Em tempos escreveu que o Gonçalo Guedes é o fruto da copulação entre Luís Filipe Vieira e Paulo Futre. Esta linha refere-se à Porta 18?
Não sei em que linhas isso se passou, se é que se passou mesmo! Mas lá que o Guedes tem ADN de LFV, lá isso parece ter. Já do Futre, também corre que se farta, mas acho que foge mais das linhas do que o Futre alguma vez jogou. Na verdade, não sei mesmo, nem quero branquear nada!
E quem é que merece levar nas orelhas antes do jogo de amanhã no Dragão?
Esses departamentos de comunicação todos! Só incendeiam e criam um clima de crispação perfeitamente inútil.
Preferia nunca mais trocar discos ou nunca mais ver o Benfica campeão?
Não sou doente e também sei que não passarei música a vida inteira. Já tenho uns bons anos disto como já tive anos maus daquilo. É aceitar o que tiver de ser. Rumo ao penta ou arrumo os discos?
Voltando à paternidade: ser pai muito cedo deu-lhe maturidade ou dores de cabeça?
Ser pai foi das decisões mais maduras que alguma vez tomei, mesmo tendo apenas 19 anos. Fui educado a tomar responsabilidade pelos meus actos e já que era maior de idade assumi juntamente com a mãe da minha filha essa decisão. Penso que sempre apostámos na prevenção e educação mais do que remediar. A natureza dela também ajudou e com isso foram muito poucas as situações de dor de cabeça.
Costuma passar por irmão da Mariana?
Passei por namorado dela em algumas ocasiões, isso sim!
Desporto por prazer ou para manter a forma?
Ambas!
Na bicicleta e fora dela, tem mais perfil de rolador, sprinter ou trepador?
Trepador! A luta de atingir metas altas.
Quando olha para trás, onde é que ganhou o seu prémio de montanha?
Na primeira grande montanha. A Mariana.