Licor de Ginja de Óbidos ou de Alcobaça com fruto comprado em qualquer parte do mundo? Tudo bem, diz a Direcção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR). Não, contesta a Associação dos Produtores de Maçã de Alcobaça (APMA). O pedido de registo de indicação geográfica para proteger aquelas bebidas espirituosas está a provocar um braço de ferro entre os serviços do Ministério da Agricultura e os autores da candidatura.
Os promotores querem produção em exclusivo com ginja da região, certificada, para contrariar a prática de algumas empresas licoreiras, que utilizam matéria-prima importada, em especial da Polónia e de outros países de Leste. Já os técnicos do Estado sugerem incluir o critério "Ginja de Óbidos e Alcobaça IGP ou outras com características físicas, químicas e organoléticas similares".
Desde 2013, existe um registo de indicação geográfica "Ginja de Óbidos e Alcobaça" que designa os frutos da cultivar "Galega" obtidos em sete concelhos da região: Óbidos, Alcobaça, Nazaré, Caldas da Rainha, Bombarral, Cadaval e algumas freguesias de Porto de Mós.
Entre outras características, destaca- se o "aparecimento sistemático de pelo menos uma folha no nó de inserção do pedúnculo do fruto", lê-se no aviso publicado no Diário da República. Daí a expressão galega folha no pé, conhecida no Oeste.
Agora, a APMA quer registar a indicação geográfica para proteger os licores "Ginja de Óbidos", "Ginjinha de Óbidos" e "Ginja de Alcobaça".
Mas o processo está num impasse, por conflito de interesses.
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Em resposta ao JORNAL DE LEIRIA, pela subdirectora geral Filipa Horta Osório, a DRADR diz que "os licores produzidos na região com a indicação de proveniência já utilizam frutos de várias origens", pelo preço mais barato e porque a disponibilidade da cultivar "Galega" é aparentemente insuficiente para as necessidades.
O organismo tutelado pelo ministro Capoulas Santos considera que o projecto, "nos exactos termos propostos" pela APMA, "mais não faria do que impossibilitar a produção destes licores".
Para o presidente da APMA, não restam dúvidas: na versão sugerida pelos serviços do Ministério da Agricultura, "fica aberto" o caminho sem retorno para que "qualquer ginja de qualquer parte do mundo possa ser usada na produção de ginja de Óbidos e de Alcobaça". Isto numa bebida espirituosa com indicação geográfica. "Não aceitamos", conclui Jorge Soares.
Os técnicos da DRADR baseiam-se no regulamento europeu 110/2008, segundo o qual a indicação geográfica identifica determinada qualidade, reputação ou outra característica essencialmente imputáveis à origem geográfica. O que inclui outros factores de ponderação, não apenas a matéria- prima.
Argumentam também que "não existe nem nunca existiu" produção certificada de "Ginja de Óbidos e Alcobaça IGP".
A visão da APMA é oposta: Jorge Soares assegura que há pelo menos um produtor em condições de obter a certificação e outros dois a colaborar com a associação, que vê aqui uma oportunidade para dinamizar a produção de ginja (fruto) no Oeste.
Sem cumprir os requisitos, os licoreiros no mercado poderiam continuar a trabalhar, só não poderiam aproveitar a indicação geográfica.
Licoreiros: há marcas que usam fruta estrangeira
Para o presidente da APELGOA – Associação de Produtores e Engarrafadores de Licor de Ginja de Óbidos e Alcobaça, não faz sentido falar numa variedade chamada folha no pé (na foto). Nem é necessário que os licores incluam ginja IGP, apenas "ginja da variedade galega produzida na região". Alcino Pinto dos Santos diz que a APELGOA está a estudar uma solução com o Ministério da Agricultura, porque a legislação em vigor que regula os registos de indicação geográfica implica custos insuportáveis para os licoreiros. E admite que algumas empresas do sector estão a enganar os consumidores. "A maioria dos produtores de licor cometem quanto a mim dois crimes: aqueles que fazem o licor com ginjas importadas e colocam no rótulo "Ginja de Óbidos" estamos perante publicidade enganosa. Aqueles que no contra-rótulo dizem este licor foi produzido com ginjas da região, isso é fraude".