A ex-vereadora da Câmara de Ourém Lucília Vieira foi acusada dos crimes de prevaricação de titular de cargo político, subtracção de documento e falsificação de documento, no âmbito de um concurso de recrutamento excepcional de trabalhadores.
Segundo o despacho de acusação do Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra, ao qual a Lusa teve hoje acesso, a antiga autarca, eleita pelo PS, tomou posse, para o primeiro de dois mandatos, em 30 de Outubro de 2009, tendo-lhe sido delegado, entre outros, o pelouro dos Recursos Humanos.
Em 2010, Lucília Vieira diligenciou junto do chefe de Divisão Administrativa e de Recursos Humanos para desencadear “os procedimentos necessários para abertura de concurso para recrutamento/admissão de novos trabalhadores”.
O responsável manifestou “sérias reservas”, dadas as medidas em curso para a redução do endividamento público, e sugeriu um pedido de parecer à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT).
No parecer emitido em Fevereiro de 2011, a CCDR-LVT concluiu que o recrutamento era “apenas admissível em situações excepcionais”, quando cumulativamente existisse relevante interesse público e não fosse possível ocupar os postos de trabalho por pessoal com relação jurídica de emprego público previamente constituída.
Apesar das limitações, a vereadora ordenou a reformulação do mapa de pessoal, que foi aprovada em abril seguinte pelo município.
“Com efeito, era já intenção da arguida, e nisso se adequava essa reformulação, que, no âmbito do concurso que pretendia abrir, fosse admitida e acedesse à categoria de técnica superior a funcionária Carminda da Silva Santos, que tinha obtido a licenciatura em Educação Básica no ano anterior”, sustenta o Ministério Público (MP).
Em 19 de Julho de 2011, sob proposta de Lucília Vieira, esta câmara do distrito de Santarém aprovou por unanimidade o recrutamento excepcional de vários trabalhadores, incluindo dois técnicos superiores para a Divisão de Educação e Assuntos Sociais. A chefe desta divisão propôs um para a área da Psicologia e outro para o Serviço Social.
Mas, “em cumprimento do propósito por si delineado de que a funcionária Carminda da Silva Santos acedesse à carreira/categoria de técnico superior”, a vereadora deu ordem para que fosse alterada a justificação apresentada para a área do Serviço Social por uma para Educação Básica.
Segundo o MP, Lucília Vieira concluiu que importava não deixar neste dossiê referências à sua intervenção, pelo que ordenou a retirada dos procedimentos relativos aos 11 postos de trabalho abertos do “original da ‘nota justificativa’ por si assinada e todas as cópias que deles constavam”, substituindo-os “por outro documento com o mesmo conteúdo, mas sem a sua assinatura”.
Por outro lado, importava que a proposta de recrutamento excecional estivesse conforme com o texto que tinha sido aprovado na reunião camarária de 19 de Julho, “o que não sucedia”, pelo que diligenciou pela alteração parcial do texto da proposta, mantendo a primeira página, que tinha o despacho do presidente da câmara e o carimbo da deliberação, em 19 de Julho.
“Assim forjado este documento, a arguida ordenou que o mesmo substituísse o que inicialmente constava do procedimento”, refere o MP.
Ao concurso para técnico superior com licenciatura em Educação Básica concorreram 40 pessoas, tendo sido admitidos apenas cinco candidatos, incluindo Carminda da Silva Santos, que ganhou.
Para o MP, Lucília Vieira quis “condicionar e reduzir significativamente” o acesso ao concurso para permitir que fosse ocupado por Carminda da Silva Santos, apesar de saber que esta não o iria ocupar porque passou a desempenhar funções de nomeação política junto da presidência e, depois, da vereação socialista.
O lugar “nem sequer era uma necessidade premente do serviço como o exigia tal procedimento concursal”, sustenta o MP, convicto de ter havido “manifesto benefício para a funcionária” em prejuízo dos restantes candidatos excluídos e dos que se queriam candidatar, bem como para o município, pois nenhum funcionário ocupou o lugar nos anos seguintes.
O MP pede o julgamento da antiga vereadora por um tribunal singular, considerando que “nunca lhe será de aplicar pena de prisão superior a cinco anos”.
Agência Lusa/Jornal de Leiria