A Escola Secundária Afonso Lopes Vieira, em Leiria, foi um dos estabelecimentos que não chegaram a ser intervencionados no âmbito da requalificação do parque escolar lançado pelo governo socialista de José Sócrates.
Esta é uma das 27 escolas da região, com cobertura de amianto e cuja degradação já é visível a olho nu. As infiltrações em tectos e paredes – como o JORNAL DE LEIRIA revelou na semana passada – são muitas, assim como as falhas no telhado, com a chuva a cair dentro de algumas salas. Mas este não é caso único.
A Escola 2,3 D. Dinis, no centro de Leiria, reclama a retirada de amianto há vários anos. O fibrocimento só foi removido do pavilhão gimnodesportivo depois de uma posição de força dos encarregados de educação, que fecharam a escola a cadeado, cansados de tantos pedidos à tutela sem resposta.
Mas toda a estrutura onde estudantes, professores e funcionários passam várias horas diariamente, em alguns casos durante anos, continua forrada a amianto. “Toda a comunidade educativa está preocupada.
Esta direcção tomou posse em Junho de 2018 e os pais pediram de imediato uma reunião para nos sensibilizar para o que se pode fazer. A primeira medida que tomámos foi pedir um orçamento para monitorizar a qualidade do ar, que enviámos à Direcção- Geral dos Estabelecimentos Escolares em Dezembro”, revela Jorge Camponês, director do Agrupamento de Escolas D. Dinis.
O director sublinha que o objectivo é “tranquilizar” a comunidade, garantindo que não há partículas de amianto no ar, que possam ser inaladas e causar problemas de saúde. “Os alunos são uma preocupação nossa, mas não nos podemos esquecer que nós, professores, trabalhamos aqui 20 e 30 anos. Temos uma exposição bastante prolongada.”
Jorge Camponês afirma que vai aguardar por uma resposta da DGEstE, mas se a mesma tardar ou for negativa, os pais dos cerca de 700 alunos já avisaram que vão tentar assumir o custo da monitorização, orçamentada em 1118 euros, acrescido de IVA.
“A escola não tem receitas próprias. Tudo o que nos chega do Orçamento do Estado é para rubricas previamente fixadas, nomeadamente, para a gestão corrente.”
Com 38 anos, a Escola D. Dinis nunca sofreu uma intervenção profunda. “Existem problemas estruturais nos blocos. O frio é constante e todas as direcções que por aqui passam têm efectuado relatórios que enviam ao Ministério da Educação”, explica.
Amianto no tribunal de Peniche
No Tribunal de Peniche o cenário não é muito diferente. O telhado está totalmente coberto com telhas de fibrocimento.
As infiltrações em todo o edifício são visíveis. A chuva cai dentro de algumas salas, infiltrando-se pelos candeeiros, o que aumenta o risco de curto-circuito. A sala dos advogados tem fissuras graves no tecto e o chão está levantado, devido à humidade e chuva que cai no local.
194
mil pessoas terão morrido de cancro, por exposição ocupacional ao amianto, refere o estudo Risk Factors Collaborators, publicado em 2015
115
toneladas é o número estimado de amianto consumido em Portugal ao longo dos anos. Há 600 mil hectares de coberturas de edifícios de fibrocimento com amianto
Este foi um material utilizado na construção, sobretudo, nas décadas de 70 e 80, até ser proibido pela União Europeia, em 2005. Desconhecendo-se, então, os riscos para a saúde, o amianto foi escolhido por ser uma [LER_MAIS] fibra natural, com boas propriedades físicas e químicas, com resistência mecânica às altas temperaturas, incombustibilidade, boa qualidade isolante, durabilidade, flexibilidade, indestrutibilidade, resistente ao ataque de ácidos e bactérias, facilidade de ser trabalhada como um tecido, para além do baixo custo, explica a página do SOS Amianto, que pertence à associação ambientalista Quercus.
Em 2014, o Governo fez o levantamento de todos os edifícios públicos, assinalando aqueles que “presuntivamente” contêm amianto na sua construção, e tem afirmado que até 2020 serão retirados todos os materiais com amianto dos edifícios públicos.
Efeitos cancerígenos
Os efeitos da inalação de partículas de amianto para a saúde estão comprovados cientificamente. O problema surge quando, através da interacção com o amianto (ou pela degradação provocada pelo tempo), soltam-se minúsculas partículas fibrosas que ficam suspensas no ar e são facilmente inaladas.
Quanto mais prolongada a exposição, maior quantidade de fibras se acumula nos pulmões. A longo prazo – superior a 20 anos -, pode provocar graves lesões pulmonares, mesoteliomas e cancro do pulmão. Um estudo do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), citado pelo SOS Amianto, identificou 427 novos internamentos por mesotelioma nos hospitais portugueses entre 2000 e 2011.
O número de novos casos por ano varia entre 26 e 52, mostrando um ligeira tendência de aumento. Jaime Pina, vice-presidente da Fundação Portuguesa do Pulmão, destaca que “desde 1960 que a relação entre o amianto e doença respiratória foi reconhecida, inicialmente naqueles que trabalhavam na indústria extractiva, posteriormente nos trabalhadores das diversas indústrias transformadoras utilizadoras deste mineral e, posteriormente, na população em geral”.
Um dos parceiros do SOS Amianto, Jaime Pina, informa que as “doenças respiratórias provocadas pelo amianto têm duas características muito próprias: um período de latência muito longo e o facto do risco de doença persistir para toda a vida”.
Segundo o médico, as características biológicas das fibras permitem que “uma vez inaladas persistam para sempre no aparelho respiratório, podendo ser transportadas para outros locais do aparelho respiratório, tais como os gânglios e a pleura”.
“Consideramos como doenças respiratórias provocadas pela inalação de fibras de amianto, as seguintes: asbestose, patologia pleural benigna, o cancro do pulmão e um cancro particular da pleura, o mesotelioma.”
Em Portugal desconhecem-se casos profissionais de doença provocada por este material que tenham chegado aos tribunais, mas no ano passado, o Superior Tribunal de Justiça da Catalunha condenou a empresa Uralita a indemnizar no valor de 112 mil euros um ex-funcionário pela morte da mulher, que morreu por exposição às fibras de amianto que estavam nas suas roupas de trabalho e que ela lavou em casa por mais de 30 anos.
PERGUNTAS E RESPOSTAS
Onde se pode encontrar amianto?
Pavimentos, placas de tectos falsos, isolamento de tectos, produtos e materiais de revestimento e enchimento, portas corta-fogo, tijolos refratários, telhas, caldeiras (revestimentos e apoios), impermeabilização de coberturas e caleiras, portas de courettes, paredes divisórias pré-fabricadas, elementos pré-fabricados constituídos por fibrocimento (não friável) e pintura texturizada. O amianto friável (mais perigoso) também foi usado em tubagens de água quente, isolamento de antigos aquecedores domésticos e de fogões.
Que doenças podem ser atribuídas à inalação de fibras de amianto?
O amianto foi classificado com cancerígeno para o ser humano pela IARC (International Agency for Research on Cancer). Os tipos de cancro mais comuns nos indivíduos expostos por inalação a fibras de amianto são a mesotelioma, que afecta a pleura ou o peritoneu, cuja incidência é muito baixa na população geral. A maioria dos casos conhecidos é atribuída ao amianto; Cancro do pulmão, sendo o risco bastante mais elevado nos fumadores; Asbestose, uma fibrose pulmonar irreversível causada pela inalação de elevadas concentrações de fibras de amianto e tem tendência para progredir mesmo após a cessação da exposição. Estas doenças, resultantes da exposição ao amianto, aparecem, em regra, muitos anos após a primeira exposição (15 a 40 anos).
Qual o valor referência para a exposição ambiental?
O valor de referência a considerar para a concentração de fibras respiráveis em suspensão no ar deverá ser igual ou inferior a 0,01 fibra/cm3, de acordo com o recomendado pela Organização Mundial de Saúde como indicador de “área limpa”.
Todos os materiais com amianto apresentam o mesmo risco?
Confirmada a presença de amianto no material o risco será distinto. No material friável (pouco utilizado), o risco é grande, porque existe grande probabilidade de libertação de fibras para o ar ambiente. Já o material não friável (fibrocimento) tem menor risco, uma vez que a probabilidade de libertação de fibras para o ar é baixa.
Há riscos associados à exposição em edifícios com fibrocimento?
O fibrocimento, quando em bom estado de conservação, é um material de muito baixo risco, porque o cimento é um aglutinante muito forte e dificilmente as fibras são libertadas para o ar. No entanto, caso o material se encontre degradado e/ou acessível à agressão directa ou muito envelhecido deverá ser sujeito a tratamento ou optar-se pela sua substituição.