Quando as ruas e as lojas se enfeitam, os mais novos, sobretudo, anseiam pela noite de Natal.
Começam a contar os dias em que vão desembrulhar os presentes e ter uma noite especial com aqueles familiares mais distantes, que nem sempre vêem ao longo do ano, e que a consoada traz a casa todos os anos.
Se Natal é sinónimo de família, amor e alegria, o divórcio faz temer o pior quando se aproximam as festividades.
Dividir a presença dos filhos naqueles dias especiais não é fácil. Mas, se houver bom-senso, criatividade, previsibilidade e partilha, tudo corre bem e as crianças saem a ganhar.
Em vez de se pensar na divisão, pode encarar-se a situação como uma multiplicação de familiares, mantendo vivo o espírito de união e alegria da época. E há sempre a possibilidade de recriar a noite de Natal antecipadamente, permitindo, assim, aos filhos viver a consoada de igual forma com as famílias do pai e da mãe.
“Não se diz que o Natal é quando um homem quiser? A comemoração não tem de ser no dia 24 ou 25. Estes são dias de partilha e já nem todas as famílias celebram a quadra de forma tradicional. Se houver criatividade e organização as coisas correm bem”, afirma a psicóloga Joana de Sousa.
Também a psicóloga Patrícia António defende que uma das soluções pode passar por uma “combinação criativa” e fazer um “Natal de antecipação”, podendo no ano seguinte os pais trocarem os dias.
Joana de Sousa sublinha a necessidade de “muito bom-senso”, não só durante as festividades, mas sempre. “Não há uma forma mágica, mas é preciso comunicação e haver consenso. Por vezes, esquecem-se de que já gostaram daquela pessoa e se facilitarem a vida ao outro estão a facilitar a vida aos filhos”, acrescenta Joana de Sousa.
As psicólogas defendem ainda a programação antecipada destes dias. “Há famílias que vivem na mesma cidade, o que facilita as coisas, mas há situações em que estão em localidades diferentes. [LER_MAIS] O importante é programar com antecedência. O maior impacto emocional nas crianças pelo lado positivo é perceberem que os pais já não gostam um do outro, mas continuam a gostar delas e conseguem organizar-se para lhes dar um Natal com toda a família”, sublinha Joana de Sousa.
Esta psicóloga lembra que há famílias que, embora separadas, passam o Natal juntas, o que não considera ser essencial para o bem-estar dos filhos.
“O importante é que consigam conciliar para que a criança não se sinta culpada porque não está naquele dia com o pai ou com a mãe. Se as crianças virem os pais felizes, vão também sentir-se felizes. Não é preciso lutar por uma hora de Natal, mas claro que tem de haver cedências de ambas as partes. Por isso ,é preciso continuar a cuidar do pai/mãe do nosso filho, depois do divórcio”, sublinha.
É a pensar nos filhos que António Duarte, separado há cerca de dois anos, cede a consoada à ex-mulher.
“Na noite de Natal, a família da mãe tem várias crianças e eles podem divertir-se mais com os primos e viver a verdadeira magia do Natal. Mas, durante o dia vão dar um beijinho aos meus pais para que possam estar um pouco com eles”, conta.
No dia seguinte, os meninos fazem o almoço de Natal com o pai e respectiva família. Esta é a mesma situação de Dora Ribeiro, divorciada há quase quatro anos. “Como a minha família dá uma maior importância à consoada, temos a tradição de abrir os presentes à meianoite e somos um grupo alargado, a minha filha passa a noite de 24 de Dezembro comigo”, adianta.
No dia seguinte, a menina de 7 anos almoça com o pai. “Todos os anos é assim. Não existe qualquer problema. Eu e o pai dela damo-nos bem e é sempre tudo tranquilo. Para ela também não há qualquer tipo de problema nem nenhuma correria. Desta forma, passa um dia com a mãe e outro com o pai. Isso é que é importante”, acrescenta Dora Ribeiro, garantindo que os laços com os familiares de cada lado não se perdem.
Também Margarida Silva acordou com o pai dos seus dois filhos dividir a quadra, para que ambos possam desfrutar da presença das crianças.
“Desde a separação que ficou definido que as crianças passam a noite de Natal e da passagem de ano com um de nós e o dia seguinte com o outro”, diz, explicando que no ano seguinte esta opção inverte-se, para que os meninos possam ter experiências diferentes todos os anos com as respectivas famílias.
“Pensámos que isto era o melhor para as crianças, que têm assim oportunidade de passar estas festividades com os avós dos dois lados. Não há qualquer correria, porque só no dia seguinte levamos os nossos filhos a casa do outro.”
Patrícia António defende a necessidade de garantir as rotinas e estabilidade das crianças, sobretudo das mais pequenas. “É importante alguma previsibilidade, saberem antecipadamente o que vai acontecer. Se forem informadas das negociações dos adultos com tempo, as crianças vão sentir que têm o controlo e sabem que vão ser confrontadas com a ausência do outro.”
Saber com o que contam vai “diminuir a ansiedade”, garante esta psicóloga, ao acrescentar que as correrias neste dia são desaconselhadas. “É melhor ser um dia apenas numa das casas ou até antecipar o Natal com a concordância das famílias.”
Tranquilidade é o que sente Ângela Ferreira, que experimentou no ano passado, pela primeira vez, a separação da quadra. “Foi estranho”, admite, confessando, contudo, que os pais lhe dão a ela e ao irmão a liberdade de decidir como querem festejar a quadra.
“Como o meu pai tem um trabalho com uns horários mais complicados, passámos os dias 24 e 25 com ele e com a sua família para aproveitarmos. E até gostei bastante de passar esse tempo com ele”, revela a jovem de 18 anos.
Este ano, os dois irmãos resolveram jantar na noite de 24 com a mãe e almoçar com o pai no dia 25. “Assim é uma oportunidade de estar também com os familiares da parte de cada um, que nem sempre vejo durante o ano. Esta parece-me ser a melhor solução, até para matar as saudades de todos.”