Se conta ter leitão assado este réveillon, como é tradição na região de Leiria, saiba que talvez tenha de o comprar a preço mais elevado do que é usual. Os assadores de leitão estão a adquirir os animais a preços mais elevados aos produtores e atribuem a subida do valor à escassez de animais no mercado nacional, desde que teve início a exportação de carne de porco para a China.
Enquanto tentam esmagar as margens de lucro para proteger o consumidor final, os comerciantes dizem estar a prejudicar o negócio. “É uma diferença de preço brutal, que o cliente não pode suportar. É um disparate, uma aberração”, desabafa Lucília Silva, proprietária do Mister Leitão, estabelecimento situado em Fátima.
“Não estou a perder os meus clientes, porque estamos nós a suportar essa subida. Mas ninguém está interessado em ter um negócio para perder dinheiro”, expõe a comerc iante, que aponta o dedo aos produtores: “Preferem exportar carne de porco para a China, porque lhes dá mais lucro, do que apostar na c riação de leitões para o mercado nacional”.
Esta é também a perspectiva do marido e parceiro de negócio no Mister Leitão, José Miguel, para quem há ainda um certo “aproveitamento” da época festiva para aumentar os preços.
Com cada unidade 20 a 25 euros mais cara, o impacto na rentabilidade é óbvio. Diz que tem cobrado apenas mais dois euros por quilo, para evitar que os clientes passem a comprar outros produtos.
Fernando Silva, responsável pelo restaurante Quinta do Leitão, em Ponte da Pedra, Leiria, cria os seus próprios leitões, que assa e comerc ializa. Esta estratégia permitelhe manter o preço final do leitão assado, que continua a chegar ao consumidor final a cerca de 100 euros por unidade.
“Percebi logo que este aumento de preço iria acontecer desde que foram abertas as exportaçõesà China. Creio que os meus colegas que assam vão ter de subir os preços, uma vez que também estão a comprar os leitões mais c aros aos produtores”, refere Fernando Silva, lembrando que se há mais procura e menos oferta, o valor sobe forçosamente.
David Neves, presidente da Associação de Suinicultores de Leiria, confirma um aumento no preço do leitão e da carne de porco, no geral, na ordem dos 30%, acompanhando uma conjuntura mundial, onde a China também tem responsabilidade. [LER_MAIS]
Desde que a China, que é o maior produtor e também o maior consumidor de carne de porco, passou a bater-se com um problema sanitário de peste suína africana (desde Agosto de 2018), este merc ado perdeu cerca de 40% da produção interna e teve de se voltar para outros países. E Portugal não ficou de fora. “Há maior pressão da procura internacional”, realça o presidente.
No entanto, contrapõe David Neves, a exportação para a China também trouxe maior equidade. Até agora focados no mercado interno, os produtores portugueses vendiam mais barato do que o resto da Europa. E essa discrepância de preços levou muitas explorações à falência, sublinha o presidente. “Culpam a produção, quando esta já sofreu tanto.
Esquecem-se que é com o lucro das suiniculturas que os produtores podem pagar impostos, modernizar-se e fazer investimentos capazes de pôr fim a problemas ambientais”, realça um produtor, que é também assador de leitões na região.
Um outro assador de leitões ouvido pelo JORNAL DE LEIRIA mostra- se bastante crítico: “contra mim falo. Mas quem assa leitões lembra-se do tempo em que os comprou baratos para prejuízo dos produtores?”
Nesta fase, o comerciante diz que compra cada unidade 20 euros mais cara, um aumento que tem algum impacto junto do cliente final.
Com 700 produtores industriais em Portugal, localizados sobretudo entre Coimbra e Alcácer do Sal – 90% da produção está na região Centro e de Lisboa e Vale do Tejo –, o negócio da carne de porco ascendeu em 2018 a 520 milhões de euros. Apesar da ligeira subida em termos homólogos, o sector ainda está aquém dos 600 milhões que valia em 2015, quando iniciou a quebra “sobretudo pelo preço pago ao produtor”, disse recentemente ao Negócios a Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores.