Muito antes de a ginja receber prémios e pontuar o remate das refeições contemporâneas, já lhe eram atribuídas propriedades regeneradoras que os homens de Cister descobriram em ambiente místico.
“Os licores têm na nossa região uma origem conventual, não na gastronomia, mas na farmácia. A ginja era usada como xarope peitoral e digestivo”, explica o empresário Vasco Gomes.
O produto que hoje conhecemos “remonta à tradição das boticas dos mosteiros”, num contexto em que eram os monges “que tinham tempo e dinheiro para fazer experiências”.
Vasco Gomes e familiares são os actuais detentores e defensores da marca MSR, que em 2020 chega aos 90 anos. Produzida em Alcobaça, deve as iniciais ao fundador e inventor da fórmula, Manoel de Souza Ribeiro, um químico com estudos em Inglaterra.
“Temos os manuscritos dele, não só a descrever como se deve fazer esta ginja, mas todo o processo de tentativa e erro até alcançar os objectivos”. O negócio esteve nas mãos de David Pinto e dois sócios, até passar para a família Gomes, em 1998.
Manoel de Souza Ribeiro registou também o modelo de embalagem, tipo cone, igual ao que ainda hoje é comercializado, que tem a finalidade de obrigar o consumidor a guardar a garrafa em pé para evitar que o líquido danifique a rolha.
Quase um século volvido, a ginja MSR é uma bebida “100 por cento natural”, desenvolvida “à moda antiga” e “de forma artesanal e tradicional desde a colheita até ao engarrafamento”, afirma Vasco Gomes. “Todo o processo na adega é manual e moroso”, porque “o tempo é muito importante”.
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O período de maturação em carvalho francês ou português é, no mínimo, de um ano. Tipicamente, a colheita acontece nos meses de Junho e Julho e a bebida produzida com os frutos da campanha está no mercado em Novembro ou Dezembro do ano seguinte.
A matéria-prima provém de ginjal próprio (95%) e de pequenos pomares (5%) na região Oeste. É uma variedade da planta, conhecida como folha no pé, que se distingue por oferecer frutos com elevado teor de acidez e açúcar. Em combinação com a influência do mar e da serra, confere à ginja MSR uma personalidade única, com aroma e sabor característicos.
“Só leva quatro ingredientes: o fruto, álcool, açúcar e água. E tem outros adicionais, que são sangue, suor e lágrimas”, afirma Vasco Gomes. O restante está no subtexto da receita de Manoel de Souza Ribeiro, que ajuda a explicar o “toque aveludado” e “o travo que as pessoas associam a especiarias, nomeadamente, a canela”.
Encontra-se no comércio independente, garrafeiras, lojas gourmet, mercearias e supermercados tradicionais, hotéis ou restaurantes, mas não se encontra nas grandes superfícies.
E porque a empresa “não abdica da qualidade”, em 2018 a ginja MSR esteve cinco meses fora das prateleiras, depois de esgotar.