Quando, há 14 longos anos, Cláudia Lucas pendurou as sapatilhas de andebol, a filha não tinha mais do que três anos.
Na altura, o Cister Sport de Alcobaça deixou de ter seniores femininos e Cagi, como é conhecida no meio, só voltou a fazer aparições fugazes na variante de praia, muito mais por divertimento do que por espírito competitivo.
Esta época, porém, desafiada pela amiga Sandra que não queria “arrumar as botas” de vez, resolveu voltar a dar uso às sapatilhas. “Dizia que já não tinha paciência para ir jogar para aqui e para ali, mas lá aceitei começar a época, que depois logo se via. Fui gostando e fui ficando.”
O mais incrível da história de Cagi, porém, não é ter regressado já depois dos quarenta e após década e meia sem grande contacto com a bola que não fosse nas aulas de Educação Física que lecciona e nos treinos que ministra no clube.
É que a pequena filha, a Carolina, já não é pequena. Cresceu, tornou-se uma atleta de eleição, chegou às selecções nacionais e agora joga precisamente na equipa sénior do Cister, que lidera, com cinco vitórias em outros tantos jogos, a zona 5 da 2.ª Divisão.
Curiosamente, foi até ela quem deu o empurrão final perante as dúvidas da progenitora. “Mãe, tens de vir, era tão giro, gostava tanto de jogar contigo!”
E foi. Cláudia começou a sentir-se integrada no grupo. “Não sabiam se me haviam de tratar por tu ou por você. Agora estão muito mais à vontade, mas quando sai uma asneira ainda me pedem desculpa”, diz.
Apesar de notar ter “menos força no remate”, continua “muito bem em termos de velocidade e resistência”. A ponto de as colegas ficarem “impressionadas” com a performance.
Rapidamente percebeu, pois, que tinha uma oportunidade única de jogar com a filha, algo que “não é, de todo, normal”.
Foi no passado sábado, em Castelo Branco, frente a Casa do Benfica local, que entraram pela primeira vez em campo juntas. “Uma grande emoção”, admitem.
Carolina foi titular e marcou sete golos e Cagi só pisou o campo na segunda parte, mas bem a tempo de facturar por duas vezes na vitória, por 13-25.
O momento que mais as marcou, contudo, aconteceu no lado menos garboso do campo. “Estávamos na defesa, parece que se fez silêncio e só se ouviu a Carolina a dizer: olha aí, mãe.”
A estupefacção foi geral. “Parou tudo e a rapariga de Castelo Branco que estava à minha frente nem queria acreditar no que tinha ouvido”, diz Cláudia Lucas, entre sorrisos.
Protecção
Carolina, que herdou o número nove da camisola de Cláudia, está “a adorar” tê-la a seu lado. “É uma experiência incrível. Sempre admirei muito a minha mãe e agora poder jogar com ela é inacreditável.”
Admite, no entanto, que sente necessidade de cuidar dela em campo. “Ela diz que que não é preciso, que tem muitos anos disto, mas é a minha mãe, tenho de a proteger.”
“Ela é muito cuidadosa. Magoaste-te, estás bem?”, prossegue Cagi. “Às vezes, digo-lhe para ter calma, que não sou assim tão frágil. A princípio chegámos a fazer alguns jogos de treino e quando uma adversária me dava um safanão, aparecia logo ela de antenas no ar a ver quem tinha batido na mãe.”