São conhecidos como os irmãos Cunha e têm dado que falar no mundo do atletismo. Com “jeito para a modalidade desde novos”, destacam- -se pela “dedicação e o empenho” nos treinos que acabam por se traduzir em resultados.
Gabriel e Bernardo Cunha, de 14 e 17 anos, do Reguengo do Fetal, no concelho da Batalha, treinam juntos, em casa têm “algumas picardias” de irmãos por causa do atletismo e até já competiram um contra o outro. “Assim dá mais pica e às vezes até lhe digo que na próxima competição vou fazer mais pontos só para ficar à frente dele”, provoca o mais novo. “Por isso é que às vezes também nos chateamos um bocado”, atira entre risos o mais velho.
Sentados na bancada do pavilhão onde treinam praticamente todos os dias, no Grupo Desportivo das Pedreiras, no concelho de Porto de Mós, contam que entraram para o atletismo há perto de uma década a convite de um professor da escola e acabaram por se render à modalidade. Para Bernardo poderia ser (e foi) “uma solução para a baixa auto-estima”, e para Gabriel era o remédio santo “para o excesso de energia”.
Começaram com umas corridas na Batalha, experimentaram várias disciplinas e acabaram por se dedicar ao decatlo, a modalidade composta por dez provas de atletismo que põe à prova a velocidade, a agilidade, a resistência e a força, sempre com o treinador Cláudio Matias.
“O meu ídolo era o Nelson Évora e ainda treinei triplo salto, mas tive uma lesão no tornozelo e acabei por mudar para as combinadas onde me divirto muito e tenho vários amigos”, explica Bernardo que entretanto passou a admirar também os “recordistas de decatlo como Kevin Mayer (mundial) e Manuel Dias (nacional)”.
E foi precisamente esse recorde nacional (2016) que Bernardo Cunha bateu com mais 283 pontos, na última semana, nos Campeonatos Europeus sub-18, realizados em Israel.
“Comecei a chorar assim que passei a meta dos 1.500 metros porque foi quando me caiu a ficha que estava nos europeus e tinha conseguido uma boa classificação”, recorda o jovem que além do recorde nacional, ficou em 9.º lugar na classificação geral, bateu oito recordes pessoais nas 10 provas de decatlo e ainda surpreendeu na pontuação final (7.050 pontos).
Uma vitória dedicada à mãe, “porque é ela que ajuda sempre, traz-me aos treinos, vai ver todas as provas, atura-me quando as coisas correm mal, trata da minha comida e, com o pai, ajuda-me com as sapatilhas, a fisioterapia e são o meu suporte”, confessa de sorriso arregalado.
Para Gabriel, que ouve atento a conversa, “as conquistas do irmão são uma motivação para fazer melhor”. E tem resultado tanto que conseguiu a qualificação no salto e comprimento para o Festival Olímpico da Juventude Europeia (FOJE) que se realiza entre os dias 24 e 30 deste mês, em Banská Bystrica, na Eslováquia.
Feitos que enchem a mãe de “muito orgulho”
“É muito bom assistir às vitórias deles porque são o fruto de todo o trabalho que têm, eles são muito dedicados, às vezes perguntam-me como é que conseguimos e realmente é com gestão e esforço porque prefiro acompanhá-los do que estar em casa e eles também deixam de ir a festas de anos ou à piscina porque estão focados nos seus objectivos”, explica Anabela Brito, de 50 anos, auxiliar na escola em frente ao clube onde os filhos treinam.
Com muitos quilómetros feitos entre a casa e o clube, ou Leiria para treinar o salto com vara, e outras tantas horas de espera no carro durante os treinos, a mãe garante que “o investimento compensa-se na saúde deles e na motivação e auto-confiança que ganham com o desporto”.
E a força de vontade e dedicação parece ultrapassar até as barreiras mais improváveis como as condições de treino.
A caminho do principal palco dos seus treinos para eternizar esta história com uma fotografia, constatamos que estes atletas, que competem com os melhores de Portugal e da Europa, treinam a velocidade numa pista com brita e ervas e ainda aprimoram o salto em comprimento para uma caixa de areia com pedaços de antigo ‘tartan’.
“No final os resultados compensam tudo”, sublinham de sorriso rasgado os jovens com objectivos ambiciosos e o futuro pela frente.