Que tipo de criminalidade existe no distrito de Leiria?
Comando sete concelhos e em cada um deles a criminalidade é distinta. Temos zonas mais turísticas, mais industrializadas e zonas de grande riqueza e não nos podemos esquecer que temos aqui uma grande parte da indústria de Portugal. Toda esta zona é rica e onde há riqueza o crime está necessariamente associado. Temos o crime da violência doméstica que incide mais nas zonas de maior densidade populacional à qual a polícia adequou os seus procedimentos para fazer face a este flagelo, que é verdadeiramente preocupante. Naquilo que são os crimes contra as pessoas, a violência doméstica é um dos que mais nos preocupa e, naquilo que é o nosso esforço operacional, é onde também empenhamos mais meios. Também temos os crimes específicos, como o furto de catalizadores. Temos também o furto no interior de residências e nesse capítulo já interceptámos vários grupos de estrangeiros a operar em Portugal. Temos a registar também alguns roubos e depois o tipo de crimes que estão associados ao aumento do turismo e do desconfinamento. Se temos mais pessoas nas ruas, mais actividades, mais festividades, há algum aumento da criminalidade.
Leiria é um distrito seguro?
Posso afirmar isso seguramente. Leiria é um distrito seguro e que se recomenda para viver. A polícia tem dado resposta às necessidades do que vai sucedendo. Veja-se o que já se fez na questão desses grupos que operavam [furtos em residências]. Demos uma resposta rápida e cabal, promovendo a sua detenção e ficaram em prisão preventiva e são grupos que operam a nível internacional.
A imigração está a aumentar. Há um crescimento da criminalidade, até pela falta de emprego que podem enfrentar?
Portugal é um País de portas abertas ao mundo. Não fazendo destrinça entre raças, credos e etnias, tem que haver um esforço de Portugal em bem integrar e acolher os imigrantes que recebe. Os imigrantes têm um papel muito importante numa população altamente envelhecida como é a portuguesa. Neste sentido, nós precisamos dos imigrantes. Não há boa nem má imigração. O poder central e o poder local, em parceria com as demais instituições, têm que promover a melhor integração possível dos imigrantes no nosso tecido populacional. É fundamental que isso aconteça. A polícia, nesse particular, tem tido também um papel de grande preocupação. Não há aqui nenhuma rotulagem das pessoas serem desta ou daquela etnia. Esses comportamentos são inadmissíveis na polícia e no meu comando isso não existe. A polícia de Leiria fez uma acção de integração dos cidadãos ucranianos, para citar um caso específico, mas estamos atentos às comunidades brasileira ou romani e as portas do nosso comando estão sempre abertas para receber essas pessoas, para uma boa integração e para uma boa prática de cidadania.
A inflação tem vindo a tirar o poder de compra aos portugueses. Teme que o aumento do custo de vida possa resultar no aumento de furtos?
Em períodos de crise há uma tendência geral de aumento da criminalidade. Para já, não possuo dados que possam dar uma resposta a essa questão, mas acredito que no Relatório Anual de Segurança Interna de 2022 já consigamos ter uma percepção que, associado ao fenómeno da inflação, o crime possa estar inflacionado.
Face à crise energética, as autarquias estão a limitar a iluminação pública. Essa medida pode causar mais insegurança?
Não me parece que haja um efeito directo na segurança dos cidadãos na rua. Da informação que tenho são luzes dispensáveis.
Com a falta de efectivos, como pode garantir a segurança da população?
Não são assim tão menos quanto isso. Vou dar um exemplo de uma cidade de onde eu vim: Nova Iorque. Se perguntar ao chefe da polícia do New York Police Department se ele está contente com os efectivos e com os meios logísticos que tem, ele vai dizer que não. A situação ideal é uma utopia. Temos que nos adequar aos recursos que temos. A polícia é uma grande instituição e os polícias têm um sentido de dever muito grande. Eles sabem e estão conscientes das dificuldades que existem, mas nem por isso baixam os braços àquilo que é o cumprimento da sua missão. Um polícia é ensinado, e bem, a fazer muito com pouco. Quando fui para a Escola Superior de Polícia aprendi que a polícia não é um emprego é um serviço à causa pública. A condição policial implica necessariamente esforço e sacrifício. Não existem meios? Pois não, mas primeiro temos de cumprir a nossa missão e depois provar os meios de que necessitamos.
Mas ter um ou no máximo dois carros-patrulha não é manifestamente pouco?
É impossível chegarem a todas as ocorrências de imediato. Do nosso efectivo, cerca de 400 agentes, somos todos polícias. Já tivemos situações em que foi necessário aumentar o número de polícias na rua, na situação extraordinária dos fogos que se cercaram aqui da nossa área, e metemos muito mais do que dois carros-patrulha na rua, porque quando toca a reunir os polícias não voltam costas ao serviço e, muitas vezes, passam largamente aquilo que é o seu horário normal de serviço.
A videovigilância é um aliado da polícia. Seria uma vantagem aumentar o número de zonas vigiadas?
Neste momento temos 19 câmaras (em parceria com o Município de Leiria), que têm um papel muito importante naquilo que é a prevenção criminal, mas também no combate directo à criminalidade, porque, muitas vezes, através das imagens obtidas, conseguimos identificar grupos que provocam distúrbios, furtos ou roubos. Neste momento, na autarquia, está em curso a aquisição de mais câmaras e já estão referenciados os novos locais. Vamos aumentar de 19 para 61 no total. Esse meio é de uma grande eficácia.
Os receios de alguns cidadãos sobre a garantia da sua privacidade já foram ultrapassados?
Na via pública não há privacidade. As câmaras têm o papel de garantir a segurança das pessoas, não é o de as controlar. Além do mais, estes sistemas passam pelo crivo da Comissão Nacional de Protecção de Dados, mediante a apresentação de um projecto e aquilo que são as zonas privadas levam uma banda preta que não permite, por exemplo, a visualização através das janelas. A privacidade das pessoas cessa a partir do momento em que saem porta fora e os seus comportamentos têm de ser condicionados. E a polícia está cá para garantir isso.
As esquadras móveis que foram recentemente adoptadas no Porto seriam uma mais-valia para Leiria?
Aqui em Leiria não se vislumbra essa necessidade, porque temos duas esquadras muito centrais: uma em Marrazes e outra na zona do Castelo que permitem um fácil acesso aos cidadãos. Nos outros concelhos do distrito as esquadras também estão muito centrais, o que permite que um cidadão que não tenha viatura possa ir às esquadras pelo seu próprio pé. As esquadras têm de estar no coração da polis, de acesso fácil ao cidadão. Portanto, essa questão das esquadras móveis no Comando Distrital de Leiria não se coloca. A esquadra móvel dá uma maior visibilidade à polícia e uma sensação de maior proximidade, mas esse efeito consegue-se também com um carro-patrulha.
Há muito que se fala em libertar os polícias do trabalho administrativo colocando-os nas ruas. O que se evoluiu nesta situação?
Cumprimos aquilo que são as determinações da Direcção Nacional da PSP, portanto, procuramos sempre optimizar e colocar na rua o máximo de efectivos necessários para cumprir a missão. E isso, muitas vezes passa por empenhar polícias de outro serviço. Mas há uma coisa que é também muito importante: se considerarmos que a patrulha é a linha de batalha da polícia e, portanto, a nossa frente de batalha, não nos podemos esquecer da linha da rectaguarda. Temos várias tarefas administrativas na área contra-ordenacional, na área das armas e explosivos ou na área da segurança privada. Há todo um trabalho que se tem de continuar a fazer.
E esse trabalho não pode ser feito por civis?
Essa doutrina tem que ser apurada ao mais alto nível, ao nível estratégico. Mas, para mim, teria de obedecer a critérios muito específicos na selecção das pessoas que iriam desempenhar esse tipo de tarefas, até porque há matérias que são sensíveis e classificadas e que, em certa medida, têm que ser operadas por polícias.
De vez em quando surgem imagens de agentes a agredir cidadãos, muitos de minorias étnicas. Esses vídeos criam uma má imagem da polícia?
Criam uma má imagem, sobretudo se não forem transmitidos na sua íntegra. Se calhar era bem mais interessante que as pessoas em vez de filmarem a actuação da polícia, ajudassem os polícias que estão em apuros e que precisam de ser auxiliados na via pública. Mas também vemos vídeos de civis a agredirem polícias, o que mostra o estado em que as coisas estão. Não diria que há aqui uma quebra de autoridade da polícia, mas há uma perda notória de valores por parte da sociedade civil. Essas situações podem levar a polícia a inibir-se de reagir em situações idênticas? Não. Isso não é conduta de um polícia. Um polícia vai a todas, independentemente do que aconteça. Perdeu hoje uma batalha, amanhã ganha. E se naquele dia foi assim, desta vez já vai adequar a sua actuação.
Concorda com o uso de bodycams até para defesa dos agentes?
Necessariamente que sim. Isso já está previsto na lei e será uma mais-valia quando tivermos acesso a esse equipamento.
Foi segurança pessoal dos Presidentes da República Jorge Sampaio e Cavaco Silva. Qual o mais difícil de proteger?
Tive um grande gosto em ter trabalhado durante dez anos na Presidência da República. Os presidentes com quem tive a honra de trabalhar e com os quais mantive sempre uma relação muito cordial e profissional têm as suas características. Diria que não seria tão fácil trabalhar com o dr. Jorge Sampaio, porque ele era um grande humanista e gostava muito das pessoas. Por isso, era um bocadinho avesso à segurança, que o queria levar por caminhos onde não havia pessoas e ele queria ir por caminhos onde havia pessoas, independentemente dos riscos. O dr. Cavaco Silva, confiando totalmente no seu serviço de segurança, permitia que a segurança pessoal aplicasse aquilo que melhor sabia fazer: a técnica e a táctica da segurança pessoal.
Qual o que limitava mais os movimentos?
O dr. Sampaio por força da discrição que queria limitava um bocadinho os nossos movimentos. Permitia os dele, mas não permitia que o nosso trabalho fosse feito. Já com o prof. Cavaco Silva não havia limitação ao nosso trabalho. Podíamos exercer, sempre com discrição, mas usando os meios necessários para cumprir aquilo que era o nosso trabalho.