Que caminho pode fazer um novo centro de artes localizado entre Lisboa e o Porto? “Já sinto esse burburinho”, comenta Rita Gaspar Vieira. “Há uma curiosidade muito grande”. Sonho! Manifesto!, título (e tema) da exposição que vai inaugurar a Villa Portela, com que o Município quer afirmar a partir de Leiria “o que há de melhor na arte contemporânea”, inspira-se no livro homónimo de Sidarta Ribeiro, escritor e professor de neurociência, cuja investigação ajudou a curadora na “aproximação teórica e filosófica” a questões como “encontro, partilha e desaceleração do tempo”.
Decorridos 653 dias, a obra segue com quase quatro meses de atraso face à data de conclusão inicialmente prevista e a abertura ao público ainda vem longe. “Gostaríamos muito que fosse até ao final deste ano”, adianta a vereadora com o pelouro da Cultura na Câmara de Leiria, Anabela Graça. O prazo é subscrito por Rita Gaspar Vieira, artista contratada pelo Município para assegurar a direcção artística do Centro de Artes Villa Portela até 31 de Dezembro de 2024: “Temos tudo preparado para que da nossa parte possa acontecer”.
A primeira ocupação da Villa Portela beneficia de uma parceria com a Colecção de Arte Contemporânea do Estado (CACE) e conta com co-curadoria de Sandra Vieira Jürgens (actualmente curadora da CACE). “Estamos a preparar um acontecimento que inscreva Leiria no mapa das artes internacional”, resume Rita Gaspar Vieira. Com o mote “Em Leiria todas as árvores são pinheiros”, a exposição oferece “uma relação directa com a cidade e [também] com o estrangeiro”. Incluirá “projectos especificamente desenhados” para o momento, ou seja, criações inéditas que serão apresentadas pela primeira vez em Leiria.
O investimento de 2,8 milhões de euros – valor que deverá ser maior no final – está entretanto a revelar-se uma empreitada “com- plexa” e “exigente”, com desafios inesperados, admite Anabela Graça. “Em termos estruturais estava com muito mais fragilidades” do que se supunha e “houve necessidade de criar inclusivamente um cinto para abraçar o edifício”.
Sonho! Manifesto! estabelece, por outro lado, âncoras para a entrada em funcionamento da Villa Portela como centro de artes, numa propriedade com 17 mil metros quadrados (espécie de Serralves ou Gulbenkian à escala de Leiria) em que só nos três pisos do chalê do século XIX existirão 334 metros quadrados de área expositiva e onde o jardim também aparece como cenário para intervenções artísticas.
“Tem esta dimensão encantatória de olharmos para um espaço que esteve fechado e que várias gerações olhavam de fora”, a lembrar um “palacete romântico” que proporciona um “imaginário” de “fantasia”, avalia Rita Gaspar Vieira. Com a arte como “veículo agregador”, a responsável pela direcção artística procura que a Villa Portela se revele como destino capaz de atrair “si- nergias, energias, de acolher e não de excluir”.
Segundo Rita Gaspar Vieira, perspectiva-se um equipamento “para ser vivido socialmente, para ser vivido artisticamente, mas para ser também um lugar de estudo e de aprendizagens várias”, pronto a acolher desde crianças a seniores. E aponta: “Não é de todo para que esteja fechado e tenha um ar elitista”, pelo contrário, “é para as pessoas de Leiria e para as pessoas que não são de Leiria e vão querer estar em Leiria”. Um lugar onde “todos têm lugar”.
“Vamos criar uma nova centralidade cultural em Leiria”, sinaliza Anabela Graça. Na “linha programática para o futuro”, a vereadora antecipa o “potencial de cruzamento com outras artes, nomeadamente, a música [e] a dança”. Quer “diálogo” com “parceiros habituais” e considera “fundamental que os agentes culturais da cidade estejam envolvidos” naquilo que, reforça, “não é um projecto municipal, é um projecto colectivo”. No mesmo espírito, é certo que o acesso será gratuito, pelo menos, no arranque. “É fundamental que as pessoas sintam que estão na sua casa”.
A internacionalização é outro objectivo. “Vamos ter um elenco de nível internacional de artistas contemporâneos”, afirma Rita Gas- par Vieira. “Queremos que se saiba que Leiria existe, apesar de haver o hashtag Leiria Não Existe”. Ainda como critério, a ligação com as escolas e com instituições do ensino superior, desde logo, a ESAD.CR do Politécnico de Leiria, e a “relação muito forte de complementaridade” com o Banco das Artes Galeria (BAG), destaca Anabela Graça, que promete “abertura muito maior” no sentido de “reforçar” com “novas aquisições” a colecção de arte do Município de Leiria, hoje com 179 obras de 90 pintores.
Na transformação da Villa Portela, que até 2017 pertenceu à família de Ricardo Charters-d’Azevedo, constam salas de trabalho, uma biblioteca, ateliês para residências artísticas nas antigas cavalariças, um palco no exterior ao ar livre, uma cafetaria, um miradouro para o castelo e uma cafetaria.