Batuku e funaná no Largo da Sé, em Leiria? É já amanhã, sexta-feira, depois da meia-noite – e gratuito. Alguns dos ritmos mais tradicionais de Cabo Verde, mesclados com electrónica, vão balançar o concerto de Dino D’Santiago, provavelmente, o mais mediático de todo o festival A Porta em 2023.
Na oitava edição, A Porta abre no Largo do Gato Preto um palco exclusivo para bandas emergentes de Leiria (no sábado, com The Third Floor, Confused Minds, Terrible Mistake e The Speechless Monologue) mas o cartaz que o festival desenrola até ao próximo domingo leva muito mais arte – e muito mais mundo – ao centro histórico da cidade.
De Madrid, chega Julián Mayorga, músico natural da Colômbia, que traz a cúmbia temperada com surrealismo e psicadelismo pop; herdeira de Angola e da Argentina, a cantora e compositora Soluna imagina um futuro afro-latino na fusão do tarraxo com o reggaeton; e de Roma, mas a viver em Londres, a produtora e rapper Shunaji explora as possibilidades do hip hop em ligação com influências jazz, funk e soul, que já exibiu, por exemplo, em Montreux e Glastonbury.
Os quase 30 concertos do festival A Porta – sexta no Terreiro, no Largo da Sé e na Stereogun; sábado no Largo do Gato Preto, na Rua Direita e transversais, no Terreiro, no Largo da Sé e na Stereogun; domingo no Jardim da Vala Real – soam a diversidade. E transformação.
Há um fervilhar de culturas suportado em movimentos civis e sociais que se manifesta, também, através de artistas como Puta da Silva, que canta a experiência como prostituta afrotravesti e imigrante em Portugal; L’Homme Statue, com raízes em Paris e ascendência no Congo e na Costa do Marfim, radicado no Brasil, voz do corpo LGBTQ+ e negro; o queercore power trio bbb hairdryer, de Caldas da Rainha; o activismo não-binário de nëss; ou a afirmação feminina de Cookie Jane no território masculinizado do hip hop.
Destaque, ainda, para as actuações de Cave Story, uma das bandas portuguesas mais excitantes da actualidade, segundo Pedro Mexia e Inês Meneses no podcast PBX do Expresso; Equin?cio, premiados nos International Portuguese Music Awards; Femme Falafel, vencedora do mais recente Termómetro; A Sul, que ganhou o Novos Talentos Fnac 2023; e os colectivos Unsafe Space Garden e Sunflowers, com novos discos editados já este ano.
Uma comunidade em festa
Com uma centena de actividades para todas as faixas etárias, desde o berço à idade sénior, entre 11 e 18 de Junho, o festival A Porta faz vibrar o Terreiro, o Largo da Sé e a Stereogun na sexta-feira e no sábado, a Rua Direita e zonas adjacentes no sábado e o Jardim da Vala Real no domingo, mas, também, o Museu de Leiria (sexta, sábado e domingo) e o Banco das Artes Galeria (sexta e sábado).
Workshops, instalações, exposições, experiências, feiras e música ao vivo induzem o coração da cidade a pulsar como raramente acontece – a festa é “de todos para todos”, lembra a organização. Celebra o espírito comunitário e tanto se associa ao comércio tradicional – com mini-concertos na mercearia garrafeira Ferreira e na cestaria chapelaria Fonseca, por exemplo, entre outras incursões – como anima edifícios desocupados e espaços icónicos do património arquitectónico de Leiria.
O mote “A Rua Que Se Quer” é o gatilho para “recolher vontades e desejos” sobre a Rua Barão de Viamonte, a Rua Direita, assinala Miguel Ferraz, da equipa do festival A Porta.
Do Cirque du Soleil até Leiria
Depois do peddy paper e dos preparativos, montagens e limpezas com a participação de voluntários no fim-de-semana passado, nos últimos dias decorreram jantares temáticos e hoje, quinta-feira, realiza-se a segunda saída Transporta-te, com destino desconhecido e agenda revelada na hora.
Na programação 1001 Portas, sobressai a presença de Rui Paixão, dia 17, depois das 16:30 horas. O performer que trabalhou durante dois anos com o Cirque du Soleil estreia em Leiria o novo espectáculo protagonizado pelo palhaço de cabelo verde Godot.
Também no sábado, o artista Dino Luz vai realizar pinturas comemorativas no Filipes Bar e na Cestaria Fonseca que homenageiam duas figuras do centro histórico de Leiria, respectivamente, Manuel Oliveira, o Manel, que continua a servir clientes de várias gerações, e Felismina Soares, a D. Felismina, falecida em Dezembro.
Com algumas oficinas e actividades sujeitas a inscrição e lotação limitada, várias das quais já esgotadas, as 1001 Portas incluem shibari e rope bondage; massagem de som com taças de cristal, dança do ventre, yoga, tai chi, pintura, instalação, cianotipia, performance, showcooking, origamis, magia cómica, retratos escritos, uma conversa sobre liberdade de expressão com o grupo local da Amnistia Internacional; dança, grafia da luz e frisbee, entre outras propostas.
A feira bandida está de regresso: sábado na Rua Direita, domingo no Jardim da Vala Real.
Crianças e famílias
No programa Portinha, que também abrange oficinas e actividades sujeitas a inscrição e com lotação limitada, quase todas já esgotadas, há teatro de marionetas sobre o Menino do Lapedo, o achado arqueológico localizado no concelho de Leiria que tem estatuto de tesouro nacional, um peddy paper para descobrir a obra de Korrodi, que redesenhou o castelo; um passeio para conhecer a biodiversidade do rio Lis; e uma leitura dramatizada do texto Os Pés de Iria, da autoria de Luís Mourão, que integra a colecção Leiria com Livros.
Ainda no âmbito da Portinha, a drag queen Belle Pepper vai contar histórias inclusivas na sessão “Castelos Arco-Íris” e, tanto no sábado como no domingo, de manhã ou durante a tarde, não faltam sugestões: teatro e vídeo, brincadeiras com barro, dança, músicas com utensílios de cozinha ou misturadas com tintas, monotipia, pilates e pinturas faciais, entre outras.
Arte e participação
Desde a primeira edição, em 2014, A Porta procura encorajar a criação artística, o pensamento do espaço público e a participação cívica, em todas as idades. “Abrir as portas que estão fechadas ou aquelas pelas quais passamos todos os dias, mas não entramos”.
Este ano, o festival aprofunda o foco na Rua Direita e convida os habitantes do concelho (e visitantes) a reencontrarem-se com “alguns dos maiores tesouros da cidade” e com a malha de ruelas “onde bate o coração leiriense”, referem as notas de divulgação.
A organização d’A Porta estima ter recebido entre 12 e 15 mil pessoas em 2022.