O cenário geopolítico em 2024 foi marcado por tensões e transformações significativas. A vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, as guerras no Oriente Médio e na Ucrânia e a ascensão definitiva de um conjunto de países do Sul, com consequente reforço da multipolaridade global, irão marcar o próximo ano e muito provavelmente as próximas décadas.
O conflito na Ucrânia/Rússia continua a ser uma questão complexa e com implicações do ponto de vista económico, comercial e político ainda não compreendidas. Ao contrário do que o Ocidente previa, a Rússia não faliu em dois meses nem esgotou os seus stocks de armamento no primeiro mês de intervenção. Antes pelo contrário, o exército russo é hoje maior, mais profissional e o complexo militar industrial russo nunca foi tão eficiente. Produz mais mísseis e projéteis de artilharia que toda a produção somada do Ocidente, incluindo os Estados Unidos da América.
Do ponto de vista económico, a Rússia passou a ser a quarta maior economia do mundo medido em paridade do poder de compra (PPC). O produto interno bruto (PIB) da Rússia em 2024 equivale a 3,55% do PIB global (em PPC), superando o Japão, que tem 3,38%. As três maiores economias do mundo são China, os EUA e a Índia, respetivamente, com 18,8%, 15% e 7,9% do PIB global (FMI, 2024).
No final do presente ano a Rússia irá controlar grande parte das regiões que anexou ilegalmente em 2022, isto é, Lugansk, Donetsk, Zaporíjia e Kherson. As implicações para a própria segurança europeia e para as relações entre a União Europeia, Estados Unidos e Rússia serão profundas com o debate sobre soberania e recursos energéticos no centro das discussões.
Com a vitória de Donald Trump é de prever um aumento significativo na “guerra comercial” EUA-China. As disputas envolvendo tarifas, tecnologia e propriedade intelectual irão tornar-se mais tensas e afetarão as cadeias de valor globais. As prometidas medidas ultraprotecionistas de Trump irão tornar os mercados disfuncionais e terão implicações negativas sobre todos os países.
Ao contrário do esperado por Trump, os próprios Estados Unidos podem ser o país mais afetado. Por exemplo, o governo Chinês acabou de proibir a exportação para os EUA, de gálio, germânio, anti-mônio e outros metais de alta tecnologia fundamentais para a produção de armamento como resposta a medidas protecionistas americanas.
A ascensão dos países do Sul, como a Índia, Brasil, Arábia Saudita e Indonésia é uma realidade. A sua influência tem vindo a aumentar e já se posicionam como potências independentes e que fomentam a criação de novos blocos económicos e diplomáticos. A própria expansão do BRICS, com novos membros, reflete essa dinâmica bem como o enfraquecimento da hegemonia dos EUA e o declínio das normas internacionais, criadas pelos próprios EUA, impulsionam uma era mais complexa, onde potências do Sul moldam suas próprias agendas de forma independente.
De acordo com o FMI, a participação dos países do BRICS no PIB global atingiu 36,7% enquanto a participação do PIB global dos países do G7 (Canadá, França, Japão, Itália, EUA, Reino Unido e UE) está em declínio, tendo descidos dos 50,42% em 1982 para 29% em 2024.