Hoje, são todos quarentões. Não terá sido a primeira geração de skaters na cidade, será possivelmente a terceira, mas foi com eles que se deu o boom e Leiria foi colocada num patamar de respeito.
Vamos, pois, regressar aos anos 90 do século passado, altura em que eles eram teenagers cheios de vontade de fazer coisas.Um grupo de americanos vinha fazer uma demonstração ao saudoso pavilhão gimnodesportivo de Leiria, mas era necessário fazer as rampas.
João Sales, que até aí fazia skate por “mera diversão” integrou o grupo que, com a ajuda da Câmara, as construiu. Correu bem. “Ficámos entusiasmados por ver profissionais a andar em rampas feitas por nós. Foi muito marcante.”
“Cada um seguiu com a sua vida”, até que a chegada do Steve e a abertura da loja, em 1999, “deu um boost” ao grupo. Apostaram no “do it yourself” e começaram a construir rampas de cimento. Tudo começou num separador de auto-estrada, nos Pousos, mas pela cidade um tour da marca Emerica, com suecos, que explicaram a João Sales que tinham dado o passo adicional e começado a fazer não só rampas, mas skate parks.
Foi só meter mãos à obra. Um dia, descobriram um cerâmica abandonada, onde hoje é a Urbanização de Santa Clara, e resolveram ocupá-la. Aproveitavam a areia e os tijolos que lá havia, “acartavam baldes de cimento”, começaram lentamente a perceber como funcionava, a conhecer os truques dos ângulos, e foram acumulando novas rampas.
Entretanto, em 2008, João Sales, que era o obreiro principal, perdeu o emprego na empresa de peças de automóveis onde trabalhava. Coincidência das coincidências, precisamente nessa altura recebeu uma chamada de alguém que conhecia o trabalho que tinha feito na cerâmica e que o convidou para fazer uma rampa bowl em Alvalade.
“Sem saber muito bem, decidi avançar”. Foi a primeira que fez, mas surgiu uma, e outra, e outra, até que constituiu a Wasteland Skateparks, empresa que tem hoje “dezenas” de skate parks construídos em Portugal, Espanha e Suécia. Um hobby apaixonante tornou-se numa oportunidade de negócio. Os fundamentos do skate foram decisivos para ter conseguido sair daquele momento de dificuldade.
“Quem começa a andar vê o mundo de outra forma. Os bancos e as escadas são obstáculos para ultrapassar e levamos isso para a vida. É necessário ser resiliente e não desistir à primeira. Falhamos, pensamos como podemos melhorar e o que é preciso para nos superarmos.”
Steve Carreira concorda. “Tudo o que aprendi com o skate coloco no dia-a-dia. Para conseguires uma manobra tens de te esfolar, cair, bater com os dentes, partir um cotovelo e levantares-te sempre. Isso, depois, reflecte-se na vida.”
Gosta, por isso, de se agarrar àqueles miúdos “com certas revoltas e falhas de atenção”. “Com o skate consegue-se mandar muita merda para fora. O que me dá mais gozo é ver essa frustração a sair, de mostrar a vida como ela é.”
Vidigal
A cerâmica não foi, ainda assim, o primeiro skate park construído pelo grupo. Antes, fizeram “montes de coisas”. Começaram por construir umas rampas, ainda em madeira, num pavilhão antigo na Sarvinhos, na mesma zona da cidade.[LER_MAIS]
“Íamos para lá todos os dias, como se fosse nosso”, recorda Rúben Pinto. “Foi muito conhecido e havia gente que vinha de todo o País porque era o único coberto. Estava a chover e ali não chovia.”
Depois, mudaram-se para aquela que foi a casa dos skaters de Leiria por quase uma década, no Vidigal. “Fomos fazer uma demonstração nas festas do clube, levámos umas rampas e acabámos por ficar num barracão por baixo do ringue.”
“Dava-nos muito trabalho, mas era tudo para o desporto crescer”, explica Rúben Pinto, júri em campeonatos durante mais de 15 anos. “Nunca se viu como um negócio. O objectivo era pôr a cidade a bombar. A minha casa, durante muito tempo, parecia a casa do povo. As pessoas vinham para Leiria para fazer skate.”