Após averiguação dos factos, a ERS “determinou, a 09 de setembro, o arquivamento do processo”, lê-se na notificação enviada no mesmo dia à Unidade Local de Saúde (ULS) do Oeste, que gere os centros de saúde e hospitais da região, e a que a agência Lusa teve acesso. A decisão não é justificada no documento.
Numa resposta ao hospital em 26 de setembro, a que a Lusa também teve acesso, a entidade reguladora esclareceu ter concluído que “os procedimentos assistenciais empregues se revelaram aptos à garantia dos direitos e interesses legítimos da utente, que à ERS cumpre garantir, mormente do direito de acesso, em tempo útil, aos cuidados de saúde necessários e adequados à sua situação clínica”.
A entidade acrescentou que, até 05 de setembro, não foi efetuada “qualquer reclamação relativamente aos factos noticiados”.
Conforme é referido na notificação enviada à unidade de saúde, a ERS decidiu anexar o caso a um processo de monitorização dos condicionamentos de vários serviços de urgências obstétricas do país e solicitou que lhe sejam remetidas as conclusões da ação de controlo interno sobre este caso desencadeada pela ULS Oeste.
O Ministério Público e a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde também abriram inquéritos ao caso.
Em 05 de agosto (dia em que a urgência de Obstetrícia estava fechada), o comandante dos bombeiros de Caldas da Rainha, Nelson Cruz, relatou que às 07:21 uma ambulância da corporação foi acionada pelo Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) para socorrer a mulher, de 32 anos, que estava em frente à urgência, dentro do carro, com hemorragias, após sofrer um aborto espontâneo.
Chegados ao local, os bombeiros passaram informações sobre o estado da mulher ao CODU e disseram ao marido para ir pedir ajuda dentro do hospital, embora o homem já o tivesse feito assim que chegaram.
“O CODU deu a possibilidade de irem para a Maternidade Bissaya Barreto, em Coimbra, mas o colega alertou que a senhora estava com uma hemorragia tão abundante que não ia ser fácil chegarem […] em segurança sem terem um apoio diferenciado, porque são 130 quilómetros, mais de uma hora de caminho”, disse Nelson Cruz.
Após insistência dos bombeiros junto do CODU e do centro de orientação com o hospital, relatou, a mulher foi atendida às 08:04 por uma médica.
Já a ULS Oeste esclareceu que a mulher foi “prontamente admitida” quando a unidade soube do seu estado, o que é rejeitado pela família e pelos bombeiros.
Ao canal de televisão CNN, o marido da grávida – que não respondeu ao pedido de esclarecimentos feito pela Lusa – contou que a mulher estava a tomar banho quando sofreu o aborto, tendo ambos seguido para a urgência hospitalar, a cerca de meia hora do seu local de residência, com o feto “dentro de um saco”.
Enquanto a mulher ficou no veículo, o homem dirigiu-se à portaria do hospital, no distrito de Leiria.
“Dois porteiros perguntaram-me se estava a precisar de ajuda e eu disse que a minha esposa aparentemente teve um aborto espontâneo, estava ali e precisava ser atendida porque estava a sangrar”, relatou.
Os porteiros, acrescentou, “responderam que o hospital não estava a atender grávidas e pediram para telefonar para os números” indicados no cartaz afixado na porta, pelo que ligou para o 112.
Contudo, também confrontada com esta descrição do marido, a ULS respondeu que o homem questionou por duas vezes cada um dos vigilantes “sem referir em momento algum o motivo de vinda à unidade hospitalar” ou dar “informação relevante sobre a necessidade de assistência médica”.
Por isso, foi informado de que a urgência de Ginecologia/Obstetrícia não estaria a funcionar e que deveria seguir as instruções constantes do cartaz afixado, com os números de telefone da Linha da Saúde 24 ou do 112, a que o homem recorreu.
O hospital disse que apenas soube do estado de saúde da mulher quando foi contactado pelo CODU para uma médica obstetra avaliar a utente, após ser acionada a ambulância dos bombeiros de Caldas da Rainha, que se deslocou ao parque de estacionamento.
“A obstetra da ULS do Oeste, assim que tomou conhecimento da situação, deu instruções para que a utente fosse admitida na urgência, tendo a mesma sido então prontamente assistida”, afirmou a instituição hospitalar, acrescentando que “a situação mereceu o atendimento médico necessário e adequado à situação clínica” e que a mulher “ficou em vigilância na unidade hospitalar”.
O comandante dos bombeiros contrapôs referindo que já antes do contacto do CODU com o hospital, a pedido dos bombeiros, o homem insistiu na urgência para que a mulher fosse atendida, obtendo como resposta que uma médica se deslocaria ao veículo onde ela se encontrava, o que não aconteceu.