Uma universidade no Indiana, EUA, tem um canal de YouTube onde disponibiliza vídeos com entrevistas a pessoas relacionadas com o mundo do cinema de autor. Por ocasião do aniversário de óbito de Abbas Kiarostami (Teerão, 1940, Paris, 2016), fiz uma pequena pesquisa e encontrei um vídeo de oito minutinhos onde ele responde a umas quantas belas perguntas e que aproveito o tempo de antena para homenageá-lo transcrevendo/traduzindo algumas das suas palavras.
– Houve filmes ou peças de arte que influenciaram a tua direção enquanto cineasta?
– A própria vida vai criar mais oportunidades na nossa área, que a influência de filmes dos outros. Se calhar alguém que veja muitos filmes, pode adquirir essas influências, mas eu não, os meus olhos estão atentos à própria vida e os meus sentidos estão focados no meu ambiente. Posso afirmar sem dúvida nenhuma, que é a experiência de viver e o que me rodeia, que é influente e não o cinema e a literatura.
– Com que idade percebeste que eras cineasta?
– Nunca pensei que seria cineasta. Eu queria ser pintor. Comecei a pintar, mas não era um pintor de sucesso, nem na universidade nem no mercado. Por isso a partir da pintura mudei-me para as artes gráficas. Das artes gráficas fiz filmes publicitários e pintei livros de crianças. Não sei bem como, mas depois fui empurrado para o cinema. Fiz posters e trabalhos gráficos, mas nunca pensei que seria cineasta. Ainda hoje digo que não sou cineasta profissional porque faço uma grande variedade de trabalhos. Faço pintura e instalações em madeira, faço fotografia e sim também faço filmes.
– Por que é que fazes filmes?
– Já respondi a essa pergunta de uma maneira mas agora vou responder de outra, porque quando dou por mim estou transformado num poeta! Para criar tem de haver certas condições. O meu trabalho depende das possibilidades existentes. Há momentos em que as condições adequadas para fazer um filme tornam-se uma realidade. Aparece uma ideia digna de ser um filme, existe proximidade com um produtor, e ali encontram-se reunidas as condições para me tornar cineasta. Acontece a cada dois ou três anos. Nos entretantos faço fotografias, quando há luz e um sujeito interessante está em frente à camera. Quando não há luz vem me uma ideia e faço um poema.
– Para quem fazes filmes?
– Maioritariamente faço o que faço por mim. Se calhar por isso é que vou transitando entre trabalhos. Se um me aborrece mudo para outro. E é claro que a opinião de quem vê, me é importante, mas o que mais me motiva é o processo em si. A repercussão do trabalho rouba-me muita energia e eu prefiro concentrá-la em algo mais que isso.
– Qual o legado enquanto cineasta ou artista, que gostavas que persistisse?
– É dificil dizer o que gostava que ficasse. O que não destruí, despedacei ou abandonei, coisas com a minha assinatura, essas sim gostava de as confirmar e deixá-las. Contudo, pensar que um dia não existirei, mas que os meus trabalhos permaneceram, é algo em que não penso, porque eu tiro prazer na minha existência, não nos trabalhos que permanecem de mim. Se em oposição a isso permanecesse algo de mim mas eu não, então eu preferia existir e o trabalho não.