A única estrutura profissional de criação para marionetas no distrito de Leiria está a celebrar 25 anos de actividade e continua a surpreender, em Portugal e no estrangeiro. Destaques dos últimos meses, a ópera apresentada no Coliseu do Porto e a internacionalização do espectáculo Lúmen na capital de Espanha, com bonecos que atingem os cinco metros de altura. “A primeira vez que uma companhia estrangeira abriu as festas de Madrid, uma loucura”, comenta José Gil, um dos três colaboradores permanentes do colectivo sediado em Alcobaça, com Natacha Costa Pereira e Sofia Vinagre.
“É incrível, não é? Fazer o Coliseu do Porto com uma ópera de marionetas”, diz ao JORNAL DE LEIRIA. Em causa, O Retábulo de Mestre Pedro, de Manuel de Falla, parceria com a Orquestra Filarmonia das Beiras. “O trajecto tem sido assim. Também nunca nos passou pela cabeça fazer uma digressão em Nova Iorque, nunca nos passou pela cabeça fazer espectáculos no Irão”. Cerca de metade das 150 a 200 apresentações anuais da companhia acontecem no exterior e na lista de países surgem a China, a Índia, a Rússia e a Tailândia, entre muitos outros, do Oriente ao Ocidente.
Esta segunda-feira, 3 de Outubro, começa o festival organizado por José Gil, Natacha Costa Pereira e Sofia Vinagre, o Marionetas na Cidade. A promessa é a mesma da primeira hora. “Usamos a arte, neste caso o teatro, e especificamente o teatro de bonecos, para fazer aquilo que o teatro, não só o teatro, mas a arte, deve fazer. Não pode ser só uma coisa decorativa ou de entretenimento, tem de ter mais qualquer coisa, tem de dar uma chapada na cara”. As marionetas “sempre foram anti-poder, fracturantes” e protagonistas de momentos para adultos imaginados para “dizer a verdade”, lembra José Gil. Prémios ganhos em Portugal e na República Checa no ano passado e, anteriormente, em Portugal, República Checa, Roménia, Ucrânia, Cazaquistão, China, Polónia, Tailândia, Indonésia e Eslováquia, mostram que o colectivo de Alcobaça está a cumprir o objectivo, quando defende a tradição popular do Dom Roberto e quando pesquisa novas soluções ou produz eventos de grandes dimensões.
Desde 1997, são mais de 2.600 apresentações e mais de 50 produções estreadas. Várias vezes, ao longo dos anos, a companhia recorreu às marionetas para animar espectáculos de dança, ópera ou música. Também encenou o disco Por Este Rio Acima, de Fausto Bordalo Dias, e o texto A Viagem, de Sophia de Mello Breyner, além de originais de António José da Silva e William Shakespeare, colaborou com a versão portuguesa do musical da Broadway Avenida Q e com a banda The Gift no videoclipe “Question of Love”, lançou um canal de TV e, mais recentemente, nas redes sociais, a drag influencer Mariolinda Tradespi.
“Não me peçam para dar a única coisa que tenho para vender”, frase atribuída à actriz brasileira Cacilda Becker, continua em destaque no site da S.A. Marionetas, uma estrutura profissional constituída por autores, construtores e marionetistas, com casa na antiga escola primária do Casal do Pereiro, que é oficina, escritório e lugar de ensaio. E onde já falta espaço. O que a companhia não cede é a alma. “Nunca nos vendemos no sentido de criar coisas muito populares ou só de entretenimento, achamos que não faz sentido”.
Lúmen, o espectáculo mais trabalhoso criado até hoje pela S.A. Marionetas, envolve a população das cidades onde é apresentado, na rua, normalmente para um público de milhares, com pessoas da comunidade a manipular os bonecos. “Uma logística surreal”, mas, provavelmente, o exemplo das produções que a companhia quer explorar, no futuro, para conseguir visibilidade e continuar a vender outros espectáculos, de dimensões menos ambiciosas.
Na edição em que chega aos 25 anos, o festival Marionetas na Cidade anuncia 18 apresentações, de 11 companhias, provenientes de quatro países.
O programa, distribuído por nove espaços de apresentação em Alcobaça, entre 3 e 9 de Outubro, inclui ainda uma exposição de arte contemporânea, a publicação de cadernos de teatro das produções encenadas pela companhia e uma tertúlia.
No dia 5 de Outubro, será inaugurada a placa comemorativa dos 25 anos da S.A. Marionetas e da inscrição no Inventário Nacional de Património Imaterial Cultural do Teatro Dom Roberto, na Rua Dr. José Nascimento e Sousa.
Programa completo do dia 5 de Outubro:
Na Rua Dr. José Nascimento e Sousa (ponte junto à Biblioteca Municipal)
15:30 – Teatro Dom Roberto O Castelo dos Fantasmas – Marionetas Rui Sousa
16:00 – Teatro Dom Roberto A Tourada – Mãozorra Teatro de Marionetas
16:30 – Inauguração da placa comemorativa 25 anos da S.A.Marionetas e da inscrição no Inventário Nacional de Património imaterial Cultural do Teatro Dom Roberto
16:45 – Teatro Dom Roberto O Barbeiro Diabólico – S.A.Marionetas
Às 21:30 horas, no restaurante Corações Unidos, decorre a conversa Na Palheta Com… José Gil, Rui Sousa e João Costa.
O primeiro momento, no entanto, é a inauguração no Museu do Vinho, esta segunda-feira, dia 3, pelas 17:30 horas, da exposição Objectos Fascinados – Performances da Criação, de Natacha Costa Pereira, que fica patente ao público até 30 de Novembro.
Para comemorar os 25 anos de existência, a S.A. Marionetas vai publicar ao longo do ano os Cadernos de Teatro de Marionetas, com os textos originais criados por José Gil, Natacha Costa Pereira e Sofia Vinagre, de peças que estiveram ou estão em cena.
O lançamento do primeiro volume, com o título Inês de Castro, previsto para amanhã, foi adiado.
Os primeiros espectáculos do festival estão agendados para 5 de Outubro e os últimos acontecem a 9 de Outubro.
Com a maioria das apresentações a acontecer nas ruas de Alcobaça, com acesso livre, participam as companhias S.A. Marionetas, Marionetas Rui Sousa, Mãozorra, Vate / Acta, Caricata Teatro, Teodor Borisov, Fio d’Azeite, Cemal Fatih Polat, Marimbondo, Argila Verde e Red Cloud.