Na sexta-feira, 3 de Julho, a Campanha Inaugural do colectivo Til percorreu Leiria para expor os vazios da malha urbana, ou seja, os lugares sombra, que os olhos e a memória ignoram no dia a dia.
Da performance inserida no programa do Mapas – que vai de carrinha porta a porta – ficam sete pontos que iluminam “o lado mais esquecido, misterioso e solitário da cidade”, explica Gonçalo Lopes, um dos fundadores do grupo de designers e arquitectos.
(Percorra a fotogaleria acima com imagens dos primeiros dias do Mapas registadas por Idalécio Francisco)
O circuito deixado pelo colectivo Til começa no estacionamento do estádio municipal, com uma árvore plantada num buraco preexistente no deserto de alcatrão, continua com o jogo da macaca marcado no chão da rua ao lado do antigo Banco de Portugal, reúne duas cadeiras e uma mesa no interior da rotunda desnivelada junto ao Leroy Merlin, inclui um baloiço num parque infantil desactivado no largo da feira de Marrazes, prossegue com uma cesta a circular num sistema de roldanas debaixo do viaduto do IC2 perto do Porto Moniz, coloca uma escada para subir a uma manilha de betão no campus 2 do Politécnico de Leiria e termina num campo de futebol improvisado, num loteamento por concluir, na Cruz da Areia.
Cada intervenção tem um título – “Asfixia”, “Sanidade”, “Usurpação”, “Desaparecimento”, “Atropelamento”, “Clausura” e “Bancarrota” – que comenta um determinado intervalo numa realidade que, segundo o coletivo Til, “é feita de interrupções, fragmentos e restos que não vemos, pois estamos demasiado atarefados”.
São o produto de “colisões e conflitos” entre escalas diferentes e decisões sobre o território que geram “separação, isolamento e falta de comunicação”, acrescenta Gonçalo Lopes.
Na performance de sexta-feira, 15 minutos em cada etapa, com o silêncio como regra, só a bateria de Pedro Marques (First Breath After Coma), tocada ao vivo, conferiu som ao movimento. Objectivo: traduzir em ritmo as emoções de cada lugar.
Agora, eles esperam que aconteça o que acontece a todas as coisas no espaço público: “Que sejam roubadas, vandalizadas, cuidadas. Que as pessoas se relacionem com elas das formas mais diversas. O espaço público é isso”.
Programa até domingo
Até 12 de Julho, o Mapas (programa completo aqui) tem muito mais para oferecer. Hoje, pelas 18:30 horas, David Ramy (SAMP) e Antónia Barreto (ESECS Leiria) conversam no Jardim de Santo Agostinho sobre temas de educação, inclusão, comunidades e transformação pela arte e pela cultura, com moderação do JORNAL DE LEIRIA.
Amanhã, sexta-feira, a carrinha que é um centro cultural móvel leva os Lavoisier a tocar no Mercado de Santana (12:30 horas), Fonte Luminosa (18:00) e Rua Santa Casa da Misericórdia no Vale Sepal (21:30) – a dupla de Lisboa tem novo álbum, Viagem a um Reino Maravilhoso, que se inspira na obra de Miguel Torga.
No sábado, 11 de Julho, é a vez de Labaq (cantora e compositora brasileira radicada em Leiria) e Fado Bicha (duo de Lisboa que cruza os universos do fado e da comunidade queer) subirem ao palco sobre rodas para concertos no Bairro dos Capuchos (11 horas), Avenida Marquês de Pombal (18:00) e Terreiro (21:30), numa colaboração inédita.
O encerramento, no domingo, está entregue à SAMP, que se apresenta na Junta de Freguesia de Barreira (11:30 horas), na Praceta D. João I da Quinta do Alçada (15:30) e na Junta de Freguesia dos Pousos (18:30).
Diálogo com a cidade
Os primeiros oito dias de Mapas resumem-se numa palavra: diálogo. Com a cidade e entre artistas. Nuno Rancho e Inês Bernardo juntaram-se para criar um espectáculo de canções dirigido aos mais novos, Surma e o saxofonista Cabrita reuniram-se pela primeira vez.
Cartas para Leiria e para o Futuro, Rostografia e Pessoas-Mapas (ver texto abaixo sobre estes projectos) ajudaram a expressar narrativas sobre Leiria e sobre as pessoas que a habitam, tal como aconteceu durante a conversa entre Carolina Cravo (InPulsar) e Hugo Bastos Alves (SAMP) que decorreu no Bairro das Almoinhas
Veja o vídeo Pessoas-Mapas da Casota Collective com Maria Emília Crespo, nas Fontes
Momento importante, a passagem de ±MaisMenos±, o projecto de arte de intervenção e reflexão crítica alimentado por Miguel Januário, que gravou os moradores da cidade, em zonas como o Bairro Sá Carneiro, o centro histórico ou a Quinta do Alçada, a partir da pergunta “Se a minha rua falasse, o que diria?”
Vai haver um vídeo de quatro minutos, mas as respostas já foram projectadas, na noite de quinta-feira, no Parque do Avião e na Praça Rodrigues Lobo, entre outros destinos.
Um exercício de “deriva” e “descoberta”, que acontece numa fase “de transformação” do projecto ±MaisMenos±: “O trabalho sai de mim e vai para o outro”, torna-se “ferramenta para as pessoas” se fazerem ouvir, explica Miguel Januário ao JORNAL DE LEIRIA.
E o comentário do artista do Porto sobre a estadia de dois dias em Leiria também pode servir de legenda ao arranque do Mapas: “Foi superfixe”.