O Reino Unido é o primeiro mercado de exportação dos vinhos com origem no distrito de Leiria – 3,8 milhões de euros em 2017, o equivalente a 23% do valor obtido além-fronteiras – e é também um dos mercados mais importantes para a Parras Vinhos, que está já a sentir os efeitos da negociação entre Londres e a União Europeia. Os principais clientes da empresa com sede no concelho de Alcobaça “estão a stockar”, ou seja, a antecipar compras, entre “dois a três meses”, numa tentativa de “suavizar o impacto do mês de Março”, explica Luís Vieira.
"Estudo: Brexit representa risco médio alto para a indústria de Leiria"
O empresário que trabalha em território britânico com “a moderna distribuição” e com o online garante que “o abrandamento da economia não é catastrófico à data de hoje”. E lembra que a desvalorização da libra esterlina afecta todos os fornecedores internacionais de vinhos por igual, já que a produção interna, no Reino Unido, é diminuta. Ainda assim, a Parras Vinhos está a preparar-se para um ano de 2019 que pode ser muito diferente dos anteriores: “Tentamos ir a outros mercados com um pouco mais de afinco para compensar uma eventual quebra, portanto, estamos a focar-nos mais nos Estados Unidos, no Brasil, na China e também na própria Europa continental”.
“Estamos preocupados”. Também os fruticultores do distrito de Leiria olham com atenção para a evolução dos acontecimentos no Reino Unido, que é o primeiro mercado de exportação da maçã de Alcobaça e o segundo da pêra rocha do Oeste, de acordo com os números mais recentes do comércio internacional. Domingos dos Santos, presidente da Associação Nacional de Produtores de Pêra Rocha (ANP), explica que o factor cambial, precipitado pelo referendo de 2016, com a vitória do “sim” à saída da União Europeia, traz dificuldades de colocação do produto, pelo preço, que o sector tem conseguido minimizar através de outros canais de escoamento. “Fomos penalizados com a desvalorização da libra, baixámos significativamente os valores, porque também a própria Inglaterra tem um défice de poder de compra, de valor na carteira das pessoas”.
O dirigente lembra que o Brexit “é um problema político” e manifesta-se apreensivo face ao grau de indefinição que ainda se apresenta pela frente. “Estamos preocupados porque se aplicarem taxas aduaneiras que sejam bastante penalizadoras, em que o consumidor britânico não tenha condições para pagar, o que vai acontecer é que vai diminuir o consumo dos nossos frescos em Inglaterra e nós não carregamos num botão e vamos vender assim para outros lados”, afirma Domingos dos Santos. “Quanto mais obstáculos burocráticos introduzirmos, mais custos. A partir do momento em que vai haver fronteiras, despachos aduaneiros, um conjunto de procedimentos, isso vai onerar o processo, vai criar entropias”.
A solução para minimizar riscos passa por procurar mercados alternativos, algo que os fruticultores “têm constantemente vindo a fazer”, sublinha o presidente da ANP, notando que “uma das máximas do comércio externo é não ter os ovos todos no mesmo cesto”.
“Não é um drama”. Já para Jorge Soares, presidente da Associação dos Produtores de Maçã de Alcobaça (APMA), o Brexit “não é um drama”, porque o sector só exporta “20 a 30 por cento da produção” e os associados “cada vez mais estão a tentar colocar maçãs noutros mercados”, nomeadamente Colômbia, Brasil, países africanos e Espanha.
Em função da “instabilidade cambial” relacionada com o abandono da união política e económica com sede em Bruxelas, “o mercado inglês já não é tão importante” para os produtores de maçã de Alcobaçã “porque já não se posiciona como um mercado que valorize convenientemente a qualidade que exige e o serviço que exige”, afirma Jorge Soares. “E nesse campeonato dos preços baixos há países europeus produtores de maçã que não tendo a mesma qualidade, o mesmo sabor, os mesmos aromas, conseguem vender mais barato do que nós conseguimos para Inglaterra”.
Com um produto que “só tem viabilidade nos mercados de qualidade”, os produtores de maçã de Alcobaça continuam “muito atentos” ao que se passa na Grã-Bretanha, mas, porque admitem que a libra possa voltar a desvalorizar, apontam também a outros destinos, com poder de compra, como é o caso da Alemanha.
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Pela AAPI – Associação Acção Para a Internacionalização, que tem apoiado empresas do distrito de Leiria no mercado inglês, sobretudo em negócios relacionados com engenharia, construção e materiais, Nuno Morgado dá voz a uma leitura optimista. Diz que “não há em toda a Europa” outro “centro financeiro como o de Londres”, onde está “centralizado capital de toda a Europa e não só”, também “do mundo árabe, chinês, russo” e “de toda a Commonwealth”. Daí a recomendação dirigida aos empresários do distrito de Leiria: “Continuarem a fazer prospecção do mercado inglês, adaptarem-se aos novos regulamentos que Inglaterra vai ter, que, no fundo, vão ser parecidos, mas melhores, do que muitas outras partes do mundo, nomeadamente os Estados Unidos, a China, onde as empresas também trabalham”.
Nuno Morgado considera mesmo que o momento traz oportunidades, “porque a economia [britânica] vai absorver com muito carinho a entrada de outras empresas”. E lembra: “É muito mais estável aquele país do que muitos países africanos onde a gente continua a fazer investimentos malucos”, enquanto as “diferenças em termos de margens são abissais”. Por exemplo, “uma porta, em preço médio de mercado, tem um valor três vezes superior, uma caldeira a mesma coisa”.
“Reagir com maior oferta”. Em Alcobaça, a cerâmica Arfai exporta 30% da produção para o Reino Unido. A administração tem estado atenta e a agir preventivamente. “Através da inclusão de novos parceiros e da pulverização do percentual vendido por forma a diminuir o risco”, explica Carla Moreira. “Estamos a efectuar visitas ao mercado e clientes mais regulares e procuramos estar muito atentos a qualquer pequena movimentação dos nossos parceiros. Estamos igualmente a reagir com maior oferta de produtos e com maior frequência do que a habitual por forma a colmatar uma eventual descida no volume de compras”.
Até à data, o anúncio do Brexit não trouxe contributos negativos para o negócio da Arfai, pelo contrário, verifica-se “um acréscimo na procura por parte de novos clientes”. O maior desafio é a incerteza. “Temos procurado ouvir um sem número de pessoas entendidas na matéria. Contudo, acredito que as empresas de cerâmica do distrito de Leiria estão devidamente preparadas para fazer face a este e outros desafios que se avizinham pois possuem um produto reconhecidamente o melhor do seu género no mundo e o seu posicionamento permite-lhes procurar qualquer parceiro global e não só de proximidade”, afirma a gestora da Arfai.
Impacto potencial do Brexit na economia portuguesa
Fonte: CIP
-26%
A médio e longo prazo, um estudo divulgado pela CIP – Confederação Empresarial de Portugal admite que as exportações portuguesas de bens e serviços para o Reino Unido possam cair entre 15% e 26%, depois da saída do Reino Unido da União Europeia
-4,5%
A curto prazo, no horizonte do período de transição, a redução estimada nas exportações varia entre 1,1% e 4,5%
-3,2%
No estudo da CIP, as remessas de emigrantes enviadas do Reino Unido para Portugal diminuem entre 0,8% e 3,2%
-1,9%
O investimento directo estrangeiro em Portugal com origem no Reino Unido recua entre 0,5% e 1,9%