Decorria o ano de 1984 quando José Carapinha (sr. Carapinha, daqui para a frente) passou a ser presença assídua no dia-a-dia do Hóquei Clube de Leiria. Ainda era um clube jovem (o próprio também), com três anos de actividade, criado por um grupo de fãs da modalidade que quiseram ensinar aos mais jovens a deslizar em cima de uns patins.
Lembra-se que os filhos do seu vizinho convenceram os seus próprios filhos a experimentar a patinagem. Daí, começou a fazer parte da história do clube, já que pouco tempo depois era um dos vogais da patinagem. Chegou a ser presidente, sem que o ano do mandato esteja presente na sua memória. Na verdade, são quatro décadas de recordações que habitam na sua mente, com quase toda a história de um clube atrás.
Assistiu – assumindo alguma mágoa – ao vaivém do desporto que dá o nome a esta instituição. Inicialmente criado com equipas de hóquei, esta modalidade não resistiu à falta de atletas e de, principalmente, espaço para treinar. Ao longo dos anos, viu a modalidade no clube a nascer e a “morrer”, várias vezes, e hoje em dia mantém-se a vontade de reactivar esta secção. Mas já não será pelas mãos do sr. Carapinha.
Isto porque, 40 anos depois de conhecer todo o espectro da patinagem, está a dizer adeus ao Hóquei Clube de Leiria. “Aos 70 anos, [decidi] deixar os cargos directivos. Fui andando e a meta seguinte passou a ser aos 80, se lá chegasse. Aos 80, quero deixar tudo. Já não tenho pachorra para andar com preocupações. Quero descansar. Enquanto cá estiver, a ver se folgo um bocadinho e vou vendo o trabalho dos outros”, relata.
Está a passar o testemunho e recorda aqueles que ensinou a patinar ao longo de décadas. Apesar de, em cima de uns patins, não ser o mais talentoso. “Calcei os patins duas vezes. Experimentei a primeira vez no ringue do parque [do Avião], com uns patins de um velhote de 70 anos que dava lá treinos de iniciação. Andei, apoiei-me, dei uns passitos e ficou experimentado (risos). Uns anos mais tarde, calcei os patins do meu filho. Lá dei mais uns passitos e correu bem. Não tentei a terceira, para não correr mal”, brinca.
No entanto, o sr. Carapinha está na memória de muitos antigos atletas, pois era ele que pegava nas mãos das crianças e dava as indicações para as primeiras ‘viagens’ sobre rodas. “Hoje, sinto muito orgulho quando se dirigem a mim e dizem: “Oh senhor Carapinha, está bom? Ainda se lembra de mim?””.
Claro que o hóquei não vai desaparecer da vida deste antigo dirigente. Vai continuar a seguir a modalidade e o clube do coração, apesar de levar a mágoa de ver o clube a andar ‘de casa às costas’, ano após ano. A sede do Hóquei Clube de Leiria já passou pela antiga Escola Correia Mateus, pelo Mercado S’antana, pelo Mercado Municipal e, agora, está no Centro Associativo Municipal. “Dizia-se que era a título provisório, mas parece que o provisório se converte em definitivo”, comenta.
Sonhar com pavilhão
Taças, prémios e documentos ainda permanecem encaixotados, enquanto aguardam que uma lufada de ar fresco reactive o hóquei. Um sonho do sr. Carapinha, que a nova direcção leva a sério. “O sonho do sr. Carapinha vai manter-se, pelo menos para esta direcção. O clube surgiu do hóquei em patins, não vamos quebrar esta génese”, garante Miguel Narciso, presidente da direcção do Hóquei Clube de Leiria.
Também paira no ar a vontade de construir um pavilhão próprio. Uma ideia mais dispendiosa, que obriga o clube a “namorar algumas entidades públicas e privadas”. “Continuo convencido. Se conseguirmos um espaço, o resto depois também se consegue”, aspira o octogenário.
Por agora, é no Pavilhão de Santa Eufémia que a patinagem artística e de velocidade treinam. Estes últimos, ao sábado, ainda viajam até Canelas, local com instalações adequadas para as modalidades sobre rodas.
Com cerca de 60 atletas, o Hóquei Clube de Leiria dedica-se à patinagem artística e de velocidade, com espaço para uma escola que promove a aprendizagem inicial do desporto.
Ciente de que deixará de se preocupar com assuntos inerentes à gestão de um clube, o sr. Carapinha sabe o que fará na sua reforma. O que já faz até agora. É presença assídua no Viver Activo, programa que promove a actividade física junto da população sénior do concelho de Leiria, e vai continuar a cuidar da horta familiar. “Tenho boas recordações e ficam, principalmente, as amizades e o reconhecimento dos atletas”.