Nos últimos três anos, 44 pecuárias localizadas no concelho de Leiria, viram os seus processos de regularização serem considerados de interesse público municipal pela autarquia.
Esta classificação decorre do decreto-lei 165/2014, um regime extraordinário criado pelo Governo com vista ao licenciamento de estabelecimentos industriais, pecuárias, pedreiras e unidades de gestão de resíduos.
No total, o município já aprovou 70 processos do género, sendo que 44 abrangem agro-pecuárias. Na última sessão de Assembleia Municipal (AM), realizada na segundafeira, foram aprovados mais sete, com o assunto a suscitar contestação.
“Isto tem de parar”, apelou Manuel Azenha, eleito pelo Bloco de Esquerda, cuja bancada tem votado contra a atribuição desta classificação. “Esta Assembleia está a regularizar indústrias que poluem o nosso rio, aquelas que nada fizeram para mitigar a poluição que produzem e que têm responsabilidade directa pela não construção da ETES [Estação de Tratamento de Efluentes Suinícolas]”, afirmou o deputado, que criticou os critérios definidos pela AM para atribuição de interesse municipal.
Entre os aspectos contestados pelo bloquista está o facto de os parâmetros ambientais valerem “apenas dez pontos num total de 100”, o que permite que “em todos” os pedidos feitos à Câmara e aprovados pela AM “as indústrias apresentem a pontuação máxima em todos os critérios menos” naqueles que “dizem respeito ao ambiente”.
Apesar de admitir também lhe “custar aprovar interesse municipal para unidade poluentes”, Paulo Pedro, da bancada do PS, frisou que “nem todos os processos” dizem respeito a construções ilegais que agora procuram a regularização. Segundo diz, há também casos de instalações edificadas legalmente mas que, por força da entrada em vigor de “novas cartas de REN”, não podiam ser ampliadas.
[LER_MAIS] O presidente da Câmara, Raul Castro, frisou ainda que o reconhecimento de interesse público municipal não significa que a unidade seja regularizada, uma vez que esse licenciamento “depende do cumprimento das exigências da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional”.
“Não estamos a aprovar, mas antes a abrir portas ao processo de legalização”, acrescentou. Durante a AM foi aprovada uma moção, apresentada pelo BE, onde se apela ao Governo para desencadear “todas as medidas necessárias” para a construção de uma ETES de gestão pública e “com capacidade de tratamento adequada ao volume de resíduos produzidos na região”.
Daniela Sousa, do PAN – Pessoas, Animais e Natureza, votou contra, por defender que a responsabilidade do tratamento dos efluentes é do sector e não do Estado.
Perto de 300 queixas em três anos
Nos últimos três anos, a Comissão de Ambiente e Defesa da Ribeira dos Milagres apresentou, junto das entidades competentes, cerca de 300 queixas por crimes ambientais na ribeira dos Milagres.
O dado foi revelado por Rui Crespo, porta-voz da organização, durante a última sessão da Assembleia Municipal, onde o ambientalista acusou este órgão autárquico e a Câmara de prestarem “ajuda” às explorações em incumprimento.
“Quando a Lei previu que todas as suiniculturas tivessem de cumprir com justas exigências ambientais, os suinicultores contornaram a situação com a ajuda desta Câmara e da Assembleia, sendo-lhes atribuído o reconhecimento de interesse público municipal para a sua legalização”, criticou no início da sessão, onde foram aprovados mais sete processos, seis referentes a pecuárias.
“Quantos metros cúbicos de efluente proveniente das pecuárias que hoje são aqui propostas a reconhecimento de interesse público municipal chegaram a uma estação de tratamento nos últimos anos?”, questionou