Como mudei de casa trouxe atrás de mim todos os objetos e livros que lá sentia a falarem comigo. Agora, no meu novo nicho de trabalho, ando a arrumá-los e é estranho pôr-me a avaliar o que desse meu humilde pecúlio decido manter ou deitar fora.
Com os objetos tem sido relativamente fácil: apesar de pouco valiosos estão já há gerações na família e, por isso, ao guardá-los sinto-me a respeitar a materialização dos afetos dos meus antepassados e gosto dessa sensação. Já com os livros, por onde estudei toda a minha vida, ando indecisa.
Como um todo, se alguém lhes pegasse no futuro, eles apenas se mostrariam como instrumentos de trabalho de uma professora no século passado. No entanto a mim, hoje, eles ainda me servem.
Agora, por exemplo, li no epílogo de um livro que comprei em 91 e que se chama Como educar as atitudes o seguinte: “Qualquer discurso sobre a educação de atitudes tem como fulcro a atitude pessoal do educador.(…) Pensamos que como ponto de partida de todo o processo deve estar a crença interior do educador nos valores e atitudes que deseja formar nos jovens. (…) Os alunos devem ver encarnados em nós esses mesmos valores e atitudes que lhes transmitimos”.
A estas recomendações, feitas neste livro, poder-se-iam vir juntar centenas de outras, de outros temas, retiradas dos meus velhos livros como conhecimento pertinente e por isso ainda repletas de utilidade, na escola dos dias de hoje.
E sim, é verdade, tenho sentido o quão verdadeiro é aquele tão ridicularizado cliché que afirma que os problemas, com os alunos atuais, surgem porque sendo eles do século XXI, ainda vão a uma escola moldada no século XIX.
Se não, que outro motivo haveria para escolas e professores [LER_MAIS] ignorarem a importância dos preciosos ensinamentos publicados nos livros, do século passado, sobre o ensino e a aprendizagem?
E, às voltas com as atitudes e porque elas se ligam às nossas formas habituais de pensar, de sentir e de nos comportarmos, foquei a empatia e fui procurar um artigo sobre o assunto.
Num estudo recente, realizado na Finlândia, concluiu-se que é a empatia do professor a chave para o desenvolvimento académico do aluno.
Ora, como sei que nada dá mais alegria a um professor do que o sucesso académico dos seus alunos e, ultimamente, só encontro professores desesperados, fui à procura de um outro estudo, desta vez sueco, da Universidade de Linnaeus sobre a saúde dos professores.
Nele concluiu-se que para se sentirem bem os professores não necessitam só de ensinar, mas também de aprender. Diz-se que é essa aprendizagem que faz com que se sintam a disfrutar do seu trabalho até ao ponto de ficarem encantadoramente absorvidos por ele e que tal influencia muito positivamente a sua saúde.
Acreditem ou não, mas estas conclusões para mim não são nenhuma novidade, há muito que eu já as conhecia. Prontas para serem retiradas já estavam, todas elas, nos meus velhinhos livros técnicos… E que coisa mais engraçada!
Pela primeira vez olho para eles, para os livros que me ensinaram a ser professora, e neles vejo profetas. Volto à terra, à minha mudança de casa e tal “visão” ajuda-me a decidir.
Deitar fora os meus profetas? Jamais!
Professora
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990