Apenas 250 metros de canalização separam a ETAR do Coimbrão e o regadio do Vale do Lis, mas a água residual tratada continua a ser lançada ao rio e a não ser aproveitada para rega.
A empresa Águas do Centro Litoral (AdCL), que gere a estrutura, alega que a Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do Lis (ARBVLis) não tem revelado “grande manifestação de interesse na reutilização” dessa água. Os agricultores refutam as acusações, assegurando que estão “disponíveis e ávidos” de a aproveitar, desde que “cumpra os critérios de qualidade exigidos”.
O Decreto-Lei n.º 16/2021 determina que a produção de água para reutilização, obtida a partir do tratamento de água residuais, “passe a integrar a actividade principal das empresas do grupo Águas de Portugal”, à qual pertence a AdCL. No entanto, há ainda um longo caminho a percorrer, uma vez que menos de 1% da água tratada nas ETAR da região é reutilizada.
No caso do Coimbrão, a estrutura tem, desde a sua construção, em 2008, “um sistema repartidor de caudal à saída”, com o objectivo de fornecer água tratada para rega nos campos do Lis. Por seu lado, o sistema de regadio também já está preparado com uma ‘espera’ para receber esse caudal.
O JORNAL DE LEIRIA foi tentar perceber as razões para a inoperacionalidade desse sistema. Do lado da AdCL, alega-se que, “não obstante alguns contactos estabelecidos com a ARBVLis desde a entrada em funcionamento da ETAR do Coimbrão, nunca houve por parte” da organização “grande manifestação de interesse na reutilização da água tratada na ETAR”.
“Esse argumento não corresponde à verdade. A associação de regantes está, como sempre esteve, disponível e ávida de usar essa água, mas é preciso que seja garantido que a podemos utilizar para rega”, contrapõe Henrique Damásio, administrador-delegado da ARBVLis.
O responsável explica que, a par da ligação entre os dois sistemas, com “cerca de 250 metros de canalização”, são necessárias análises à água, além das efectuadas actualmente, para assegurar que cumpre os parâmetros para rega. Uma responsabilidade que, defende Henrique Damásio, deve ser assacada a “quem lança a água tratada no domínio hídrico”, ou seja a AdCL, também porque a associação “não tem condições financeiras e logísticas” para fazer esse trabalho.
Tratamento adicional
A empresa insiste, no entanto, que “é fundamental que a ARBVLis/ agricultores tenham interesse na água tratada na ETAR e definam os usos” que pretendem para a mesma. “Caso se confirme o interesse, será necessário efectuar um tratamento adicional à ApR [água para reutilização] do Coimbrão”, informa.
A AdCL argumenta ainda que a recente intervenção no sistema de regadio do Vale do Lis, que passou “de gravítico para pressão”, implicará também “adaptações significativas” do modelo implementado aquando a construção da estrutura para o aproveitamento da água para rega. E especifica: “Para que a infra-estrutura funcione afigura-se necessário electrificar as válvulas e todo o sistema de comando.”
APA quer apertar condições à ETAR
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) quer que, no âmbito do novo título de utilização dos recursos hídricos, a ETAR do Coimbrão passe também a estar sujeita ao “cumprimento dos parâmetros microbiológicos ao longo de todo ano”.
A informação é avançada ao JORNAL DE LEIRIA pela APA, revelando que essa imposição está já vertida na proposta de emissão dotítulo provisório para a rejeição das águas residuais tratadas da ETAR no rio Lis, que se encontra em sede de audiência prévia.
Segundo a APA, a proposta da nova licença mantém a obrigatoriedade do cumprimento dos parâmetros definidos anteriormente e da “monitorização do meio receptor, a montante e a jusante do ponto de descarga”.
O cumprimento dos parâmetros microbiológicos é uma das reivindicações da Câmara da Marinha Grande, que, com base nos dados da monitorização da qualidade da água do Lis, entre 2010 e 2022, atribui a poluição do Lis que se manifesta na Praia da Vieira ao funcionamento da ETAR do Coimbrão.