Fez este mês cinco meses desde que as chamas consumiram mais de 80% do Pinhal de Leiria. Desde então têm sido várias as acções de reflorestação por parte de privados para ajudar a renascer das cinzas um dos maiores pulmões do País.
Todas as plantações que surgem da solidariedade e voluntariado de empresas e população têm sido realizadas em conjunto com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), que elabora os projectos e prepara o terreno para a arborização.
No entanto, segundo Octávio Ferreira, engenheiro silvicultor do ICNF, cerca de dois terços da área ardida do Pinhal de Leiria vão rearborizar sem intervenção humana. "A área ardida é muito extensa. Com estas iniciativas é possível arborizar algumas centenas de hectares, mas ficamos muito longe da área total que é preciso rearborizar. De resto, da área que ardeu, cerca de dois terços, vai rearborizar naturalmente", garantiu Octávio Ferreira, à margem de uma iniciativa de reflorestação de uma empresa de aluguer de automóveis, que mobilizou cerca de 100 colaboradores para plantarem 500 árvores, em Vieira de Leiria, no concelho da Marinha Grande.
Segundo o engenheiro, "arderam pinhais já com idade, que tinham pinha e produziam semente e, como tal, a natureza vai-se encarregar de fazer a rearborização". No entanto, existem "alguns milhares de hectares em que é necessário plantar pinheiros” e além das iniciativas particulares, "terá de ser o ICNF, [através] o Ministério da Agricultura, a suportar a maior parte dessa mesma rearborização", acrescentou.
Também Viriato Garcez, director do Departamento do ICNF do Centro, destacou a importância da regeneração natural da mata, que é “completamente diferente”, já que nascerão “plantas muito melhor do que outras que venham de outro lado qualquer”.
[LER_MAIS] O responsável, que falava durante uma reunião na Marinha Grande com os deputados da Comissão de Agricultura e Mar, acredita que esta arborização natural deverá verificar-se dentro de “um ou dois anos”. Para já, vão continuar as iniciativas de reflorestação, que deverão parar em Abril, altura em que deverão estar plantados 450 hectares.
“Todas estas acções que são feitas por voluntários carecem sempre de um projecto elaborado por nós. Continuamos a ter algumas solicitações e o que vamos fazer é ‘empurrá-las’ para Outubro, Novembro e Dezembro, novamente uma altura de plantação. Esta época está praticamente preenchida”, garantiu Viriato Garcez.
Este responsável reforçou que as árvores plantadas são certificadas. O director do Departamento do ICNF do Centro afirmou que logo após os incêndios houve “urgência” em fazer-se a marcação de arvoredo “por causa do perigo que as mesmas acarretavam”.
“Ainda continuamos a fazer alguns cortes e venda dessas mesmas árvores junto às estradas.” O ICNF interveio ainda na ribeira de Moel, com acções de estabilização e algumas estradas encerraram como prevenção de quedas de árvores. Além da vertente produtiva da mata nacional, o pinhal também era muito utilizado para recreio. Nesse sentido, e porque se aproxima o Dia da Espiga, comemorado com muita tradição na Marinha Grande, o ICNF está a enveredar esforços para garantir a reabertura da maioria das estradas, de modo a permitir à população realizar os habituais piqueniques.
Ventos marítimos travados
O cenário despido do Pinhal de Leiria tem levantado alertas para a barreira que se perdeu junto ao mar e que travava os ventos marítimos. No entanto, Octávio Ferreira afirmou que o incêndio de Outubro "não chegou à orla marítima".
"O arvoredo que havia próximo da duna primária não ardeu", à excepção de um caso ou outro. Portanto, "não está em causa o avanço das dunas". Segundo explicou, esse avanço poderá estar em causa se as pessoas pisarem as dunas, o que irá danificar a vegetação que as segura.
O engenheiro silvicultor acrescentou que na zona mais interior da mata nacional "as areias estão muito consolidadas, com muita matéria orgânica, portanto, não se põe o problema de haver erosão eólica, designadamente".
Entretanto, a associação de defesa do ambiente Quercus afirmou esta semana que Portugal é o país da Europa com menos área florestal pública e transmitiu preocupação com as desafectações de áreas florestais para indústria e agricultura intensiva.
Num comunicado, dá os exemplos do perímetro florestal dos pinhais e dunas de Mira, em Coimbra, "em risco com a construção da nova unidade da Lusiaves" e do pinhal de Leiria, onde dizem haver "pressões recentes” para converter partes daquela área em zonas de agricultura intensiva.
Relatório aponta para falhas na programação do socorro
Falhas na programação do socorro e na rede de comunicações e um “dramático abandono” das populações foram identificados pela comissão técnica independente de análise dos grandes incêndios de Outubro. "Era possível encontrar soluções prévias de programação e de previsão que pudessem ter amenizado o que foi a expansão do incêndio", afirmou João Guerreiro, presidente da comissão, em declarações aos jornalistas, no parlamento, citado pela Lusa. A comissão refere ainda que a junção de vários factores meteorológicos constituiu “o maior fenómeno piro-convectivo registado na Europa até ao momento e o maior do mundo em 2017, com uma média de 10 mil hectares ardidos por hora entre as 16 horas do dia 15 de Outubro e as 5 horas do dia 16”. Contudo, acrescenta o relatório, a Autoridade Nacional de Protecção Civil pediu um reforço de meios para combater estes incêndios devido às condições meteorológicas, mas não obteve “plena autorização a nível superior”. A ANPC propôs para reforço do dispositivo para a fase ‘Delta, entre 1 e 15 de Outubro, 105 equipas de combate, tendo sido autorizadas 50, tendo também sido recusadas 200 horas de voo suplementares para duas parelhas de aviões anfíbios médios e 40 operacionais para a Força Especial de Bombeiros (FEB), bem como uma parelha de aviões anfíbios médios e quatro meios aéreos. As queimadas e o fogo posto foram as duas principais causas das mais de 900 ignições registadas nestes fogos, considerando-se preocupante o número de reacendimentos. O panorama vivido nesses dias traduziu-se “numa situação de dramático abandono, com escassez de meios, ficando as populações entregues a si próprias”. Os peritos consideram que tem de haver das autoridades “flexibilidade para ter meios de previsão e combate em qualquer época do ano” e defendem a criação de uma unidade de missão para reorganizar os bombeiros.