Depois da degradação que se acentuou nos últimos anos, o conjunto de edifícios localizado na esquina da Rua Comandante Almeida Henriques com Rua Machado Santos, em Leiria, onde em tempos funcionou o Grémio Literário e Recreativo, vai ganhar nova vida.
Adquirido no final de 2015 por uma empresa de Avelino Gaspar, fundador e presidente do Grupo Lusiaves, o bloco de prédios será transformado no Edifício Comendador, com a criação de 23 apartamentos.
De acordo com informações prestadas ao JORNAL DE LEIRIA pelos promotores, o projecto, da autoria do atelierSaraiva + Associados, prevê habitação de tipologias T1 a T4, todas com lugares de estacionamento.
Está também contemplada a criação de duas lojas “de referência”, sendo que, para já, não são divulgadas as marcas.
Sobre a filosofia inerente ao projecto, os promotores explicam que houve a preocupação de 'casar' o estilo original do projecto, desenhado por Camilo Korrodi, nas fachadas com a modernidade dos interiores.
“Logrou-se alcançar um elegante contraste entre o classicismo da fachada e a contemporaneidade dos interiores" referem, sublinhando a “particular atenção” dada ao desempenho energético, térmico e ambiental. Nesse sentido, estão previstas “as soluções mais modernas e inovadoras nesta matéria”.
A responsabilidade de consumar esse 'casamento' foi entregue ao atelier do conceituado arquitecto Miguel Saraiva, responsável por vários projectos premiados a nível nacional e internacional, onde se destacam, por exemplo, o Furnas Boutique Hotel, o Royal Óbidos Resort ou o Internacional El Ryad, na Argélia.
Trata-se do maior atelier de arquitectura do País, presente em 14 países de quatro continentes, que já foi considerado a 109.ª empresa do sector no mundo.
[LER_MAIS] Do trabalho do atelier em torno do quarteirão do antigo Grémio resultou, segundo os promotores, uma proposta para “um empreendimento singular, com nível de qualidade superior, que combina a autenticidade da vida no coração da cidade com o conforto da modernidade”.
As obras deverão arrancar ainda este mês, não tendo sido divulgado, para já, o valor do investimento, que, de acordo com os promotores, “é mais uma aposta do presidente do Grupo Lusiaves na promoção e desenvolvimento das regiões onde desenvolve a sua actividade profissional”.
Este não é o único investimento que o empresário tem em curso na cidade de Leiria. Em 2016, uma empresa liderada por Avelino Gaspar adquiriu também a Quinta da Portela, um terreno situado nas traseiras da Villa Portela com cerca de 17 mil metros quadrados.
Na Quinta da Portela deverá nascer um projecto imobiliário de qualidade “muito acima da média” e de linhas arquitectónicas inovadoras, que colocará Leiria “na primeira linha do mercado imobiliário”, segundo revelou na ocasião fonte da Lusiaves ao JORNAL DE LEIRIA.
Tal como o quarteirão do Grémio, o projecto para a Quinta da Portela está a ser desenvolvido pelo arquitecto Miguel Saraiva. “As duas aquisições revelam uma clara aposta [de Avelino Gaspar] na cidade de Leiria, procurando contribuir para o seu desenvolvimento em geral e para a dinamização do centro histórico em particular”, sublinhava aquela fonte.
Compra do edifício nos anos 50 com venda de pinhal
A história dos edifícios que compõem o quarteirão remonta a meados do século XX. Conta-se que terão sido comprados pela família Oriol Pena – cujos descendentes estiveram na posse do prédio até final de 2015 – com o lucro de um corte de pinheiros na Mata da Curvachia.
“[Maria Benedita de Oriol Pena Cordes Cabêdo] Adquiriu o edifício com parte do dinheiro da venda dos pinheiros da Curvachia”, contou ao JORNAL DE LEIRIA, no final de 2016, Carmo Cabêdo Sanches, uma das proprietárias daquela mata.
Da autoria de Camilo Korrodi, filho de Ernesto Korrodi, o edifício foi palco de passagem de diversas gerações de leirienses, tanto nos serões do Grémio Literário e Recreativo, que incluíam bailes muito concorridos pelas elites (ver caixa), como no restaurante Verde Pinho, que fez furor nos anos 70. Também as instalações do concessionário da Ford marcaram o lugar.
Dada a dimensão do imóvel, a sua reabilitação poderá fazer mexer toda aquela zona, que faz a ligação entre o centro histórico da cidade e a alta de Leiria, onde funcionam o Tribunal Judicial, a Câmara Municipal, a Segurança Social e várias escolas, além do corredor habitacional que constitui a Avenida Marques de Pombal e envolventes e a futura urbanização prevista para a Quinta da Portela.
Constituído na segunda metade do século XIX, em resultado da fusão entre duas instituições similares existentes na cidade, o Grémio Literário e Recreativo de Leiria começou por funcionar na Praça Rodrigues Lobo.
Em 1959, transferiu-se para a Rua Machado Santos, afirmado-se como uma instituição de referência na cidade. Nos seus tempos áureos, os sócios eram escolhidos a dedo e a sua admissão tinha de ser aprovada em reunião de Direcção.
Os bailes de Carnaval eram o ponto alto da actividade do Grémio, sendo que os estatutos determinavam que só podiam entrar raparigas com mais de 16 anos e rapazes com mais de 18.
No dia-a-dia, funcionava como clube, onde se jogava bilhar, cartas, bridge e canastra e onde os livros eram muito procurados. Chegou a ter uma sala de ballet dinamizada pela bailarina Isabela Affonseca, irmã da pianista Maria Carlota Tinoco. Na viragem do século, entrou em declínio, acabando por fechar portas.