A nota de Educação Física vai voltar a contar para a média de acesso ao ensino superior. A mudança entrará em vigor já no próximo ano lectivo, abrangendo os alunos que entrarem para o 10.º ano.
E, tal como aconteceu em 2012 quando, por decisão do então ministro da Educação Nuno Crato, a avaliação à disciplina deixou de entrar no apuramento da nota de acesso, também agora a inversão da medida divide opiniões.
Formado em Educação Física e presentemente a dar aulas na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais (ESECS) de Leiria, José Amoroso aplaude a decisão do actual ministro, considerando que vem “reparar um erro” do passado recente.
Sem saúde e sem actividade física somos um pouco mais pobres. Todas as disciplinas contribuem para o desenvolvimento de cidadãos mais completos. Pelo que, não faz sentido a discriminação de áreas como a Educação Física e as expressões artísticas”, defende o docente, para quem era um “absurdo” que, sendo obrigatória, a disciplina não contasse para a média de acesso ao ensino superior. “Que mensagem estávamos a passar aos alunos? De que não valia a pena esforçarem-se?”, questiona o investigador.
Esse não é, no entender do presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), o foco da questão. “Não é pelo facto de contar para a nota que a Educação Física vai ser mais valorizada pelos estudantes. Isso consegue-se com motivação e incutindo o gosto pela disciplina nos alunos, o que passa também por saber de que modo está a ser dada e se os seus programas fazem sentido”, alega Jorge Ascenção.
Ao JORNAL DE LEIRIA, o representante da Confap lamenta ainda que, em vez de se debater a mudança do regime de acesso ao ensino superior, se avance com uma medida “avulso”, que irá “impedir muitos jovens de seguir as suas aptidões” porque, apesar do seu desempenho, “não conseguem obter boas classificações a Educação Física”, o que acaba por lhes “descer a média geral”.
[LER_MAIS] Posição idêntica tem o presidente do Conselho das Escolas, organismo que representa os directores junto do Ministério da Educação. Em declarações recentes ao jornal Público, José Eduardo Lemos reafirma a posição desta entidade, expressa num parecer divulgado no ano passado, onde é defendido que a classificação final da disciplina “não deve ser considerada em qualquer cálculo para o acesso ao ensino superior, excepto se o aluno assim o entender”.
Este seria, na opinião do Conselho de Escolas, a forma de conseguir “um equilíbrio”, não prejudicando “milhares de alunos que, por falta de aptidão”, são “travados” nas suas escolhas, por via da nota de Educação Física.
José Amoroso refuta esse argumento, referindo os resultados de um estudo de mestrado de uma aluna do Instituto Politécnico de Leiria, segundo o qual “80% dos estudantes beneficiam da integração da nota de Educação Física” no cálculo da média de acesso ao ensino superior. Mas, mais importante do que isso, “é preciso valorizar uma área fundamental para o nosso desenvolvimento e bem-estar” e acabar com a ideia de que a Educação Física é uma disciplina de “segunda linha”, frisa o docente da ESECS de Leiria.
OPINIÃO
Rui Matos, professor e investigador em Motricidade Humana
"Na sequência de posições publicamente divulgadas, defendo o fim da dependência do ensino secundário (obrigatório) face ao superior (facultativo), parecendo apenas existir o primeiro como ponte de passagem para o segundo.
Entre outros motivos, consubstancia desrespeito e contradição face à visão renovada do perfil do aluno no final do ensino secundário e à intenção de atribuir às escolas autonomia pedagógica, onde existe, claramente, mais vida para além das notas em geral.
Logo, sou defensor de que nem a classificação da disciplina de Educação Física nem a de outra qualquer contem para efeitos de (não) acesso ao ensino superior. Contudo, e enquanto se mantiver o actual sistema, esta reposição é de toda a justiça, sendo insustentável a manutenção da sua discriminação (negativa).
O argumento de que, face à sua especificidade, a sua classificação poderá prejudicar quem para ela tem menos jeito, será claramente rebatido por aqueles que se possam queixar de falta de jeito para a matemática ou para as línguas…"
Jorge Ascensão, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais
"A questão em debate devia ser a alteração do paradigma de acesso ao ensino superior, que levasse a que a média obtida no ensino secundário servisse apenas para avaliar as certificações do aluno para este nível de ensino e não para determinar o acesso ao ensino superior, impedindo muitos alunos de seguir as suas aptidões por centésimas ou milésimas.
Enquanto o sistema actual se mantiver, não concordo que a nota de Educação Física conte para a média, porque funciona como factor de injustiça para aqueles alunos que não se sentem tão à vontade nesta disciplina que é obrigatória.
Quem não tiver tanta apetência para a Matemática, por exemplo, pode escolher outras áreas. Não é o facto de a nota contar para a média que fará com que a Educação Física passe a ser mais valorizada pelos estudantes".