Chama-se Música Omnipresente e, neste ano lectivo, tem como objectivo levar artistas e programadores de Leiria em sessões periódicas e intensivas a comunidades escolares do concelho a fim de educar e formar alunos do 2.º Ciclo do Ensino Básico e Secundário, através da música, usando-a como mecanismo para abrir horizontes, trabalhar outras artes, formar públicos com alunos, pais e comunidades, sugerindo-lhes eventos em espaços culturais da cidade onde estarão em contacto com artistas e programadores de várias áreas.
Mas a iniciativa também incentivará e orientará novas bandas, chamando-as a competir na Feira de Maio, num concurso que procura projectos da “nova música de Leiria”.
Porém, o primeiro passo é a exploração das potencialidades, a nível pedagógico, de um município cuja imagem de marca se tem afirmado pela música, alicerçada na existência de várias filarmónicas centenárias, escolas de música reputadas e bandas e artistas da chamada “nova música de Leiria” reconhecidos a níveis nacional e internacional, músicos, agentes e programadores culturais, editores, técnicos e promotores.
A iniciativa, que resulta de uma parceria da Omnichord Records com o Serra – Espaço Cultural e apoios do Município de Leiria, JORNAL DE LEIRIA e Livraria Arquivo, irá nos próximos meses às escolas em busca de novos talentos e projectos e, numa abordagem pedagógica, explicar que a música está em todo o lado e que, no universo musical, trabalha muito mais gente além dos artistas.
“Tocar é a “última das prioridades. Queremos mostrar tudo o resto: como funciona a promoção, os videclipes, os bastidores, isto e aquilo”, refere Hugo Ferreira, fundador da Omnichord Records e um dos promotores da Música Omnipresente.
Zus! é força, é coragem, é ânimo
Sabe qual é a última palavra do Dicionário da Língua Portuguesa? É Zus. Esta é uma interjeição que quer dizer força/coragem/ânimo/avante. É também o nome de um concurso criado em 2012, pela Fade In – Associação de Acção Cultural de Leiria, co-organizado pela Omnichord Records, também de Leiria, com o objectivo de descobrir e incentivar a originalidade e o aparecimento de novos talentos musicais, sejam bandas, artistas a solo ou cantautotres, oriundos de todas as escolas do concelho.
Os primeiros a vencer esta competição foram os elementos de uma banda chamada First Breath After Coma (FBAC) e os segundos foram os Backwater and the Screaming Fantasy, colectivo que deu origem aos Whales e a que pertenceu Débora Umbelino, a artista hoje conhecida pelo seu alter-ego, Surma.
As bandas e artistas que surgiram desta iniciativa deram, em 2018, mais de 80 concertos, em 14 países. Este ano, contam já com 60 espectáculos em dez países. “Na época, contactámos as associações de estudantes do ensino secundário e desafiámos as bandas das escolas a concorrer nesse concurso de bandas do secundárias”, recorda Hugo Ferreira. O resultado foi tão positivo que, agora, a receita vai voltar a ser confeccionada.
Em Maio de 2020, num dos palcos da Feira de Leiria/Feira de Maio, o Zus!, ou uma reencarnação dele com uma filosofia semelhante, estará de volta, desafiando o público a eleger uma nova banda saída das escolas secundárias do concelho.
Agrupamento Escolar Rainha Santa Isabel
Agrupamento Escolar das Colmeias
Escola Secundária Afonso Lopes Vieira
Agrupamento Escolar dos Marrazes
Agrupamento Escolar Domingos Sequeira
Agrupamento Escolar Dom Dinis
Agrupamento Escolar Dr. Correia Mateus
Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo
Escola Superior de Educação e Ciências Sociais
Agrupamento Escolar Henrique Sommer
Agrupamento Escolar da Caranguejeira e Santa Catarina da Serra
Serra Espaço Cultural (Reixida/Leiria)
Celeiro da Casa do Terreiro (Leiria)
Mas, primeiro, é necessário fazer o chamado trabalho de sapa e captar jovens e criar projectos. Para perceber que pontos a abordar nas sessões, os promotores da acção abordaram Surma e elementos dos Whales e First Breath After Coma e perguntaram “quando andavam no secundário, que assuntos da música queriam saber?”
Duzentos inscritos
Várias escolas do concelho receberam já encontros iniciais de contacto para captar voluntários e o projecto conta já com 200 alunos inscritos, a partir de mais de mil inquéritos, realizados a outros tantos estudantes.
Agora segue-se o trabalho a sério. As escolas e a Música Omnipresente vão tentar criar horários extra-curriculares para as sessões, onde a música será escalpelizada e onde se incentivará a criação de bandas para concorrerem, em Maio, no evento da Feira de Leiria destinado a projectos musicais originais, provenientes do ensino secundário.
Em Novembro haverá uma nova sessão com os inscritos e em Dezembro, nas férias, haverá um encontro intensivo de um dia, com três períodos de 45 minutos de manhã e de tarde. Em Janeiro e Fevereiro haverá mais duas sessões e em Março, haverá novo encontro intensivo. Em Abril, acontecerá a primeira eliminatória para as bandas que irão à Feira de Leiria.
Cada escola terá um tutor musical, que será sempre um ex-aluno do estabelecimento. Entre eles, estão os músicos Débora Umbelino (Surma), Nuno Rancho, Vasco Silva, e os promotores Gui Garrido e Hugo Ferreira, que orientará os grupos de trabalho.
Ana Sofia Ribeiro (Lince) Tutora na EB Colmeias
Débora Umbelino (Surma) Tutora e ex-aluna na ESFRL
Filipe Rocha (Sean Riley/The Allstar Project) Tutor e ex-aluno na Escola Dom Dinis
Gui Garrido (Festival A Porta) Tutor e ex-aluno na ES Domingos Sequeira
Hugo Ferreira (Omnichord Records) Tutor e ex-aluno no AE Henrique Sommer
Miguel Ferraz (Casota Collective) Tutor na EB Santa Catarina da Serra
Nuno Rancho (Few Fingers) Tutor no AE Rainha Santa Isabel
Paulo Mouta Pereira (produtor) Tutor na EB Correia Mateus
Pedro Marques (FBAC) Tutor na EB Correia Alexandre
Rui Gaspar (FBAC) Tutor na EB Marrazes
Telmo Soares (FBAC) Tutor e ex-aluno na EB José Saraiva
Vasco Silva (Whales) Tutor e ex-aluno na ESALV
Se nas escolas aparecer mais do que uma banda, haverá uma eliminatória, com uma selecção interna para escolher o grupo que vai concorrer.
“Já os alunos do segundo ciclo, no final das sessões, terão de nos apresentar algo no [LER_MAIS] telemóvel, com a extensão de um minuto, e nós teremos um minuto para fazer uma selecção”, explica Hugo Ferreira.
Novos talentos competem na Feira de Leiria
As primeiras sessões com os alunos aconteceram na semana passada e o JORNAL DE LEIRIA acompanhou o encontro do editor Hugo Ferreira e do músico Vasco Silva (Whales) com os alunos do Agrupamento Escolar Henrique Sommer, na Maceira.
Para quebrar o gelo, Hugo, natural de Porto Carro (Maceira) e antigo aluno do estabelecimento de ensino recordou aos jovens do Secundário e 2.º Ciclo, sentados à sua frente, os seus tempos de estudante, quando passava todo o tempo disponível na rádio da escola.
“Gostava muito de música, mas não queria tocar um instrumento, mas decidi que queria promover e divulgar o trabalhos dos músicos. Tornei-me agente cultural.”
Ao silêncio inicial, sucedeu-se um bruá quando o responsável pela Omnichord Records perguntou quem tocava bateria, guitarra, piano ou instrumentos de sopro, ao que se seguiu a pergunta sacramental: “quem aqui tem uma banda?”
Apareceram os braços no ar da Costa Banda – sediada na Costa, uma das aldeias da freguesia – e os da Falso Alarme, “um grupo mesmo da Maceira”. “Não há mais bandas? Não? Temos mesmo de mudar isto”, disse, em tom de brincadeira, mas com sérias convicções. Voltando-se para uma imagem projectada na parede disse: “estão a ver esta fotografia dos Whales a tocar para milhares de pessoas? Garanto-vos que, em Maio do próximo ano, vai estar uma banda da Maceira a tocar num palco”.
“O quê?!”, exclamaram alguns dos alunos, incrédulos perante tamanha afirmação, acendendo o rastilho de um novo burburinho. O editor explicou que, em 2020, haverá uma nova edição do Zus!, na Feira de Leiria, e, até lá, continuou, o desafio será formar grupos musicais e eleger um em cada estabelecimento do ensino secundário do concelho.
Ao todo, serão cinco colectivos, provenientes das secundárias Francisco Rodrigues Lobo, Domingos Sequeira, Afonso Lopes Vieira, Maceira e Carreira. Vasco Silva explicou que não só a música está em todo o lado, como não são exclusivamente os músicos a produzi-la. “Numa das escolas onde estivemos esta semana referi que a música está em todo o lado e que toca toda a nossa vida – é omnipresente – e num dos inquéritos que fizemos, à pergunta ‘que instrumento tocas’, responderam-me: flauta e vida. Foi uma boa resposta!”
“O que é a música? E por que é omnipresente? O que é preciso para ter uma banda? Como se usam as redes sociais para conhecer e mostrar música? Quem gosta de desenhar e pintar? E de fotografia? Já repararam que os álbuns e as músicas que ouvem no Spotify e vêem no Instagram têm imagens? E quem trabalha nos videoclipes? São electricistas, carpinteiros, técnicos de som e de imagem.”
Para lhes mostrar tudo isto, as omnipresentes equipas irão “desmontar os videoclipes” e perceber como são feitos e um dos pontos que serão estudados é a maneira como se lida com os haters e com o bullying nas redes sociais.
“Venho pela experiência e, depois, logo se verá”
Cristiana Sabino, 16 anos, a frequentar o 11.º ano, foi uma das alunas que se inscreveu para integrar o grupo de alunos que irá participar na Música Omnipresente. “Toco guitarra desde os 8 anos – eléctrica e clássica – e quero aproveitar esta oportunidade. Gosto muito de música e posso até não chegar a lado algum, mas prefiro tentar e aprender mais.”
Aprecia pop, jazz, rock e música clássica. “Quando comecei a tocar guitarra, gostava mais de clássico e sempre toquei mais esse estilo. Recentemente, comecei na guitarra eléctrica. Gosto de rock porque são músicas mais mexidas e que me dão mais oportunidades de mostrar o que consigo fazer.”
A frequentar o 12.º ano, Lara Ascenso, 17 anos, também se inscreveu na Música Omnipresente. Em pequena, aprendeu a tocar guitarra e quer conhecer mais o mundo da música. Já conhecia os First Breath After Coma, embora admita que tem de ouvir mais trabalhos da banda de Leiria.
“Neste momento, não me consigo imaginar a tocar com uma banda da Maceira, em Maio do ano que vem, no Zus! Posso dizer que é uma ambição, mas não sei se poderá acontecer um dia. Só venho pela experiência e, depois, logo se verá. Quem sabe?”
No final do encontro, Hugo e Vasco deixaram sugestões culturais já para sexta-feira, dia 25, no Celeiro da Fundação Caixa Agrícola, em Leiria.
Às 19 horas, Russa, nome apontado como uma das estrelas em ascensão no hip-hop, em Portugal, vai actuar naquele espaço com músicos da Omnichord Records.
E, no dia 27, haverá mais uma Estação no Serra, espaço multidisciplinar de criação artística instalado na casa da Reixida, espaço que o Grupo Movicortes cedeu para a instalação de projectos multidisciplinares nas áreas da criatividade e das artes, a dois passos da nascente do Rio Lis.
“Estão todos convidados a ir com os vossos pais e amigos visitar as instalações ver e ouvir os artistas, participar nas oficinas e nas conversas com o Luís Ferreira, programador artístico do Festival Bons Sons, de Tomar, e Gui Garrido, responsável pelo Festival A Porta, de Leiria.”