Um documento que “peca por tardio”, que levanta “dúvidas” quanto à estratégia e às opções e que “ignora” as recomendações da comunidade científica. Esta é a apreciação preliminar que os especialistas ouvidos pelo JORNAL DE LEIRIA fazem ao Plano de Gestão Florestal (PGF) da Mata Nacional de Leiria, que está em discussão até ao dia 1 de Fevereiro.
Ressalvando que os membros do Observatório Técnico Independente (OTI) para os incêndios, extinto em Junho de 2021, irão apresentar uma posição conjunta em sede de consulta pública, Francisco Rego, que coordenou o grupo, lamenta que a proposta de plano não preconize uma alteração ao modelo de governança do Pinhal, como propôs a sua equipa, que defendia um maior envolvimento do Município da Marinha Grande e de organizações privadas e científicas.
“Esta questão é central. Foi uma recomendação forte do observatório, que não tem correspondência no plano”, alega. Francisco Rego critica também o atraso na elaboração do documento. “Muitas das decisões que teriam de ser tomadas de forma mais enquadrada pouco tempo após do incêndio ficaram sem esse enquadramento”, aponta, considerando que a justificação dada pelo Governo, de que se esteve à espera do resultado da regeneração natural, “não colhe”. “Essa explicação faria sentido um ou dois anos após o incêndio.”
Por seu lado, Paulo Lucas, [LER_MAIS]dirigente da associação ambientalista Zero, diz que não se compreende “a estratégia” das faixas de gestão de combustível previstas no PGF. No seu entender, “faltam faixas de contenção com folhosas na orla da Mata”, mantendo- se a zona de pinhal “muito próxima das habitações”.
O ambientalista critica também o facto de o plano “estar ainda muito focado no potencial de produção de pinheiro”, considerando “pouco ambiciosa” a aposta em espécies “mais resilientes”, como o carvalho e o sobreiro, acompanhada do “devido investimento” para criar condições para que pudessem florescer.
Também Francisco Rego entende que “não é má ideia ter outras espécies” na MNL, frisando, contudo, que é preciso perceber “qual a extensão e modalidade”.
Posição oposta tem José Nunes André, geógrafo e membro do Observatório do Pinhal do Rei, para quem a aposta naquelas espécies é “uma péssima solução”.
“Na maior parte da MNL o solo é pobre, ou até incipiente, e predomina o vento marítimo forte provocado pela ausência do pinhal destruído pelo incêndio de 2017. Estas características, que se acentuam nas zonas mais próximas do mar, não são propícias ao desenvolvimento de caducifólias, nomeadamente de sobreiros”, defende, sublinhando a necessidade de reforçar o combate às invasoras, como prevê o plano.
Esse apelo é também feito por Paulo Castro, presidente da Acréscimo – Associação de Promoção ao Investimento Florestal. “Quanto mais tempo passar, maior será o esforço do combate às invasoras, que já era premente antes do incêndio”, diz o dirigente, que remete uma apreciação mais global ao PGF para a posição que a organização irá apresentar na consulta pública.
Ex-membro do Observatório do Pinhal do Rei, Ricardo Vicente, candidato do Bloco de Esquerda à Assembleia da República, aponta “erros” à proposta de plano. Em comunicado, o engenheiro agrónomo lamenta que o documento inclua “mapas com planeamento de trabalhos para anos que já passaram: 2019, 2020 e 2021”, e critica o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas por “não está a seguir as recomendações da comissão científica” criada pelo Governo.
“O ICNF produziu o plano de forma isolada para cumprir calendário. Além de atrasadas e insuficientes, as acções desenvolvidas na mata têm decorrido de forma avulsa”, acusa Ricardo Vicente. Na semana passada, em declarações ao JORNAL DE LEIRIA, o secretário de Estado das Florestas garantia, precisamente o contrário. “O documento bebe muito das orientações da comissão científica que tem acompanhado o Governo”, afirmava João Paulo Catarino