O Sporting caminha a passos largos para o título nacional de futebol. Para alguns comentadores, tem jogado a favor da equipa de Alvalade o facto de não haver público nas bancadas. “É especulativo, não dá para provar, mas admito que sim. Havia um clima de contestação de um sector de adeptos do Sporting e isso era claro em alguns momentos menos positivos e poderia prejudicar o rendimento da equipa, por ser um plantel muito jovem”, explicou João Aroso.
Rúben Amorim discordou desta ilação. O treinador leonino garantiu que, ao contrário do que parece ser a opinião pública, os simpatizantes leoninos “são uma grande força” e podiam ajudar a equipa. “Penso que se está a subestimar muito os nossos adeptos. São uma grande força do Sporting, não uma fraqueza, e sei que dariam uma resposta muito diferente daquilo que as pessoas pensam. Precisamos muito deles.”
Ora, se calhar, nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Na verdade, o famoso 12.º jogador já não tem a importância absolutamente relevante na conquista de vitórias na Liga portuguesa que se supunha. Pelo menos, é essa a conclusão de uma investigação da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Politécnico de Leiria, publicada na passada segunda-feira no International Journal of Environmental Research and Public Health.
“Neste estudo quisemos ver o mais imediato, que são os pontos. O que aconteceu nas últimas dez jornadas da temporada 2019/20, já sem público, face às primeiras 24, ainda com público”, explica Rui Matos, que lidera a equipa que elaborou Vantagem de jogar em casa durante a Covid-19: análise à Liga portuguesa de futebol.
As conclusões revelam que “não houve diferenças significativas sob o ponto de vista estatístico”, diz o docente, doutorado em Motricidade Humana pela Universidade Técnica de Lisboa. Em média, nas primeiras 24 jornadas, as equipas conquistaram 53,6% dos pontos em casa. Curiosamente, nas últimas dez, já sem assistência, até alcançaram 58,8%. “Não se pode dizer que subiu consideravelmente, mas descer também não desceu”, enaltece o responsável.
[LER_MAIS]Devido à relevância das derradeiras jornadas, porque “é quando de decide quem ganha e quem desce”, a equipa de Rui Matos foi mais longe e avançou para a comparação com as últimas dez jornadas das três temporadas anteriores, então ainda com público. Também aí “nunca houve diferenças significativas”. Em 2016/17 desceu de 59% para 56%, em 2017/18 subiu de 60% para 67% e em 2018/19 de 57% para 58%. “Não é por aí”, apontam os dados. “Aparentemente, esta época foi normal.”
Em Portugal o público não parece ser, pois, um factor relevante para a obtenção de resultados no futebol. Contudo, há vários estudos sobre esta matéria e com conclusões díspares. Um deles, que juntou todas as ligas europeias, revela que a vantagem competitiva de jogar em casa diminuiu ligeiramente em estádios vazios. Ao invés, outro, que se foca na Bundesliga da época passada, diz que, sem adeptos, o benefício de ser anfitrião não só diminuiu, como se tornou numa desvantagem, pois apenas 44,1% dos pontos conquistados pelas equipas foi na condição de anfitrião.
Certo é que a vantagem competitiva de jogar em casa, que até está implícita nas regras das competições europeias na vantagem dada ao golo marcado fora, tem vindo a cair. Quando Richard Pollard, da California Polytechnic State University, fez um estudo sobre a Liga portuguesa, entre 1997/98 e 2002/03, “o valor estava nos 65%”. “Em 2017/18 desceu para 58% e na época passada para 55%.”
Estes 10% de diferença em pouco mais de uma década são atribuídos ao aumento do profissionalismo. “Já não se viaja no próprio dia, as condições de trabalho já não diferem tanto e os jogadores já não são tão afectados pela questão do público”, explica Rui Matos, salvaguardando, no entanto, “condições muito particulares”, como jogar em sintéticos, em recintos de dimensões muito reduzidas ou a célebre questão dos jogos em altitude na Bolívia, no Equador e na Colômbia. Mas até os árbitros são menos caseiros sem a pressão do público, dizem os estudos.
Ainda assim, os treinadores sabem que “tudo conta” e agarram-se ao pormenor para fazerem a diferença. Nélson Pousos, responsável pela relva do Magalhães Pessoa, revelou ao JORNAL DE LEIRIA um segredo de Jorge Jesus do tempo em que treinava o clube da cidade. “Quando era com os grandes, que têm jogadores mais técnicos, pedia para deixar a relva um bocadinho mais alta, mas regar bastante nas pontas, para a bola rolar rápido e não a conseguirem apanhar dentro de campo.”
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“Já não se viaja no próprio dia, as condições de trabalho já não diferem tanto e os jogadores já não são tão afectados pela questão do público”
Rui Matos