Quando se candidatou à presidência da Câmara de Óbidos, em 2001, Telmo Faria propunha fazer do concelho muito mais do que um local de passagem de turistas durante o Verão.
Em três mandatos, o autarca desenhou um plano estratégico de desenvolvimento para Óbidos e enraizou vários eventos originais, que depressa se tornaram marcas indissociáveis da vila, com capacidade para captar o interesse dos forasteiros durante todo o ano. São disso exemplo o Mercado Medieval de Óbidos, o Festival Internacional de Chocolate ou o ÓbidosVila Natal.
Em poucos anos, o sucesso destas iniciativas foi cobiçado por municípios de toda a região de Leiria, onde passaram a replicar-se inúmeros eventos do género. Assim, acusam os especialistas ouvidos pelo JORNAL DE LEIRIA, embora o nosso território seja rico em conteúdos diferentes, capazes de suscitar interesse dos turistas, as iniciativas de cada município reflectem regra geral, a falta de originalidade dos seus agentes.
Entre os eventos mais replicados na região de Leiria contam-se, por exemplo, as festas de temática medieval. E vejamos alguns casos: Leiria Medieval, uma iniciativa de recriação histórica que junta mercadores, artesãos e místicos pela cidade; Aljubarrota Medieval, onde além da recriação da mítica batalha há espaço para mostras de armas, animação no mercado, tavernas e torneios de falcoaria; também o Mercado Medieval de Pombal, que leva ao castelo espectáculos de fogo, trovas, música moçárabe e demonstrações de ofícios.
[LER_MAIS] Telmo Faria, ex-presidente da Câmara Municipal de Óbidos, recorda que, quando a vila começou a organizar o mercado medieval, em 2002, só existiam mais dois locais no País onde se realizavam eventos parecidos. Um deles era Santa Maria da Feira e outro Castro Marim. Além de terem lugar em geografias diferentes, os festivais também eram concertados entre as diferentes câmaras de forma a decorrerem em datas distintas, lembra o ex-autarca.
“A partir do momento em que os nossos projectos começaram a ter muito êxito, começaram a replicar- -se na década seguinte e hoje haverá mais de 100 lugares com festas medievais por todo o País”, aponta Telmo Faria, frisando que, nalguns casos, as festas acontecem entre prédios do século XXI.
“É a atitude bem portuguesa de copiar” sem atender à “singularidade dos locais que é fundamental”, defende o ex-autarca.
Além dos festivais medievais, sucedem- se outros casos de réplicas de eventos, como as vilas de Natal com pistas de gelo. Na última quadra natalícia, as pistas de gelo foram a grande moda. Maiores ou mais pequenas, mais ou menos ecológicas, foram oito as pistas a funcionar no distrito.
Além de Óbidos, o primeiro município da região a apostar neste tipo de equipamento, e de Leiria, também as Câmaras de Alcobaça, Batalha, Castanheira de Pera, Marinha Grande, Peniche e Porto de Mós investiram naquelas infra-estruturas, que se transformaram numa das principais atracções da programação natalícia.
Ao mesmo tempo, multiplicaram- se, em parcerias com as associações locais, as exposições de presépios, os comboios turísticos e mercadinhos de Natal.
E, depois do êxito dos Passadiços do Paiva, em Arouca, não faltam município do distrito de Leiria a ter ideia igual. Porto de Mós prevê ter na Fórnea, Figueiró dos Vinhos junto às Fragas de S. Simão e Ourém no Castelo.
As recriações ao vivo da Via Sacra, que recentemente dominaram a Páscoa na região, são outro exemplo. Se nalguns concelhos, como Ourém, estas recriações são tradição mais antiga, repetida desde o final dos anos 90, noutros locais, como Pousaflores (em Ansião), a iniciativa é bem mais recente, com início em 2015.
Para Telmo Faria, há que fazer “esforço de especialização, construído à volta da diferenciação, sem perder a identidade” de cada concelho. E o ideal, preconiza, seria existir uma concertação supramunicipal, para que se coordenassem melhor as datas e os temas dos eventos.
Com mestrado na área do Marketing Cultural, Liliana Gonçalves reconhece que os municípios tendem a replicar "receitas" culturais que tiveram êxito noutros concelhos. Mas, adverte a especialista, replicar eventos deve ser “uma forma de aproveitar as ideias de sucesso e de as propagar de um modo original, ou seja, adaptando-as à cultura social de cada concelho, tornando-o ímpar e singular, utilizando estratégias de alguma forma já globalizadas, mas que produzem lucro comercial e de capital cultural”. Acresce que “não existem fórmulas mágicas para o sucesso dos eventos” e “a cultura local de cada concelho é sempre a melhor estratégia a implementar”, já que é esse o ex libris de cada comunidade, salienta Liliana Gonçalves. “Numa época em que os eventos são massificados e globalizados, talvez o segredo do sucesso esteja directamente relacionado com o que cada concelho pode oferecer, não só aos seus habitantes, mas também aos seus visitantes em termos de originalidade e genuinidade criando assim uma 'marca' própria que venha a funcionar como símbolo distintivo de cada município”, propõe a especialista.