Estamos em pleno Maio, mês de Maria. O Papa Francisco aterra em Monte Real dentro de oito dias, rumando depois a Fátima onde, a 13 de Maio, vai presidir às comemorações do centenário das aparições.
O tema já foi variadas vezes tratado nas diversas editorias deste semanário, mas agora chega ao Desporto. Porquê? Porque uma atleta camaronesa, finalista olímpica na prova de lançamento do peso, decidiu mudar-se para Portugal por ser devota de Nossa Senhora.
Chama-se Auriol Dongmo. Natural dos Camarões, onde nasceu há 26 anos, foi uma das grandes revelações dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em Agosto último. A atleta conseguiu o apuramento para a final da sua especialidade, ao efectuar um recorde pessoal no melhor momento possível.
Os 17,92 metros a que lançou o engenho deram-lhe um lugar entre as 12 melhores do planeta. Depois, a final não correu tão bem.
Lançou 16,99 metros e terminou a prova precisamente no 12.º lugar. No entanto, fez-se história, pois tratou-se da primeira atleta de um país africano a conseguir qualificar-se para a fase decisiva desta especialidade desde 1984, mais de três décadas depois da gabonesa Odette Mistoul.
O currículo de Auriol Dongmo fala por si. Distinguiu-se no desporto escolar e, depois, foi sempre a subir. Foi somando títulos nacionais atrás de títulos nacionais, até que os seus talentos lhe começaram a valer resultados de nível internacional. Foi duas vezes campeã africana e venceu outras tantas vezes os Jogos Africanos.
A atleta treinava em Rabat, capital administrativa de Marrocos, num grupo que integrava igualmente o congolês Franck Elemba, quarto classificado do lançamento do peso no Rio de Janeiro.
No entanto, sentiu necessidade de mudar alguma coisa na sua vida e achou que em Portugal, país de forte tradição católica, estaria mais perto de encontrar paz de espírito para poder treinar melhor. E depois, claro, há Fátima, cidade que nestas quatro semanas já visitou em duas ocasiões.
No final do ano passado, o presidente da Associação Distrital de Atletismo de Leiria recebeu um mail de Auriol. A camaronesa tinha feito uma pesquisa pela internet e percebeu que a cidade dos lançamentos, em Portugal, é, definitivamente, Leiria.
E Leiria, por acaso, fica a não mais de 25 quilómetros do “altar do Mundo”. “Ela disse que gostava de treinar em Portugal e pediu ajuda. Encaminhei imediatamente a mensagem para o Paulo Reis”, sublinha António Reis.
Além de técnico nacional do sector, Paulo Reis é o responsável pelo Centro Nacional de Lançamentos (CNL), em Leiria.
“É daquelas coincidências. Ela não me conhecia e eu não a conhecia. Andámos meses a falar e achei que, com a idade que tem, podia ajudá-la e disponibilizei-me para isso. Esteve para vir 15 dias, experimentar, mas acabou por ficar.”
“É um desafio porreiro.” O treinador está encantado com este primeiro mês de trabalho conjunto. “Para ela, a vida é treinar, comer e dormir. Tem noivo, nos Camarões, mas fala com ele pelo telemóvel”, sublinha Paulo Reis, que acredita que Auriol, “explosiva e mentalmente forte”, tem “muito para evoluir, sobretudo do ponto de vista técnico”.
“Não sabia que tinha de aquecer para fazer ginásio, praticamente nunca tinha ido ao fisioterapeuta e tinha feito uma vez gelo na vida. Vem de uma realidade completamente diferente, apesar de em Marrocos trabalhar num grupo de bons atletas. O trabalho era feito ao estilo africano, mas havia conhecimento.”
Sendo a campeã africana em título, Auriol Dongmo, com impressionantes 1,83 metros de altura e 98 kg de peso, está já qualificada para o Mundial de Londres, que será disputado em Agosto próximo.
E é esse o foco da atleta. “Quero melhorar o meu desempenho e ter uma boa classificação no Mundial”, admitiu ao JORNAL DE LEIRIA.
Só que como chegou a Portugal a faltarem 20 semanas para a competição mais importante competição do ano e com “mais de metade da época cumprida”, o técnico teve de fazer algumas adaptações ao nível da preparação.
Ainda para mais, com os Jogos da Solidariedade Islâmica, já este mês, no Azerbaijão, e os Jogos da Francofonia, em Julho, na Costa do Marfim, de permeio.
Paulo Reis acredita que esta união será benéfica para todos. “Estou esperançado que vai melhorar tanto a marca, como a classificação. É um gosto tê-la connosco. Ainda por cima, com a postura dela, descontraída e alegre, é uma mais-valia para o grupo de treino.”
É certo que Auriole, a milhares de quilómetros da família, lá longe, nos Camarões, sente falta da “comida e dos amigos”, mas acredita que esta é a melhor opção, até porque está a “aprender coisas que não sabia” e a “melhorar a técnica”. “Rezo muito à Virgem Maria. Espero que me ajude.”