O Grupo Lena, que detém as empresas Lena Engenharia e Construções SA, Lena Engenharia e Construções SGPS e Lena SGPS, acusadas pelo Ministério Público da prática de crimes de corrupção activa, branqueamento de capitais e fraude fiscal qualificada, está a “analisar, em conjunto com os advogados, o teor da acusação deduzida, sendo praticamente certo” que irá pedir “a abertura da instrução do processo”, por entender que essa é “a melhor solução do ponto de vista jurídico-processual para defender” os seus interesses.
Em comunicado, divulgado logo depois de conhecida a acusação, no passado dia 11, o grupo sediado em Leiria apontava a “enorme discrepância” e a “diferença abissal” entre as acusações iniciais, em que “era apresentado e exposto na praça pública como o único corruptor do antigo primeiro-ministro José Sócrates”, e as acusações agora formalizadas, em que para o Ministério Público “tem um papel residual nessa alegada teia de corrupção”.
No documento, a Comissão Executiva sublinha ainda que, “pelo conhecimento que tem dos factos, não será possível provar em juízo nenhuma das acusações” contra o grupo, “na medida em que nenhuma delas corresponde à verdade, sendo apenas teorias da acusação, sem nenhuma prova que as sustente”.
O Ministério Público acusou ainda Joaquim Barroca Rodrigues, à data dos alegados factos administrador-executivo, pela prática de um crime de corrupção activa de titular de cargo político, um de corrupção activa, sete de branqueamento de capitais, três de falsificação de documento e dois de fraude fiscal qualificada.
Em resposta a um conjunto de perguntas do JORNAL DE LEIRIA, Joaquim Paulo Conceição, CEO do grupo, garante que este não pagou a José Sócrates em troca de benefícios comerciais, como acusa o Ministério Público, e diz que “jamais poderá ser provado o que nunca existiu”.
“O Grupo Lena não pagou, directa ou indirectamente, qualquer verba, fosse para o que fosse, ao antigo primeiro-ministro. Nem isso teria qualquer lógica, pois quer o volume de vendas quer a quota de mercado da Lena Construções nos sete anos dos governos do engenheiro José Sócrates desceram face aos sete anos anteriores – a quota de mercado de obras públicas do grupo baixou de 2,93% entre 1998 e 2004, para 2,54% entre 2005 e 2011. Se fossem verdadeiras as acusações, a Lena Construções estaria não só a cometer um crime, como a fazer um péssimo negócio, pagando para baixar as vendas”.
[LER_MAIS] Para o Ministério Público, a Lena terá pago ao ex-primeiro ministro para fazer pressão no sentido de o grupo ganhar os concursos em que participava, nomeadamente no que se refere à rede de alta velocidade (troço Poceirão/Caia, ganho pelo consórcio Elos) e à construção de milhares de habitações na Venezuela. Joaquim Paulo Conceição é peremptório: “não temos qualquer conhecimento de qualquer pressão, nada fizemos para isso”.
Adianta o CEO que “não há lógica” em considerar como resultado de diplomacia económica os efeitos que teve para muitas empresas (como a Mota Engil ou a Teixeira Duarte) a sua participação em comitivas que se deslocaram à Venezuela e considerar que no caso do Grupo Lena esses efeitos resultaram de “pressões pagas”.
O gestor lembra que para obras daquele tipo são abertos concursos públicos internacionais, “com dezenas ou mesmo centenas de especialistas nos respectivos júris”, questionando “como se processariam os efeitos da tal pressão”. No caso do consórcio Elos, refere que o grupo de Leiria tinha apenas 13% e que não faria qualquer sentido, caso tivesse havido pressão, “trabalhar e pagar para o sucesso de outros”.
Desde Novembro de 2014, quando foram noticiadas as buscas na sede do grupo de Leiria, que este tem sido apontado como uma das principais fontes do dinheiro acumulado por Sócrates. O impacto desta situação “tem sido brutal”, admite o CEO.
“Só a enorme qualidade e resiliência dos quadros e demais trabalhadores do Grupo Lena, em conjugação com o track record das empresas do grupo, tem permitido suportar esta situação, que naturalmente tem implicações enormes ao nível das relações com todos os stakeholders, minando as relações de confiança que são sempre essenciais”.
Para o gestor, “não tinha de ser assim”. Entende Joaquim Paulo Conceição que “o que está em causa não é o apuramento da verdade, não é a investigação que tem decorrido, pois a Justiça tem o direito e o dever de apurar a verdade e condenar quem tem de ser condenado”, mas “as inúmeras e permanentes fugas de informação, que têm alimentado os meios de comunicação social, transformando suspeitas e indícios, sem qualquer sustentação probatória, em verdades absolutas e condenações inapeláveis no espaço público”.
No comunicado da semana passada, a Comissão Executiva já apelava aos stakeholderspara continuarem a apoiar o grupo na superação das dificuldades, garantindo que “não esmorecerá até o processo ter fim e conseguir resgatar” a sua reputação, “injustamente vilipendiada”, considerando que o apuramento da verdade “não poderá deixar de ilibar total e completamente o grupo e os seus gestores”.
“Surpresa” foi constituição como arguido
Joaquim Paulo Conceição, CEO do Grupo Lena, chegou a ser constituído arguido no âmbito do processo Operação Marquês, mas agora o Ministério Público esclarece que foi proferido despacho de arquivamento, ou seja, o gestor acabou por não ser acusado de qualquer crime.
Que leitura faz deste desfecho? “A surpresa foi a minha constituição como arguido, não a falta de acusação”, diz ao JORNAL DE LEIRIA. “Não só os alegados factos ocorreram antes de eu ter estas responsabilidades no Grupo Lena, como não era possível terem ocorrido, perpetrados por mim ou por outra pessoa, pois não era essa, nem é, a política da empresa. Nunca tive dúvidas de que este fosse o desfecho”, sublinha o gestor.
No comunicado da semana passada, a Comissão Executiva do grupo já tinha considerado “da mais elementar justiça” o arquivamento do processo respeitante a Joaquim Paulo Conceição, frisando que “nunca se percebeu, a não ser para melhor assegurar a sua defesa enquanto cidadão e profissional”, a razão da sua constituição como arguido, até porque “na altura dos pretensos factos nem sequer exercia funções na holding do Grupo Lena”.
“Quanto à acusação deduzida a Joaquim Barroca Rodrigues, que o Ministério Público diz ter aceitado “efectuar pagamentos” destinados ao ex-primeiro ministro e disponibilizado a “utilização de contas bancárias abertas em seu nome na Suíça para movimentar fundos que se destinavam a José Sócrates”, o CEO diz não poder, nem dever, tecer qualquer comentário.