Um dia “memorável”. É desta forma que Carlos Alberto Jorge recorda o dia 11 de Agosto de 1974, quando as Grutas de Mira de Aire abriram ao público. Desde a sua descoberta, em 1947, por um grupo de homens que procuravam um sítio onde fosse possível retirar água, tinham passados 27 anos, durante os quais foi preciso desbravar muito pedra até tornar a gruta visitável. Pelo meio, tinha havido, em 1958, uma tentativa falhada para explorar a gruta turisticamente.
Em 1974, não falhou. “Só não acertámos nas previsões de visitantes. Superou todas as expectativas”, conta o administrador da sociedade que gere as grutas e que fez parte da equipa responsável pela abertura do espaço ao público. Desse primeiro dia, Carlos Alberto recorda a “avalanche” de pessoas, que fizeram “voar” tudo o que havia na loja de recordações.
Houve também necessidade de “pedir ajuda a gente amiga” para complementar o grupo de seis guias preparado para receber os visitantes, como lembrou Manuel Poças das Neves, antigo administrador do complexo, em declarações ao JORNAL DE LEIRIA, em 2017, por ocasião dos 70 anos da descoberta da gruta. A enchente do primeiro dia repetiu-se nas semanas e meses seguintes.
“Eram centenas de pessoas a fazer filas e aos empurrões. Chegava a haver zaragatas. Tínhamos de pôr a GNR a fazer segurança”, relatou Poças das Neves. Havia também quem quisesse entrar sem pagar, contornando as filas. “Cortávamos-lhe a luz e eram obrigados a voltar para trás”, revela Carlos Alberto.
Recorde de visitas em 1976
Nos três primeiros anos de actividade turística, as grutas receberam cerca de 300 mil visitantes por ano, chegando a 2024 com mais de oito milhões. O recorde de entradas foi registado a 12 de Setembro de 1976, dia em que passaram pelo interior desta maravilha natural 8.492 pessoas. “Hoje seria impensável”, diz o actual administrador, que está ligado ao projecto desde Junho de 1971, quando tiveram início as obras para tornar a gruta visitável e que terminaram com um ano de atraso.
“Apontámos como data para a abertura o dia 10 de Abril de 1973, que coincidia com o 70.º aniversário da vila. Fizemos, inclusive, uma medalha comemorativa da abertura com essa data, mas as obras demoraram mais do que o previsto”, recorda Carlos Alberto, que aponta a criação do poço do elevador, com 80 metros de profundidade, como o maior desafio. Foi, conta, aberto “totalmente em rocha” com recurso a dinamite.
As dificuldades fizeram-se sentir também na construção das escadas, 683 degraus em cimento, “todo transportado a balde” para dentro da gruta. Já na década de 1980, o complexo seria alargado com a construção do parque de estacionamento, do restaurante e da discoteca Papagaio, entretanto desactivada. Em 1993, foi inaugurado o parque aquático e, mais recentemente, o espaço passou a dispor de bungalows, de uma sala de eventos e de uma zona de estágio de vinhos no interior da gruta, que já recebeu 12.500 garrafas da Casa Ermelinda Freitas.
Reconhecendo que estes investimentos e projecto representaram “marcos importantes” na história das grutas, Carlos Alberto destaca, no entanto, a classificação do local como uma das sete maravilhas naturais de Portugal, em 2011. Além da projecção, a distinção “trouxe a consciência da necessidade de fazer mais e melhor”, assume o administrador, reconhecendo que o galardão acabou por funcionar como “motor” para a criação de novos atractivos e de melhorias.
É disso exemplo a introdução de visitas virtuais, que serão disponibilizadas durante este mês, e que permitirão às pessoas com mobilidade reduzida e que não podem entrar na gruta, ‘viajar’ pelo seu interior com recurso a tecnologia instalada na Casa do Conhecimento, o novo espaço do complexo, que abrirá ao público este sábado, dia 11.
A funcionar numa estrutura instalada sob um campo de lapiás, posto a descoberto por porcos vietnamitas que, em tempos, estiveram no local, a Casa do Conhecimento disponibiliza um conjunto de painéis interpretativos, que abordam temas como o mundo subterrâneo, formações geológicos e a flora e fauna das serras de Aire e Candeeiros. Terá ainda um dinossauro com 5,5 metros de cumprimento e um mural da autoria de Rui Basílio, que reproduz fotografias antigas.
Outro dos novos atractivos das grutas de Mira de Aire é a iniciativa Visita 5 sentidos que permite a pequenos grupos, entre oito a dez pessoas, visitar 450 metros da parte não turística da gruta.
Cenário para videoclipes
Ao longo dos anos, as Grutas de Mira de Aire têm servido de cenário para videoclipes e campanhas publicitárias, como aconteceu, este ano, com a NOS. David Carreira, Maria Leal ou Cristina Maria também já gravaram videoclipes nas grutas.
A estreia coube, no entanto, às Doce que aí fizeram o videoclipe da música Ali-Babá, que levaram ao Festival da Canção da RTP de 1981, ganho por Carlos Paião (Play-back).