“Já percebemos que iremos pagar por um duplex usado o mesmo que há 12 anos pagámos por uma moradia a estrear”. Maria e a família pretendem mudar de casa, mas a busca por uma nova habitação tem sido penosa.
Pouca oferta, muita procura e preços muito elevados dificultam a tarefa. “Os apartamentos que têm uma boa relação qualidade preço desaparecem num estalar de dedos”, constata.
Há três meses que a família começou a procurar uma nova habitação. Quer vender a moradia que possui, e a ideia inicial era arrendar um apartamento. Mas cedo percebeu que mais valia comprar, porque a prestação seria bem inferior à renda.
Neste caso, a necessidade de ter parte do capital, porque a banca já não empresta tudo, não é problema, visto que a venda da casa irá cobrir essa percentagem.
Mas esta é uma situação que está a dificultar a vida a muitas pessoas que preferiam comprar a arrendar. “Nesta fase, comprar é garantidamente a melhor opção. Mas nem todas as pessoas conseguem, porque é preciso ter pelo menos 10% do valor da casa, visto que os bancos já não emprestam a totalidade”, explica Teresa Mesquita.
A responsável da Remax Inn, em Leiria, reconhece alguma escassez de oferta no mercado, sobretudo de casas novas, mas diz que no caso desta empresa tem havido “facilidade” na venda e na reposição do stock.
“Procuram-nos por mês 600 compradores”, aponta. A maioria dos imóveis transaccionados são usados. Quanto aos preços, reconhece que se está a vender a valores melhores do que há uns anos, mas recusa falar em especulação.
“Quem se depara com uma renda de 500 euros por mês prefere comprar, mas também na aquisição os preços estão exorbitantes”, admite Cláudia Santos, responsável pela Casas sem fim, imobiliária da Batalha. A profissional aponta o aumento do custo dos materiais de construção como um dos factores.
“O que não se justifica é o aumento de preços registado nos usados”, entende. Mesmo com preços mais elevados, muitas pessoas preferiam comprar, se tivessem poupanças. “Nem todos conseguem adquirir, porque os bancos só estão a emprestar, por regra, 80% do valor da avaliação. Às vezes consegue-se 90%”.
Ao aumento do preço dos materiais de construção, Aquilino Carreira junta o custo da mão-de-obra, que é escassa e “encareceu muito”. Por isso, o que está a ser construído estará no mercado a valores entre 20 a 25% superiores aos praticados há uns anos.
É o que acontecerá, por exemplo, com a habitação que a ACI está a construir. Depois de 28 apartamentos concluídos em São Romão, a empresa está a edificar 27 na zona das Olhalvas e vai começar outros 23 na Cruz da Areia, Leiria. Habitação vocacionada para os segmentos médio e médio alto, com os T2 a rondar os 160 mil euros e os T3 a custar mais de 200 mil.
No Planalto a ACI está igualmente a construir 18 apartamentos, neste caso a valores “mais acessíveis”, conta o empresário. A habitação de tipologia T2 custará 145 mil euros e os T3 entre 180 e 190 mil euros. “Não há muita oferta porque com a crise deixou de se construir”, lembra.
“Nós não parámos a construção por não termos compradores, mas a verdade é que os bancos já não emprestam todo o dinheiro que uma pessoa precisa para comprar a casa”.
Também a Construções Mais está a edificar novos prédios para habitação, tanto em Leiria como em Fátima. Os preços variam entre os 125 mil euros (T1) e os 230 mil (T4). “Os preços subiram, vigora a lei da oferta e da procura”, diz João Silva, que acredita que a oferta de habitação nova está a crescer, sobretudo na cidade do Lis.
[LER_MAIS] Mesmo assim, continua a ser pouca para a procura, constata Rui Cardeira, que diz que surgem muitas pessoas que inicialmente pensavam arrendar e que concluem que é mais vantajoso comprar.
“Se o banco emprestar o dinheiro acabam por adquirir, até porque conseguem uma prestação mais baixa do que as rendas que estão a ser praticadas”. “Os bancos estão muito interessados em emprestar dinheiro, desde 2008 que não emprestavam tanto para aquisição de casa própria”.
“No ano passado vendemos mais, voltou a ser o nosso melhor ano”, diz o responsável da Cardeira e Costa – Century 21. “A dificuldade é a escassez de produto novo”. Como em Leiria não há muito, os interessados viram-se para a Marinha Grande, na esperança de encontrar o que desejam. Mas também na cidade vidreira a oferta é insuficiente.
Mas os preços são mais vantajosos. “Chega a haver 80 mil euros de diferença numa moradia nova, por exemplo”, aponta o mediador, que diz ainda que os preços na Marinha Grande começam a subir. Mesmo assim ainda compensa.
“Consegue-se um T2 novo neste concelho por 150 mil euros, enquanto em Leiria dificilmente se compra abaixo de 200 mil”. Uma mudança neste cenário só se conseguirá com uma entrada “muito significativa” de novas casas no mercado, mas Rui Cardeia não prevê que tal aconteça, porque os “promotores estão muito mais cautelosos”.
No ano passado, a rede Century 21 subiu as suas vendas em 6% e a facturação em 14%. O valor médio das transacções aumentou 5%. Mas se na maior parte dos concelhos a rede vendeu a um valor médio superior ao de 2018, tal não se registou em Leiria, onde se registou uma quebra de 4% nos preços médios das transacções.
Mas segundo a consultora Confidencial Imobiliário, na última década os preços das casas em Portugal subiram, em média, quatro vezes e meia mais do que o ganho médio dos trabalhadores por conta de outrem, de acordo com os dados divulgados na segunda-feira, e citados pelo Dinheiro Vivo.
No final de 2019, os preços das casas em Portugal estavam 46% acima dos níveis registado em 2010, período em que, segundo os cálculos apresentados por este jornal, os salários subiram pouco mais de 10%.
“A oferta no que toca à aquisição de casa não é muita. E situa-se sobretudo nos centros das cidades, a preços elevados, não acessíveis a todas as bolsas”, aponta Nuno Serrano. Segundo o responsável pela Predial Leiriense, faltam casas de tipologia T3 a preços entre os 140 e os 150 mil euros, por exemplo. “Os mesmos T3 que há meia dúzia de anos custavam estes valores agora estão a 200 mil euros”.
“Não prevejo que isto se inverta nos próximos anos. Enquanto houver pressão no mercado de arrendamento haverá também no da compra”. Seja de casas novas seja de usadas. “Vendi recentemente um T4 nos Capuchos por 150 mil euros, que sofreu obras. Há uns anos, no pico da crise, tinha sido transaccionado por 85 mil”, exemplifica Nuno Serrano. “Esta é uma boa altura para vender, não para comprar”.
“As casas estão mais caras, os preços subiram significativamente”, aponta igualmente Ana Deus. A responsável pela agência de Leiria da 2% Imobiliária atribui a situação à escassez da oferta – “com a crise a construção esteve em lume brando” – e ao aumento da procura. Mas acredita que o facto de estar a surgir construção nova levará a uma “normalização dos preços”.
No balanço efectuado ao trabalho desenvolvido ao longo de 2019, o director do hub de Leiria da Zome, Miguel Codinha, revela terem sido realizadas cerca de 700 angariações em exclusivo, realçando que estas transacções geraram um volume de mais de 20 milhões em crédito à habitação.
“As compras de imóveis com recurso ao crédito representam 60% do total das vendas, sendo fundamental a intervenção da banca. O valor das avaliações está ainda cerca de 10% abaixo daquilo que é o preço de mercado”, esclarece Miguel Codinha.
Segundo o responsável, a Zome de Leiria “registou um crescimento de 62% e um aumento do número de pedidos de informação (31%)” em 2019, frisando que a procura de imóveis nesta rede “é três vezes superior à oferta, sendo que 30% incide em moradias e 60% em apartamentos”. E considera ainda que a nova construção “veio ajudar a providenciar mais oferta, representando 22% do total das vendas”.
De acordo com a última análise da Federação Portuguesa da Indústria de Construção e Obras Públicas, o número de novos fogos habitacionais licenciados durante o ano de 2019 rondou os 24 mil, um crescimento de cerca de 18% face ao ano anterior.
“Este número é o mais alto dos últimos nove anos e, sendo já o triplo do número de fogos licenciados em 2014 (o valor mínimo dos últimos 24 anos), mantem-se ainda muito distante dos 114 mil fogos licenciados no início deste século”, aponta a Fepicop.
Por seu turno, também a informação disponibilizada pelo Instituto Nacional de Estatística referente às conclusões de obras revela um crescimento sensível até Setembro de 2019, com 10.141 novos fogos habitacionais concluídos, traduzindo um acréscimo de 17,2% face ao período homólogo de 2018.