Encarregado de construção civil, pedreiro, servente, técnico de qualidade, responsável de planeamento e controlo de produção, engenheiro electrónico, técnico de electricidade, operadores de CNC… Estas são algumas das ofertas de emprego que é possível encontrar em anúncios colocados nos últimos meses por empresas da região.
Mas nem sempre os lugares são preenchidos, porque escasseia pessoal com um mínimo de qualificações para os cargos a ocupar. “Tudo o que não seja trabalho de bata branca e computador à frente não é atractivo”, aponta José Sismeiro, gerente da Mesis Engenharia, empresa de construção civil que há uns meses colocou um anúncio para recrutar um encarregado, um pedreiro e um servente.
Áreas em que “não tem havido renovação” de profissionais, porque os jovens não se sentem atraídos por elas, refere o empresário. Numa altura em que Portugal ainda regista uma taxa de desemprego de 8,6% (estimativa do INE para Setembro), como se explica que as empresas não encontrem o que precisam?
“A construção civil não pode servir para escoar mão-de-obra sem as qualificações adequadas. É conotada como uma área não qualificada, mas não é assim. É preciso conhecimento e experiência para se poder trabalhar”, defende o responsável da empresa de Leiria, adiantando que a maioria das pessoas inscritas nos centros de emprego não têm esses atributos.
Como se resolverá a questão da falta de pessoal nestas áreas e noutras mais técnicas? “O mercado tenderá a elevar os salários dessas profissões, enquanto nas que estão mais saturadas será cada vez mais difícil encontrar trabalho”, entende José Sismeiro.
Nos últimos meses, a Böllinghaus, empresa produtora de artigos em aço, colocou anúncios para recrutar para cinco funções diferentes: responsável de planeamento, controlo de produção, técnico de qualidade, técnico de desenvolvimento de novos produtos e engenheiro de processo. “Existe uma maior dificuldade em contratar neste momento, porque tem havido um crescimento da actividade económica e, logo, mais empresas a recrutar”, aponta Bruno Pedro.
O director executivo da empresa de Vieira de Leiria adianta que em áreas como as da manutenção – eléctrica e electrónica – é ainda mais complicado. “Faltam profissionais”, até porque muitos dos que estavam no activo terão emigrado. Por outro lado, a capacidade que o País tem de formar pessoas nestas áreas “é inferior às necessidades”.
“Não existem cursos suficientes”, entende o gestor, que lembra que os equipamentos são cada vez mais avançados tecnologicamente, o que obriga a constantes actualizações dos profissionais.
Também Bruno Pedro entende que os desempregados inscritos nos centros de emprego raramente têm perfis ajustados àquilo que são as necessidades das empresas. “Os profissionais das áreas de manutenção não ficam desempregados”.
Por todas estas razões, quando a Böllinghaus precisa de recrutar leva algum tempo até conseguir preencher as vagas. “Como trabalhamos numa área muito específica, não é fácil encontrar pessoas com experiência”.
Para o gestor, o problema não se resolve com os imigrantes, mas antes com uma aposta na preparação dos jovens, na nossa região. “É preciso mostrar-lhes que há muitas áreas com potencial de emprego e formá-los cá, porque se forem para Lisboa ou para o Porto será difícil regressarem”.
[LER_MAIS] O recrutamento é actualmente uma das principais dores de cabeça sentidas no sector dos moldes. “É uma das nossas principais necessidades”, admite João Faustino, presidente da Cefamol.
A associação da Marinha Grande apresentou no início deste ano um estudo que apontava para a importância de as empresas apostarem em medidas de “promoção do sector” e de “atracção de jovens para a indústria”, sob pena de a escassez de determinados profissionais “vir a condicionar a espiral de crescimento do sector".
A indústria de moldes tem estreitado laços com as escolas e promovido a sua imagem de forma a atrair os mais jovens, mas mesmo assim o número de recém-formados, seja no ensino profissional seja no superior, continua a ser insuficiente para suprir as necessidades das empresas.
E, de uma maneira geral, os jovens são todos integrados assim que terminam a formação, aponta a Cefamol. “Faltam pessoas com profissões técnicas”, refere igualmente o responsável por uma empresa de Leiria que colocou recentemente um anúncio para recrutar um engenheiro electrónico e um técnico de electricidade.
“Não conseguimos arranjar, não sei explicar porquê. É certo que há muita gente inscrita nos centros de emprego, mas com formação desajustada daquilo que precisamos. Por outro lado, muitos dos que respondem aos anúncios dizem logo que não querem emprego, mas apenas o papel assinado”.
Também um outro empresário da região refere as dificuldades em encontrar “pessoal polivalente que possa um dia fazer uma coisa e noutro dia outra”. Por isso, teve de acabar com a prestação de serviços na área da colocação de vedações. Há um ano, as empresas de metalurgia e metalomecânica estimavam em cinco a dez mil pessoas o défice de mão-de-obra qualificada; hoje, a indústria garante que precisa já de 28 mil trabalhadores para crescer e que não os encontra em Portugal.
“Queremos alertar para este problema, que é muito grave e que afecta a competitividade das empresas. As cativações orçamentais, por imposição do Ministério das Finanças, têm constrangido, de forma muito séria, a actividade do Cenfim [Centro de Formação Profissional da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica] que, nos últimos 30 anos, formou e qualificou 200 mil pessoas nos seus 13 núcleos pelo país e com uma taxa de empregabilidade da ordem dos 99,99%”, disse ao Dinheiro Vivo Rafael Campos Pereira, vice-presidente da associação AIMMAP.
De acordo com este responsável, a situação vai agravar-se nos próximos anos, porque não foram abertos novos cursos este ano, adianta o responsável. Também ao Dinheiro Vivo, o Ministério do Trabalho diz que “estão a ser trabalhadas soluções”.
“Os constrangimentos estão identificados, estando a ser trabalhadas soluções, algumas das quais em sede dos normativos do Orçamento do Estado. Para 2018 encontra-se igualmente previsto um reforço dos orçamentos dos centros de gestão participada, como é o caso do Cenfim”, diz fonte oficial do gabinete de Vieira da Silva.
Que motivos explicam a falta de mão-de-obra naquelas indústrias? A evolução demográfica negativa, diz Rafael Campos Pereira, mas também a falta de atractividade da metalurgia e da metalomecânica para os jovens, tornando difícil a substituição dos trabalhadores que se vão reformando. Além disso, “o enorme crescimento da indústria, com investimentos novos, quer de quem já cá está quer de novas empresas”, tem criado crescentes necessidades de trabalhadores.
Empresas querem recrutar mais em 2018
O estudo Total Compensation Portugal 2017, realizado pela Mercer/Jason Associates, que inquiriu 333 empresas, revela que 40% têm a intenção de contratar mais pessoas em 2018. Este ano, essa percentagem é de 41%.
Por outro lado, 47% das organizações afirmam que irão manter o número de colaboradores e 12% prevêem a sua redução em 2017. “Para 2018, o cenário é ainda mais favorável, uma vez que apenas 9% prevêem reduzir a sua força de trabalho”, aponta o documento. “Com uma amostra que atingiu um número recorde de organizações analisadas no estudo, mantém-se a tendência dos últimos dois anos no que se refere à intenção de recrutar mais colaboradores por parte das empresas participantes no estudo”.
Tiago Borges, da Mercer, explica que a estabilização do crescimento económico prevista para 2018 “tem contribuído para as melhorias verificadas na intenção de contratação de colaboradores por parte das organizações”. Mas encontrar os profissionais certos pode não ser fácil.
O Guia do Mercado Laboral Hays revela que 79% das empresas inquiridas sente dificuldade em recrutar, nomeadamente na área das tecnologias da informação. Estes profissionais “sabem o seu valor no mercado e colocam o factor salarial, a par da inovação nos projectos, como um dos principais elementos diferenciadores num processo de decisão entre diferentes ofertas de emprego”.