As mãos habilidosas de Piedade Alves, de 95 anos, deixaram há muito de costurar. Também as de Luís Isabel, da mesma idade, já não têm a destreza de outros tempos, quando a caneta era acessório fundamental deste aposentado da banca.
Mas nem a idade, nem a falta de prática, nem mesmo as artoses ou a vista cansada foram impedimento para estes e outros idosos do Centro Social Paroquial dos Pousos (CSPP), que se socorreram da sua melhor caligrafia para escrever ao Papa Francisco.
Desejam ser recebidos no Vaticano, pelo Sumo Pontífice, e por lá beber um chá ou um vinho, fazendo lembrar que a vida deve ser celebrada em todas as fases e que há um mundo de experiências a descobrir na velhice.
“O Senhor Santo Padre tem certamente uma agenda que é diferente da nossa e que, sem dúvida, é muito angustiante, intensa e preenchida. Mas, quem sabe, talvez nos possa doar um bocadinho da sua vida para nos encontrarmos aí, na sua casa!” escrevem os idosos, que desejam olhar os olhos “ternurentos” daquele que, através da televisão, os vai “inspirando”.
“Perdoe novamente a ousadia, mas se o Senhor Santo Padre entender po rbem, iríamos ao seu encontro, dentro de uns meses, durante este ano de 2022, e gostávamos mesmo era de ir a sua casa ou ao seu jardim para sermos recebido por si, para que pudesse falar connosco um minutinho e depois nos deixasse a brindar um vinho (alguns de nós ainda gostamos desse sabor) ou um chazinho, com o aroma que, na sua opinião, mais iríamos apreciar”, escrevem ainda.
Alexandra Neves, membro de direcção do CSPP, salienta que a redacção da carta não foi tarefa fácil. Entre 68 idosos utentes deste centro, apenas 20 conseguiram participar activamente na escritura. Em muitos casos, o analfabetismo, a demência ou a débil condição física levaram a melhor. Mas os que conseguiram fazê-lo, num processo que se estendeu por vários dias, apoiado pela animadora do centro, tiveram o gosto de preparar, pelo seu próprio punho, uma missiva dirigida ao Papa, ambicionando ser recebidos por ele.
Nesta mesma carta, de texto manuscrito sobre papel idêntico ao pergaminho, participaram ainda dez colaboradores e elementos dos órgãos sociais do centro, todos com o mesmo ânimo.
Alexandra Neves explica que o objectivo do CSPP tem sido motivar os idosos a partilharem sonhos que ainda gostariam de concretizar. Muitos deles já se realizaram, como os passeios a cavalo, as voltas de karting ou os baptismos de voo.
“Conhecer o Papa, viajar de avião e visitar uma grande cidade europeia são experiências que muitos não puderam ter na juventude e que anseiam agora viver”, expõe Alexandra Neves.
É grande a expectativa de que a carta seja respondida, uma vez que será entregue pelo próprio cardeal D. António Marto, que por estes dias está em Roma, conta Alexandra Neves. Se conseguissem esse encontro, em audiência pública ou reunião privada, depressa o CSPP se mobilizaria para levar até Itália dez idosos, acompanhados por dez assistentes, entre colaboradores e membros da direcção do centro. Nesse caso, antecipa Alexandra Neves, seguir-se-ia uma corrida contra o tempo, para angariar apoios, mobilizando organizações, empresas e particulares.