Conciliar a actividade médica com a investigação é um dos objectivos de vida de Irene Dixe Santo. Natural de Leiria, está a terminar a especialidade em radiologia no hospital da Universidade de Yale, uma das instituições de ensino mais prestigiadas dos EUA, onde também faz investigação na área da aplicação da Inteligência Artificial (IA) à medicina. Com 30 anos, tem já mais de 20 artigos científicos publicados e quase outros tantos em desenvolvimento e soma perto de 80 apresentações em conferências.
A aventura além-fronteiras de Irene Santo começou aos 18 anos, quando foi estudar medicina para a República Checa (actual Chéquia). Depois de se formar, fez estágios curtos em Inglaterra, Croácia e México, acabando por regressar a Portugal, onde trabalhou como interna no hospital de Leiria. Seria, no entanto, curto esse seu regresso às origens, porque percebeu que, em Portugal, dificilmente conseguiria conciliar a prática médica com a investigação ao nível que pretendia.
“Tive de decidir entre ficar mais perto da família, o motivo que me fez regressar, ou ir para o estrangeiro cumprir esse meu objectivo”, confessa Irene Santo, que, desde muito nova, quis seguir medicina. Já a escolha pela neuro-radiologia, que trabalha na área do diagnóstico de tumores cerebrais, acabou por ser influenciada por um episódio que viveu na adolescência, quando a mãe de uma das suas amigas de infância faleceu, vítima de um tumor na cabeça. “Foi um evento muito marcante, que acabou por influenciar a minha escolha”, assume a médica, que vive nos EUA desde 2020.
Nas ‘trincheiras’ contra a Covid-19
A mudança para Chicago aconteceu em plena pandemia e, inicialmente, o visto foi-lhe recusado, já que, naquela altura, vigorava nos EUA a proibição da entrada de pessoas vindas da Europa. Acabou, no entanto, por ser abrangida pela excepção que permitia esse acesso a quem ajudasse a “mitigar os efeitos da Covid-19”. “O primeiro ano nos EUA foi muito difícil. Estive nas ‘trincheiras’ do combate à pandemia. Vi morrer muita gente.”
Actualmente, Irene Santo é médica residente no hospital universitário de Yale em radiologia, sendo que, a partir de Julho do próximo ano, irá mudar-se para Nova Iorque, para fazer a sub-especialidade em neuro-radiologia na Universidade de Cornell.
Em paralelo com a actividade médica, desenvolve investigação em áreas como a saúde global e a aplicação da IA aplicada à medicina e ao ensino. Participou, por exemplo, no desenvolvimento de instrumentos que ajudam na elaboração e interpretação de relatórios de radiologia, nomeadamente, na “medição de tumores, do tamanho e aparência, na comparação com exames anteriores”. Dessa forma, “é possível perceber se o tratamento está a resultar, apoiando a decisão clínica”, explica Irene Santo.
Outra das suas áreas de interesse é a exploração do uso da IA na educação, através, por exemplo, do desenvolvimento de instrumentos, como algoritmos, que ajudem os alunos de medicina a estudar. Há ainda outra área que tem merecido a atenção da jovem e que se prende com violência nas relações de intimidade.
“Através da radiologia, é possível detectar lesões músculo-esquelécticas, obstétricas e ginecológicas reveladoras desse tipo de violência”, avança a médica e investigadora, autora de um capítulo de um livro, a publicar em breve, sobre esta temática.
Irene Santo tem também interesse pela área do ensino, para a qual despertou ainda durante o seu tempo de estudante de medicina na Charles University of Praga, onde foi convidada pelos seus professores a dar algumas aulas. Em Fevereiro do próximo ano, viajará até à Tanzânia, no âmbito de um protocolo da Universidade de Yale com uma clínica local, para dar aulas a internos.
Regressar a Portugal está, para já, fora dos seus planos. “As razões que me fizeram sair ainda se mantêm válidas e gosto muito do que faço.”