Quem vive no Centro de Alto Rendimento (CAR) do Jamor não enjoa de estar 24 horas por dia ligado ao desporto?
Se gostares do que fazes é pleno. Se não gostares é horrível. Sim, há momentos em que não apetece, como acordar cedo para ir correr, mas no final do dia, se juntar o ying e o yang, a balança pende sempre para o lado positivo. Sei que é preciso estar 100% focado no triatlo. E todos os atletas que se destacam fazem isso. Ou então andam sempre a viajar pelo mundo à procura do Sol.
Foi difícil, quando há nove anos se mudou de casa dos pais para o CAR?
De início foi diferente do que estava habituado, com um espírito muito competitivo, mas aos poucos fui encontrando amigos e é engraçado que apesar da competição é possível ter pessoas em quem confiamos e que até são os nossos adversários.
Agora o triatlo é presente e futuro.
Nestes últimos quatro anos começaram a aparecer os resultados de maior destaque e percebi que ia fazer disto carreira durante uns anos. Sinto que de ano para ano tenho estado a gostar mais e que ainda estou muito longe do meu potencial máximo. Apesar de já ter 28 anos, este é um desporto mais ou menos equivalente à maratona, de grande endurance, e os atletas conseguem estar a grande nível até aos 37, 38 anos.
O João tem apoio psicológico?
Sim, por um psicólogo do Benfica. É um grande boost para o rendimento, oferece-me tácticas e maneiras de pensar para enfrentar um desafio. Não me devo focar tanto no objectivo final, mas na tarefa, por exemplo. Step by step. As pernas mandam muito, mas se a cabeça não estiver orientada, não vale a pena.
Ajuda também a superar os momentos menos bons.
Conhece-me melhor do que eu e sabe bem o que é melhor para mim. Se tiver algum problema, falo com ele. O psicólogo é como um acelerador de tempo. Consegue desbloquear um determinado problema num terço do tempo que eu precisaria se estivesse sozinho.
Estar constantemente a viajar, em estágios, é uma dor de cabeça ou uma motivação?
Antigamente era uma dor de cabeça, mas agora, felizmente, a minha namorada, Melanie Santos, também faz triatlo e viajamos sempre juntos. É muito bom. São sempre alturas competitivas, em que treinamos menos e aproveitamos para passear e conhecer.
Diz que é rígido consigo.
Não gosto de estar a fazer algo para perder tempo. Hoje, sou incapaz de cortar metros ou baldar-me a treinos, porque acredito em todo o processo, no trabalho do meu treinador e das pessoas que me envolvem. Se assim for tenho meio caminho andado para cumprir os objectivos.
Que objectivos são esses?
Para os Jogos Olímpicos é conseguir o diploma olímpico, que representa um lugar nos oito primeiros. É um objectivo bastante complicado, mas há dois anos fui quinto no Mundial e no ano passado fui oitavo. Se não conseguir vou ficar fora das minhas expectativas. E lá estou eu a ser um pouco rígido, mas quando estou num projecto olímpico e me pagam a bolsa de nível dois, é mesmo para conseguir um diploma olímpico.
Irrita quando um jornalista fala em medalhas?
Não irrita, mas deixa-me a pensar. Quanto é que um país como a Inglaterra, a França, a Austrália, a Espanha ou o Brasil investe para conseguir ganha uma medalha olímpica? Um milhão? Quinhentos mil? Provavelmente bem mais do que isso. Ninguém me pode exigir uma medalha olímpica, porque são claras as condições que temos. Sinto que cada vez temos mais apoios, mas é um pouco como fazer omeletas sem ovos.
Que carências são essas?
Desde boas condições de treino, passando pela alimentação de alta competição. Porque o importante não é só boa alimentação, mas com alimentos de qualidade, coisas que saem caro. Acredito que até seja um pouco injusto para o Estado português proporcionar essas valências aos atletas quando há outros problemas importantes por resolver no País.
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