Tem estado muito activo enquanto associado sportinguista, não só nas redes sociais, mas também promovendo, juntamente com Vitalino Canas e Tavares Pereira, reuniões com o presidente da Assembleia Geral visando alterações estatutárias. Foi o quarto lugar da equipa de futebol que fez com que sentisse ser necessário tomar uma posição?
Efectivamente, este ano é atípico para um clube com a dimensão do Sporting. E se podíamos ter pensado que a época passada ser uma espécie de ano zero, dos responsáveis entenderem como tudo funciona e de o projecto arrancar a seguir, essas expectativas foram absolutamente goradas. No ano de ensaio, digamos assim, até tivemos dois títulos, o que fazia prever que esta época poderia até ser uma época com preparação, pensada, bastante melhor. Não foi. Não houve resultados, foi frustrante, e acabámos, para lá dos maus resultados, ter actos de gestão que denegriram a imagem do clube.
A que se refere?
A um dos últimos actos, em que, não sei por que carga de água, fomos buscar um homem que nem está credenciado para liderar uma equipa sénior de futebol. Fomos buscá-lo na perspectiva de que íamos conquistar o terceiro lugar ao Sporting de Braga, o que não só não aconteceu, como acabámos por capitalizar o nosso adversário. Mas, pior do que isto tudo, é a imagem que daí advém. Há falta de princípios, e vem para a comunicação social que não honramos os nossos compromissos. Mais grave ainda: um negócio que se previa de um valor, já está 40% acima. Isto só para falar dos últimos acontecimentos. É uma época atípica e fora do que é admissível no clube. O Sporting não se compagina com isto.
“Se o Sporting precisar e virem que eu posso ser útil, sabem onde estou. Agora, eu impor-me? Não contem comigo”
Não foi este o Sporting que fez com que se apaixonasse pelo clube.
De maneira nenhuma. Ao longo da minha vida fui formatado e obrigado a organizar-me, a pensar, a ser ambicioso. A certa altura vi o Sporting de acordo com estes princípios. Do Sporting dos Cinco Violinos, do Carlos Lopes, do Joaquim Agostinho, que fizeram com que a bandeira portuguesa se levantasse no mundo todo, do Cristiano Ronaldo, do Figo, da excelente escola que dava atletas de qualidade para o mundo todo. Foi isso que me fez um orgulhoso sportinguista. Todo aquele passado ecléctico, ganhador, organizado, sem estar envolvido em problemas que tragam falta de verdade e competitividade ao desporto. Começo a verificar que isso não está lá. Se não está lá, temos de tomar alguma medida. Temos de pesar o que é mais prejudicial ao Sporting. Se é continuar com estes órgãos sociais entendendo nós o que sabem ou não sabem ou, bem pelo contrário, tomar outra medida, até aconselhá-los. Se não são as pessoas mais dotadas e experientes para estes cargos, vão buscar quem seja capaz. Que trabalhe sob a vossa égide, mas que seja capaz de fazer, de forma a emendar isto tudo. Ou, então, aconselhá-los, com elevação e humildade – porque só os homens humildes tomam grandes decisões – a avançar para eleições com calma e tranquilidade. Escolhem um timing e entregam o Sporting novamente a eleições. Só homens grandes e com elevação podiam fazer isto e, pelo esforço que fizeram, só tínhamos de os cumprimentar.
É homem para avançar quando as eleições chegarem, seja agora ou em 2022, como está previsto?
Ao longo dos últimos meses tenho defendido que as diferentes sensibilidades leoninas têm de se consciencializar que têm de colocar o seu conhecimento, o seu saber e a sua experiência ao serviço do clube e não pensar que têm de ser presidente. Se todos os sportinguistas pensarem ‘a solução tenho-a eu, não a entrego, vou-me fechar’, então o melhor é o Sporting acabar. Mas se pensarmos que temos formas diferentes de pensar, somos divergentes, mas todos queremos o bem do Sporting, todos nós sentados à mesma mesa somos capazes de arranjar ideias e projectos, condições para guindar o Sporting àquilo que merece.
São essas pontes que tem tentado encontrar?
Exacto. Tenho falado com todas as diferentes formas de pensar o Sporting para que na divergência encontremos a convergência necessária para engrandecer o clube.
Não respondeu. Admite ser candidato?
Não me posso meter numa coisas destas e depois dizer aos outros para avançarem. Ficava-me mal e seria uma certa falta de coerência. Nessa altura, se for vontade dos asociados, se virem que tenho a experiência, a atitude e a equipa necessária, então estarei disposto a avançar. Mas não é para presidente, é para o lugar que o Sporting quiser. Os sportinguistas é que vão dizer se serei candidato a presidente.
Nas redes sociais percebe-se que tem uma falange de apoio.[LER_MAIS]
Tenho recebido mensagens e manifestações de Norte a Sul do País, de pessoas que não conheço, não sei quem são, mas que têm lido os meus artigos e entendem que a minha posição está mais ou menos certa e dizem para avançar. Se o Sporting precisar e virem que eu posso ser útil, sabem onde estou. Agora, eu impor-me? Não contem comigo.
Da jorna aos 11 anos à aldeia do futsal
“ Não vivo agarrado. Tenho gosto em tudo e esqueço-me de tudo. Faço uma coisa, atinge-se aquela etapa, no dia seguinte não dou valor àquilo e já quero outra coisa. De vez em quando as pessoas é que me lembram do que fiz”, admite Joaquim Coutinho Duarte, de 70 anos. Natural da Burinhosa, aldeia da União de Freguesias de Pataias e Martingança, concelho de Alcobaça, aos 11 anos já trabalhava na Fábrica Escola Irmãos Stephens, na Marinha Grande, empresa da qual só saiu quando era adjunto do presidente do Conselho de Administração. Estudou, licenciou-se em Engenharia, e tem tido uma vida cheia. Foi futebolista no Atlético Clube Marinhense e no Centro Cultural Recreativo e Desportivo (CCRD) da terra onde nasceu, do qual se fez sócio aos 11 anos e que um dia foi presidente. Foi o primeiro comandante dos Bombeiros Voluntários de Pataias, fez e escreveu para teatro, foi director-geral da SPAL e da Mota-Engil. Empresário em Portugal e em Angola, levou o clube da sua pequena aldeia à 1.ª Divisão de futsal e fez com que a última etapa da Volta a Portugal em bicicleta de 2014 começasse lá na terra, nas Portas da Burinhosa, um monumento que mandou erigir em honra dos seus concidadãos.
Se assim for não terá dúvidas.
Não posso ter outra decisão e se a tivesse não estaria a ser coerente. Tenho trilhado a minha vida com coerência. Não apareço hoje e com esta idade só porque gosto do Sporting e porque saltei em Alvalade com uma bandeirinha. Conduzi empresas que têm algum brilho e das quais me orgulho. Estou a falar da SPAL, da Mota-Engil e das minhas próprias empresas. Por onde passei liderei sempre centenas de pessoas, com coerência e princípios. E se digo que gosto de fazer pontes e de ouvir, se o Sporting entender que, nesta fase da vida, tenho o perfil e que posso ser útil, não faria sentido virar as costas.
Ouvir, nesta altura, é crucial?
Sempre gostei muito de ouvir. Muitas vezes fui surpreendido por pessoas de quem pensava que dali não saía nada, mas saíram ideias que solucionaram problemas. Como diz o ditado do bom povo da minha terra, a Burinhosa, às vezes por detrás do pior mato sai o melhor coelho.
Iria deparar-se com um gigante de pés de barro, cheio de problemas económicos.
O Sporting tem vindo a ser notícia e não pelas melhores razões. Quando se diz que não pagou aqui e não honrou os seus compromisso ali, sinto-me mal. Um dia é o Braga, depois o Bratislava, e isto a mim dói-me e dói a qualquer pessoa que nunca comprou sequer um alfinete sem ter dinheiro. Qualquer pessoa de bem gosta que se faça da sua palavra a sua fortuna. Porque se não a honramos hoje, não a honramos amanhã, um dia ninguém acredita em nós e então é o fim. Não de nós, mas daquele que nós representamos, que é o Sporting. E também essa atitude me fez criar estas pontes, porque temos de acabar com isto juntos. O eu, neste caso, não é solução. Gostava que o eu acabasse no Sporting.
Acredita que ainda é possível fazer o Sporting voltar aos tempos de glória?
Pode voltar àquilo que os sportinguistas quiserem. E pode também, a qualquer altura, estar a disputar lugares que parecia não lhe estarem reservados. Se nós sportinguistas, e eu sou um dos culpados, continuarmos a ter o comportamento que temos, a não dignificar, a não tomar as melhores medidas gestoras, então o que iremos fazer é, qualquer dia, estar a lutar para o sexto é sétimo lugar, nem subimos nem descemos, sem honrar o passado leonino.
Fala-se de cortes nas modalidades ditas amadoras.
O Sporting é ecléctico, um dos melhores clubes do Mundo. Dizemos isto com uma certa vaidade, mas tentam denegri-lo. Não tenhamos dúvidas que é o emblema mais representativo de Portugal. Tem, hoje, 54 modalidades, mas tudo entronca na mesma coisa, que é o desempenho da equipa de futebol. Aí é que está a angariação de sponsors, de dinheiro e de receitas. As modalidades poderão vir a sofrer, não porque queremos, mas porque não se tomaram as melhores medidas. Onde é que vamos buscar as receitas? É ao futebol. Mas não são só as modalidades, é também Alcochete. Toda a gente diz – e eu também digo nos meus artigos – que o Sporting tem de ter uma grande formação. Tradicionalmente é o melhor português e um dos melhores do mundo neste aspecto, mas tem de ser dinâmico, tem de ir buscar, tem de ganhar corridas.
Os outros continuam a crescer nesse aspecto.
Desde que entramos na escola primária estamos em competição e na formação temos de ser melhores do que os outros. Temos de ser mais ágeis, mais rápidos e pensar melhor. Somos um clube tido como grande formador, mas também temos de saber, através da formação, acautelar o futuro do clube. Os atletas que mandamos para o mundo do desporto, são o nosso símbolo, mas temos também de ganhar alguma coisa. O atleta que se formou também tem de dar alguma coisa à casa-mãe e permanecer no clube algum tempo. É melhor para ele e para a carreira dele. Mas tem de ser composta por grandes saberes de futebolista de valor, porque se atiro meia-dúzia de rapazes de 18 anos lá para dentro, eles vão comer a relva, mas se calhar não chega. Como não me chegava a mim aos 18 quando queria competir com gente de 40.
Com as devidas diferenças, quer voltar a colocar o Sporting no mapa como fez com o Burinhosa, que levou à 1.ª Divisão de futsal.
Se me deixarem, e nunca farei nada sozinho, quero contribuir para isso. A Burinhosa deixou de ser uma aldeia com 600 eleitores, desconhecida, que ninguém sabia onde era. Hoje, onde quer que falemos dela em Portugal, toda a gente sabe o que é. Comigo, não chegou ao fim de uma época desportiva a dever um euro. Foram feitas coisas a bem do associativismo, do Desporto e deste povo tão bairrista, que sente tanto a sua terra.