O ministro do Ambiente reconheceu hoje ter mudado de opinião quanto à construção de uma estação de tratamento de efluentes suinícolas (ETES) em Leiria, considerando que “o principal destino dos efluentes pecuários é a valorização agrícola”.
“Acreditámos, numa determinada fase, que a solução poderia ser uma solução pública através de uma ETES. É um facto”, afirmou João Pedro Matos Fernandes, no parlamento, em Lisboa, onde foi ouvido na Comissão de Agricultura e Mar sobre a poluição na bacia hidrográfica do Lis, numa audição requerida pelo Bloco de Esquerda.
O governante ressalvou, contudo, que há uma coisa onde não mudou de opinião: “Acredito mesmo que vamos resolver este problema, pensando numa forma diversa”, garantiu.
Em Dezembro de 2020, o ministro admitiu que não será construída uma ETES em Leiria, por falta de compromisso com os empresários do sector.
“A solução de uma grande ETAR [estação de tratamento de águas residuais] demonstra ser uma solução ineficiente, que vai obrigar a um investimento grande”, disse então, observando que “o problema não está no investimento, mas na garantia e no compromisso de quem produz efluentes de os levar a essa mesma ETAR, porque não existe uma rede de esgoto”.
Na intervenção inicial no parlamento, na qual fez o histórico do processo relacionado com os efluentes suinícolas na região de Leiria, João Pedro Matos Fernandes referiu-se à Estratégia Nacional para os Efluentes Agropecuários e Agroindustriais (ENEAPAI 2030), explicando que “onde uns vêem efluentes e solos saturados, a ENEAPAI vê fósforo e azoto que os solos mais pobres do país necessitam”.
“O principal destino dos efluentes pecuários é a valorização agrícola e assim deve ser. Portugal, em termos globais, tem défice de nutrientes e aqueles contidos nos efluentes pecuários podem ser vantagens competitivas e ambientais para a agricultura”, assinalou, acrescentando: “Pensem em fertilizantes que deixam de ser importados, emissões que são evitadas, energia que pode ser produzida”.
Segundo o ministro, “a existência de fósforo e de azoto é de facto mesmo a certeza de que a última das soluções do ponto de vista técnico deve ser o tratamento dos efluentes”.
“Ideal é mesmo a valorização e a valorização mais imediata é, obviamente, feita pelo espalhamento, não é feita pelo espalhamento sempre no mesmo sítio”, mas nos sítios onde esta matéria orgânica faz falta, notou, adiantando que “a seguir à possibilidade de utilizar o espalhamento para resolver este problema deve ser a digestão anaeróbia ou a compostagem”.
“É isso que estamos a avaliar para a ETAR [estação de tratamento de águas residuais] do Coimbrão [concelho de Leiria]”, esclareceu.
O ministro esclareceu ainda que o Governo não desistiu do contributo para as soluções, sendo que “os estudos que estão a ser desenvolvidos serão apresentados no início do terceiro trimestre”.
Para o deputado Ricardo Vicente (BE), “a solução é simples”: o Estado “cria uma estrutura de tratamento” e a partir dela “pode garantir valorização em forma de energia ou de compostos orgânicos” e “cobra aos suinicultores” a entrega de efluentes, mas também constrói “capacidade de fiscalização que não teve até hoje para obrigar a que essa entrega ocorra ou que se encerrem as actividades danosas para o ambiente”.
Já o deputado João Marques salientou que para o PSD a ETES é a “única forma de resolver este grave problema de poluição”, frisando que ou o Estado tem autoridade para obrigar a entrega de efluentes numa ETES ou “nunca mais” se resolve o problema.
“O Governo é governo para governar e é governo para impor condições e obrigar o sector a tratar a poluição que produz”, frisou.
Por seu turno, o deputado Raul Castro (PS), antigo presidente da Câmara de Leiria, adiantou que a Recilis, empresa de tratamento e valorização de efluentes, tem “algumas propostas de soluções”, defendendo a necessidade de “dar o benefício da dúvida à seriedade das propostas que tem, apesar de todas as falhas que já houve”.
“Eu tenho a certeza absoluta de que da parte do Governo (…) é chegado o momento de podermos colaborar também com eles e ver como isto se pode resolver de vez”, declarou Raul Castro.
O deputado comunista João Dias alertou para a necessidade de os produtores poderem adaptar as suas explorações à legislação em vigor, referindo que “o caminho não é o do encerramento, é de manter os postos de trabalho e a viabilidade das explorações, respeitando as questões ambientais.
Já Inês Sousa Real (PAN) pediu “um robustecimento da capacidade de fiscalização”, notando que o problema de Leiria é transversal a outros locais do país, e a ausência de fiscalização “tem como consequência os danos ambientais gravosos, como do ponto de vista do bem-estar animal um fechar de olhos por completo”.
O ministro acrescentou que a facturação destas empresas no ano de 2020 foi de 1,2 mil milhões de euros”, questionando o deputado João Marques se “tem mesmo a certeza que faz falta dinheiro público para fazer uma ETES”.
“Se querem inaugurar uma ETAR para funcionar nunca, não contem comigo”, declarou, respondendo à questão de Ricardo Vicente da dívida na ordem da Recilis à Aguas do Centro Litoral, que gere a ETAR do Coimbrão, onde são tratados efluentes suinícolas, João Pedro matos Fernandes respondeu: “A dívida baixou nos últimos tempos e começou a ser paga”.