Não somos malucos. Somos humanos. Queremos amar e alguém tem de nos perdoar pelas escolhas que tomamos para amar, porque os caminhos são muitos e negros, e somos ardentes e cruéis durante a nossa viagem» (Leonard Cohen, in Poems and Songs). A trajectória das relações e envolvimentos é sempre um caminho indefinido que se alarga no plano ilimitado da paixão. É um andamento desmesurado que conduz, frequentemente, a uma retórica da desilusão e do vazio.
O que nos faz falta é habitar a vida de um modo mais autêntico, perdoando os outros e aplicando a mesma fórmula a nós mesmos. A solidão que nos trespassa e conduz à dor física e psicológica, é a que decorre da incomunicabilidade afectiva com todos os que escolhemos amar genuinamente, eles que com essa ‘negritude’ e ‘crueldade’ nos confiam a alma.
Vivemos iludidos por uma visão da omnipotência que conduz à fraqueza e à vulnerabilidade. Há uma espécie de ferida nesse horizonte ideal que buscamos, que contempla a esperança de resgatar o amor para um estado maduro, porventura, mais grandioso. Kierkegaard afirmava: «Deliciosa ocupação é deixar amadurecer um segredo».
Talvez pudéssemos afirmar que em cada um de nós existe, permanentemente, essa falta concreta que achamos ser (ausência) de uma outra parte (fora do nosso corpo), o que nos faz sentir sempre incompletos e insatisfeitos. É inevitável que possamos experimentar problemas emocionais e amorosos, como os imprevistos do ‘segredo’, atribuindo às ausências e às perdas a causa primordial das nossas desilusões.
O diálogo e o perdão são elementos nucleares na busca do sentido da vida; e do reencontro, no outro, da parte que nos falta, proporcionando aquilo que nos completa como seres inacabados; aquilo que nos complementa nas nossas necessidades gregárias – psicológicas e físicas. Uma busca inexorável – porque em cada ser humano há uma espécie de “fenda” – essa parte da emoção que foge à razão e que, por isso, nos cria um vazio constante.
«Se não fôssemos perdoados, eximidos das consequências daquilo que fizemos, a nossa capacidade de agir ficaria (…) limitada a um único acto do qual jamais nos recuperaríamos; seríamos (…) as vítimas das consequências, à semelhança do aprendiz de feiticeiro que não dispunha da fórmula mágica para desfazer o feitiço» (Hannah Arendt, in ‘A Condição Humana’).
Porque devemos sempre renunciar a alguma coisa, o que não significa comprometer a essência da justiça. Quem perdoa terá de renunciar ao ressentimento.