Ia começar por dizer que chego atrasado a Abril, mas, na verdade, nunca chegamos atrasados a Abril. Poderíamos escrever, falar, reflectir sobre Abril em pleno Agosto e, ainda assim, chegaríamos a tempo. A Abril chega-se sempre a tempo.
Só vi nas notícias, mas percebi bem que foi bonita a festa, pá! Aqui deste lado da fronteira, Abril nunca passa despercebido, claro, mas este ano ainda menos. Não só pelos redondos 50, mas também pelo momento complicado que vivemos nos últimos dias.
Com a possível demissão de Pedro Sanchez a pairar no ar, farto das tácticas miseráveis, mentirosas e mesquinhas da direita e da extrema-direita (na verdade, em Espanha, a distinção entre uma e outra é, hoje, virtualmente impossível), foram muitos e bons os artigos que se ancoraram na nossa Revolução para tentar encontrar o alento e a esperança que, por vezes, parecem difíceis de vislumbrar.
Abril tem sempre esse poder de nos lembrar que é possível impedi-los de passar. Esse poder de unir as pessoas e os povos, de construir pontes, de fortalecer amizades, de potenciar a criatividade e a cultura. É precisamente sobre esta capacidade de Abril juntar pessoas e povos em torno de uma causa comum, que se debruça um dos textos mais interessantes que li e que recomendo vivamente.
Publicado na revista musical catalã Enderrock pelo jornalista Joaquim Vilarnau e intitulado “50 anys de la Revolució dels Clavells i 12 connexions musicals entre Catalunya i Portugal”, é um texto magnífico que, como o próprio título indica, reflecte sobre como Abril foi e continua a ser fonte inesgotável de inspiração e ligação entre culturas.
Dos laços de amizade entre Zeca Afonso e inúmeros nomes incontornáveis da canção catalã, às versões da “Grândola”, dos temas originais “Abril 74” e “Abril” dos gigantes Lluís Llach e Maria del Mar Bonet, à conhecida relação de Salvador Sobral com a Catalunha e passando pela banda de metal portuguesa Els Focs Negres, que, pasmem, cantam exclusivamente em catalão, o autor desenha um fantástico mapa cultural que nos recorda que Abril será sempre o maior dos nossos legados. Mantê-lo vivo é, pois, a nossa obrigação. Hoje e sempre!