– A ideia… perfeita… ando constantemente a persegui-la, a compor ou escrever, por vezes até sonho com ela e a coisa está a correr mesmo bem, depois acordo e já fugiu. Leonard Bernstein disse que todos os compositores, escritores, pintores, realizadores, etc, têm uma só única ideia em toda a vida, e passam o resto dos seus dias a recriar, transformar, dar novas perspectivas a essa mesma essência.
– Questiono-me se… ainda estará alguém acordado ou já adormeceu tudo com esta prosápia…
– Adoro… ser disruptivo, obrigar-me a pensar e aprender sempre mais. Adoro ostras, lavagante e espumante non-stop até vir o comunismo. Viver sempre com a constância de poder ser o último dia. Pode ser adrenalina, como quando acordo com os pés de fora, pego numa das minhas motos e arranco para uma serra cheia de curvas, e a dado momento, a meio de uma delas, o cotovelo a 10 cm do asfalto, ao acelerar ainda mais para a recta seguinte penso: “se apanhas algum atrasado mental distraído a trocar SMS a conduzir em contra-mão já foste”. Ou pode ser pura e simplesmente passar o dia inteiro no sofá debaixo de uma manta com a minha amada e o gato a ver todas as temporadas do Gumball. Adoro estar vivo. Mas não temo já cá não estar amanhã.
– Lembro-me tantas vezes… tenho uma memória, em geral, muito precisa. Mais do que não esquecer algum mal que me façam, nunca esqueço o bem, pode ser um mero grão de trigo, mas sou grato para a vida. Dito isto, não sou saudosista nem passo tempo a olhar para trás.
– Desejo secretamente… não tenho desses segredos. Aquilo que desejo na vida está às claras…Bem, um amigo sugeriu-me uma orgia com anões… talvez não fosse mal pensado, com ambiente David Lynch, e se fosse na Comporta e também lá estivesse aquele senhor das compotas da DGS…Outra hipótese, por uns meses talvez, isolar-me do mundo, ir para o meio da serra com um rebanho de cabras, uma resma de papel em branco e um lápis, rodeado de granitos e urzes. Não diria replicar o Ti Zé Pastor dos “Simples” do Guerra Junqueiro, pois sei de um amigo nosso que ainda hoje está proibido de se aproximar de Freixo de Espada À Cinta porque, inspirado por Camilo Castelo Branco, confundiu os conceitos de pastor e rebanho e teve um caso com uma ovelha. Sentiam-se sozinhos, coitados, não vamos julgar sem ouvir todos os intervenientes…
– Tenho saudades… do meu pai, é a única excepção em relação a não passar tempo a olhar para trás. Desde que morreu, lembro-me dele com frequência, não tanto pela saudade, mas mais por me rever nele em certos aspectos, e nunca ter dado conta antes.
– Sinto vergonha alheia… dos “profissionais” das artes e da cultura que não têm brio, que são canhestros, vendem banha da cobra, que não têm integridade, que são desonestos, profissional, artística ou intelectualmente. Na música, teatro, letras, belas artes, fotografia, cinema, em todos os “métiers” da cultura e das artes ninguém se mete por acaso, ninguém vem ao engano, é uma escolha vocacional. Se não consegues atingir objectivos, o nível a que aspiras ou dos teus pares para te poderes intitular, pára e muda de carreira. Permanecer e viver à custa da arte, em nome da arte enganar o público e descer a bitola, essa é a minha vergonha alheia. É óbvio que aplicando isto a todas as outras profissões/funções do planeta, e juntando o Princípio de Peter, aí diria que tenho vergonha alheia da humanidade, no que toca a medíocres e oportunistas.
– O futuro… pessoalmente, tal como não olho para trás não olho muito para a frente. Quando acordo abro os olhos e logo vejo o que me traz cada dia. A compor ou a escrever posso ter projectos pensados, mas não tenho futuros pensados.
Para o mundo, continuo a ter esperança no futuro, acho que ainda temos muita coisa boa dentro de nós, se soubermos parar para nos escutarmos por dentro.
– Se eu encontrar… forma de escrever menos em cada tópico…
– Tenho orgulho… imenso, desmedido, nas pessoas que amo, a minha companheira, a minha mãe e o meu filho. E também, com vaidade admito, na quantidade considerável de amigos que a vida me tem oferecido, e nas qualidades humanas de cada um deles.