A criação de um parque de merendas e um espelho de água no Lapedo transforma, ao fim-de-semana, o, outrora tranquilo e intocado vale, num local de romaria, para famílias em traje de passeio, equipadas com cestos de piquenique e grelhadores para desfrutar o espaço.
Nos idos de 60, 70, 80 e 90 do século passado, quando o calor começava a apertar, os rapazes e raparigas, das freguesias da Boa Vista, Caranguejeira e Santa Eufémia corriam a refrescar-se nas águas geladas da cascata e da praia improvisada na curva que a Ribeira do Sirol descreve, mesmo no centro do vale cársico.
As tardes dos domingos de Agosto acabavam, inevitavelmente, com uma cartada ao sol, na eira da “casa abandonada” junto ao curso de água, ou com uma visita a uma das várias grutas da zona.
Obrigatória ainda, era a “bucha”, antes de regressar a casa: uma sandes embrulhada num guardanapo de papel e enfiada dentro de um saco de plástico, que fazia o caminho desde casa, presa ao guiador da bicicleta.
Se as condições fossem as ideais, haveria ainda tempo para roubar algumas doces laranjas do pomar ali ao lado.
Mas os tempos mudaram e o Lapedo também.
O vale, cujo território é partilhado pela Freguesia da Caranguejeira e União de Freguesias da Santa Eufémia e Boa Vista, foi parar às bocas do mundo quando, no dia 28 de Novembro de 1998, arqueólogos descobriram o local de enterramento de uma criança pré-histórica que mostrava sinais de resultar de um cruzamento entre duas espécies distintas de humanos modernos – homo sapiens e homo neandertal -, obrigando a reescrever a história da espécie.
O interesse pelo local aumentou e os visitantes provocavam engarrafamentos na estreita estrada que atravessa o vale, situado a cerca de 13 quilómetros de Leiria.
Assim esteve até que ali foram criados dois grandes estacionamentos e um parque de merendas, dotado de instalações sanitárias, bar, mesas e parque infantil.
Existe ainda um grande espelho de água que, apesar das proibições, é muito procurado pelos jovens para mergulhos no Verão.
Centro de Interpretação do Abrigo do Lagar Velho
O Menino do Lapedo, achado arqueológico datado de há cerca de 24.500 anos, corresponde a uma criança, que permite documentar um tipo de mosaico resultante de uma miscigenação entre homo sapiens e homo neandertal
No estreito vale, com cerca 1,5 quilómetros de extensão, a natureza é luxuriante, apesar da pressão humana. Existem [LER_MAIS]espécies vegetais raras e protegidas por lei, como o azevinho, a azinheira, flores silvestres, sobreiro e exemplos também curiosos de fauna, como esquilos, anfíbios, peixes autóctones, javalis, lontras ou cágados.
Geomorfologicamente, o vale tem forma de um “canhão”, pacientemente erodido, no maciço calcário, ao longo de centenas de milhares de anos pela Ribeira do Sirol.
Para dar a conhecer este património único, foi criado um percurso pedestre circular que inicia e termina no Centro de Interpretação do Abrigo do Lagar Velho, estrutura que conta a história do Menino do Lapedo.
As caminhadas no local podem ser realizadas durante todo o ano, mas as melhores épocas são os meses mais húmidos, nas estações de Outono, Inverno e Primavera, pois permitem ver a natureza autóctone, na sua forma mais exuberante.