Aliam a técnica à expressão corporal para conquistarem medalhas e esfumam a força física no equilíbrio e na coordenação que transformam anos de trabalho em coreografias que até parecem simples. A simbiose perfeita entre o corpo e a música em cima de patins de quatro rodas traduz a patinagem artística.
Uma arte bonita onde a competição esconde centenas de horas de treino, dedicação no ginásio e muito trabalho na flexibilidade. “Tudo muda, aprende a ser responsável e pontual, a ter regras e até a alimentação e a forma de estar são diferentes porque isto passa a ser a vida dela”, conta Kseniya Postolenko, de 37 anos, mãe “muito orgulhosa” de Albina Kachur, de 13 anos.
Com ascendência ucraniana, a atleta de Leiria começou no ballet mas rapidamente mudou o seu rumo no Centro de Convívio e Recreio do Telheiro (CCRT). “Vivia aqui perto e vinha com a minha avó ver as meninas mais velhas a patinar e ficava a imitar os movimentos delas”, recorda a menina que quis entrar na modalidade, pouco depois conquistou um Campeonato de Esperanças e acabou a ser uma inspiração para a irmã mais nova.
Certa de que “é preciso vontade, fazer mais que os outros, ter pais que ajudem e muito treino físico e mental”, não deixou que a pandemia atrapalhasse os planos de uma vida e não só continuou os treinos em casa como se mudou para o Porto “atrás do sonho”.
Já na Associação Desportiva Rolar Matosinhos, sagrou-se no último ano campeã nacional em solodance e venceu a Taça nacional e europeia da modalidade. Títulos que, confessa, alimentam, “a vontade de demonstrar a forma bonita, feminina e com postura de patinar”.
“Eu sei o trabalho que ela faz e o longo caminho que trilha até aos campeonatos que acabam por servir apenas de demonstração do que está para trás”, enaltece a mãe.
A preparar-se para o Campeonato da Europa deste ano, Albina assume que ambiciona um Mundial, tem “o grande sonho de ver a modalidade a chegar aos Jogos Olímpicos” e adora regressar à cidade do Lis para visitar a família e o clube onde construiu “estas bases”.
“Representar o País é um grande orgulho”
No mesmo palco de ensinamentos, conhecemos outra história parecida que também começou com o “encanto pelas piruetas e pelos saltos” e se desenrola com “o sonho de dar mais visibilidade à patinagem artística em Portugal”.
Com apenas quatro anos, o Simão Carlos, agora com 17 anos, da freguesia das Cortes, quis seguir os passos da irmã.
Começou no Hóquei Clube de Leiria, mas acabou por se mudar para o CCRT por estar mais perto de casa e foi com este emblema que se sagrou campeão e vice-campeão nacional, em 2015 e 2021, e com o qual já participou no Campeonato e na Taça da Europa. Recentemente foi chamado a representar Portugal na Taça do Mundo numa “experiência completamente diferente” da qual enaltece que “representar o País é um grande orgulho”.
Defensor de que “cada competição é uma oportunidade para conhecer e aprender com outros países”, lamenta “a falta de reconhecimento deste desporto bonito por parte do povo português”.
Para futuro desenha mais presenças nas competições europeias com as cores portuguesas e mantém o foco no trabalho para tentar chegar a um nível mundial, apesar de reconhecer “a dificuldade em conciliar a carga de treino com ginásio, trabalho de flexibilidade e os estudos”. “Também gostava de ser treinador ou juiz”, acrescenta o aluno que está a terminar o 12.º ano num curso de humanidades.
“Temos conseguido criar a escola com que tanto sonhámos”
A história da patinagem artística do CCRT desenha-se há 12 anos. “O clube tinha um pavilhão muito bom e as pessoas estavam muito receptivas pelo que conseguimos construir a nossa escola e crescer”, explica a coordenadora técnica que já foi atleta e acabou por dar continuidade ao projecto iniciado por Cátia Carril.
Entre risos, Josiana Vieira, 31 anos, recorda ainda que “o futsal só começou depois e com um pai de uma patinadora”.
“A patinagem artística começou lentamente, no início não tínhamos grandes resultados, o objectivo era conseguir criar uma escola de formação sólida e agora já temos 66 atletas e estamos sempre no pódio nas provas a que nos propomos em todas as disciplinas a nível distrital”, enaltece sobre a secção que tem atletas dos 5 aos 22 anos e disponibiliza as disciplinas da patinagem (livre, solodance, show, obrigatórios).
Numa modalidade “cada vez mais exigente e que quer evoluir para Olímpica”, Josiana garante que “requer muito trabalho do treinador” e conta com Neuza Carlos e Ana Martins para fazer a diferença.
“Gostávamos, por exemplo, de ter seniores porque a nível nacional há poucos e até aulas lúdicas para adultos”, conta, afirmando que “o trabalho tem dado frutos” e permitido “criar a escola com que tanto sonhámos”.
Num clube que tenta ‘casar’ as suas duas modalidades rainhas, a patinagem artística e o futsal, não é insólito ver jogadores a assistir à patinagem ou patinadoras a vibrar com os golos dentro das quatro linhas.
Com características técnicas tão distintas, a treinadora garante que há um ponto em comum: “É aposta na formação com valores éticos e morais acima de qualquer outra coisa. A ética, a humildade, a responsabilidade, o espírito de sacrifício, a união, o respeito pelo outro, pelo colega e pelo adversário estão em uníssono no clube. Depois então que venham as medalhas e o resto”.