O Presidente da República pediu hoje, no seu discurso do Dia de Portugal, um futuro mais igual e menos discriminatório para todas as terras do país, sem novas tragédias como os incêndios de 2017.
“Que este 10 de Junho de 2024 queira dizer: tragédias como as de 2017 nunca mais, futuro mais igual e menos discriminatório para todas as terras, e para todos os portugueses, dever de missão, lugar para a esperança, a confiança, e o sonho, sempre, mesmo nos instantes mais sofridos da nossa vida coletiva”, afirmou o chefe de Estado, em Pedrógão Grande.
Numa intervenção de cerca de 10 minutos, na cerimónia militar comemorativa do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, Marcelo Rebelo de Sousa considerou que este 10 de Junho celebra Portugal “todo, uno, na sua diversidade”.
O Presidente da República escolheu para palco destas comemorações três concelhos do distrito de Leiria afetados pelos incêndios de 2017 – Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera – e Coimbra, onde terão hoje à tarde início as celebrações dos 500 anos do nascimento de Luís de Camões.
“Que outro 10 de Junho conseguiria ser tão completo assim, não omitindo a tragédia e a morte, mas sonhando com a redenção e a vida?”, interrogou.
Marcelo Rebelo de Sousa começou o seu discurso declarando que “Portugal não é só mar, oceano, litorais”, nem “só interiores, mais ou menos profundos”, nem feito só da “história, cultura, ciência dos letrados”, nem da “história, cultura, ciência do povo anónimo”, nem se resume à “memória das glórias”, nem “dos fracassos, dos dramas, das tragédias”.
“Portugal é tudo isso, e é um só, um mesmo Portugal. E o 10 de Junho, ao celebrar Portugal, celebra-o todo, uno, na sua diversidade. Celebra-o tão depressa junto ao oceano, como no interior mais recôndito. Celebra-o no urbano metropolitano mais recente, como no rural das raízes mais antigas. Celebra-o nas glórias mais esplendorosas, como nas tragédias mais dolorosas”, acrescentou.
O Presidente da República quis que estas comemorações fossem “um retrato fiel desse Portugal, uno na sua diversidade”, e por isso começaram “em terras longe do mar, que não são nem foram capitais de distrito ou sedes de diocese”, evocando os incêndios de 2017 e todas as suas vítimas.
Este 10 de Junho “evoca o passado, mas quer sobretudo dizer futuro, reconstrução, novos jovens, novos residentes, nacionais e estrangeiros, novos sonhos” para estes territórios.
As populações que aqui vivem não podem ser vistas como “menos portugueses, menos cidadãos, menos cultos, na cultura da vida, como na cultura das letras, menos portadores de esperança”, defendeu.
Na sua intervenção, o chefe de Estado e comandante supremo das Forças Armadas descreveu os portugueses como um povo orgulhoso do passado, combatente, que supera adversidades e tragédias.
A este propósito, fez um elogio aos actuais e antigos militares portugueses: “Que o digam os nossos antigos combatentes, os nossos soldados, os de ontem como os de hoje, os do futuro, tantos aqui presentes, garantes da nossa soberania, da nossa soberania, da nossa liberdade, da nossa vocação universal”.
“Portugal é assim. Portugal é assim aqui em Pedrógão Grande, em Castanheira de Pera, em Figueiró dos Vinhos. Mas também em Leiria, em Coimbra, e mais as dezenas de concelhos devastados em 2017, e renascidos e a quererem renascer, sem auto-compaixões, com exigência, com coragem, com ambição”, prosseguiu.
Segundo o chefe de Estado, Camões “teve um pouco de tudo dos diversos Portugais” e deve ser uma inspiração “até no instante final da sua vida, quando, pobre, ignorado, ostracizado, esquecido por quase todos, se imagina que temeu que, com a sua partida, pudesse partir também a independência” do país.
“Portugal restauraria a sua independência, Camões seria reconhecido e admirado e o nosso caminho secular continuaria até hoje”, salientou.
Bombeiro Rui Rosinha pede compromisso sério com coesão
bombeiro Rui Rosinha, que ficou gravemente ferido nos incêndios de Pedrógão Grande, em Junho de 2017, pediu hoje ao Governo e à oposição um “compromisso sério” com a coesão e criticou medidas que não saem do papel.
“Neste Dia de Portugal, aproveitamos o foco desta celebração para, na presença do Governo e representantes da oposição, apelar a um compromisso sério com estes territórios de baixa densidade”, afirmou Rui Rosinha, em Pedrógão Grande, na cerimónia militar comemorativa do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.
Perante o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, membros do seu Governo e representantes de partidos na oposição, Rui Rosinha pediu uma “séria e verdadeira coesão territorial, social e estrutural, e não apenas medidas em papel sem concretização efetiva”.
O bombeiro foi convidado pelo chefe de Estado para discursar nas comemorações do Dia de Portugal, este ano centradas em Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera, os concelhos mais afetados pelos fogos de junho de 2017, que provocaram 66 mortos e 253 feridos, além da destruição de casas, empresas e floresta.
Rui Rosinha, de 46 anos, era chefe de uma viatura dos Bombeiros Voluntários de Castanheira de Pera mobilizada para estes fogos e na qual seguiam mais quatro bombeiros. Um deles – Gonçalo Conceição – morreu.
No discurso, o bombeiro, que pertence ao quadro de honra da corporação, recordou os fogos, lembrando os mortos – especialmente o colega Gonçalo Conceição – e os feridos, para sublinhar que as cicatrizes “são profundas e irreparáveis”.
“A tragédia expôs muitas das nossas vulnerabilidades, mas também destacou a nossa união e resiliência como nação”, assinalou, referindo que “a região afetada mostrou ao mundo a força da solidariedade portuguesa”, sem esquecer a ajuda de comunidades estrangeiras.
Contudo, Rui Rosinha, que fez a intervenção numa cadeira de rodas, considerou que “pouco chegou ao território”, e “a burocracia é pesada e demorada”.
“O caminho para a recuperação tem sido bastante difícil”, admitiu, defendendo que se deve “pugnar para que a região afetada não apenas se recupere, mas se fortaleça, com infraestruturas mais seguras, serviços de emergência mais musculados e políticas ambientais e florestais que previnam futuras tragédias, já que as alterações climáticas são uma realidade diária”.
Para o bombeiro, “é essencial investir em actividades económicas sustentáveis que garantam um futuro próspero e, principalmente, digno para os habitantes da região”.
Depois, Rui Rosinha apontou os “problemas estruturantes” com os quais se defronta quem vive, deseja estabelecer-se, investir ou fazer turismo nestes concelhos do norte do distrito de Leiria.
Falta de médicos, pouca oferta de transportes públicos, a “via extremamente perigosa” que é o Itinerário Complementar 8 na região, falhas nas telecomunicações, ofertas limitadas na educação ou a ausência de empregos são os exemplos que apontou.
“Apesar de todos estes problemas e dificuldades que poderiam, facilmente, nos levar a desistir e abandonar esta região, continuamos aqui, resistindo estoicamente e com grande determinação para transformar este território, tornando-o mais atraente, justo, seguro e, sobretudo, coeso”, continuou Rui Rosinha.
O bombeiro, que se definiu como optimista, disse ainda aspirar “por um Portugal onde todos os cidadãos, independentemente do seu local de residência, possam viver com dignidade, segurança, esperança e sem discriminação negativa”.
“Que todos os portugueses, tanto os que vivem em Portugal quanto os da diáspora, aprendam com o passado, se unam no presente e trabalhem juntos por um futuro onde a segurança, a prosperidade e o bem-estar sejam uma realidade para todos”, adiantou.
Para Rui Rosinha, a homenagem às vítimas mortais da tragédia de Pedrógão Grande passa por se “continuar a lutar por um país mais forte e resiliente”.
“Que o espírito de solidariedade, união e justiça nos guie rumo a um futuro melhor para todos”, acrescentou o bombeiro, terminando com “Viva Portugal”.