Dois empresários de futebol foram hoje condenados em Leiria a prisão efectiva por 13 crimes de auxílio a imigração ilegal, num processo em que o ex-presidente do Grupo Desportivo “Os Nazarenos” João Zarro e o clube foram absolvidos.
Na leitura do acórdão, no Tribunal Judicial de Leiria, a juíza presidente afirmou que o tribunal colectivo julgou parcialmente procedente e provada a acusação, tendo condenado os empresários, estrangeiros, por 13 crimes de auxílio à imigração ilegal na pena de três anos de prisão por cada um.
Em cúmulo jurídico, os arguidos foram condenados a seis anos de prisão.
Estes dois arguidos, um dos quais esteve sempre ausente do julgamento, foram absolvidos de quatro crimes de auxílio à imigração ilegal e de 17 crimes de tráfico de pessoas, dois dos quais agravados, que lhes estavam igualmente imputados pelo Ministério Público (MP).
Quanto ao ex-presidente de “Os Nazarenos” João Zarro e ao clube, também acusados por 17 crimes de tráfico de pessoas, dois dos quais agravados, e 17 crimes de auxílio à imigração ilegal, o coletivo de juízes determinou a sua absolvição.
Para o colectivo de juízes, não ficou provado que o antigo dirigente, por si ou em representação do clube, tenha decidido contratar jogadores estrangeiros para jogar futebol profissional na Europa e que estivessem dispostos a jogar em clubes de divisões regionais a troco de quantias monetárias baixas, prometendo-lhes o progresso para uma carreira de futebol em divisões superiores.
O caso remonta a 2018, quando João Zarro foi abordado pelos dois agentes que se apresentaram “como empresários da área do futebol”.
Os empresários decidiram, para “obter proventos económicos”, aliciar jogadores de futebol de nacionalidade brasileira e peruana que pretendessem jogar futebol, a nível profissional, na Europa.
Aos atletas prometeram boas condições de trabalho, de alojamento, de alimentação, assim como o tratamento das questões logísticas da transferência internacional e a legalização em Portugal, além da assinatura de um contrato de trabalho e um bom salário, com a promessa de uma transferência para outros clubes de maior importância a nível nacional e internacional, apesar de saberem que não o iriam cumprir.
Para facilitar a operação de aliciamento e credibilizar a transferência dos jogadores, os dois empresários apresentaram-se como sócios-gerentes de uma sociedade de agenciamento de jogadores. Através dessa sociedade, celebraram um acordo com o clube, através do seu presidente, válido para a época 2018/2019.
O acórdão elenca depois os 13 jogadores que foram aliciados pelos agentes, pormenorizando os valores que os atletas despenderam para virem para Portugal, como chegaram até à Nazaré, onde e como ficaram instalados, e o dinheiro que receberam por jogar no clube (um deles recebeu apenas 20 euros e outros nada), descrevendo ainda que a alimentação fornecida por aqueles era “escassa e de má qualidade”, além de esporádica, pelo que as vítimas, em diversas ocasiões, “passaram fome, por não terem dinheiro para comida”.
Para o tribunal, “ao não proporcionarem alimentação e habitação condigna” aos atletas tal como se tinham comprometido, “ao não diligenciarem pela legalização” em Portugal, além de não lhes proporcionarem rendimento, os arguidos sabiam que deixavam aqueles numa situação em que eram incapazes de resistir, de se opor ou de se sustentar pelos seus próprios meios de forma conveniente, ficando na sua total dependência.
Este caso foi tornado público em março de 2019 pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que desencadeou uma operação na qual fez buscas, tendo detido os agentes e constituído arguidos o à data presidente e o clube.
Na ocasião, em comunicado, “Os Nazarenos” fizeram saber que nem o clube, nem nenhum membro da sua direção, “fazem ou fizeram parte de um esquema” de tráfico de pessoas, nunca prometeram “fosse o que fosse a qualquer atleta estrangeiro” e nunca receberam, “dos atletas, dos seus familiares ou de quaisquer representantes seus, qualquer quantia monetária ou qualquer outro tipo de vantagem económica”.
Através do comunicado, aquele emblema dizia ainda que foi o clube e os seus dirigentes que “resgataram os atletas estrangeiros que foram, literalmente, abandonados pelos empresários”, tendo providenciado pelo seu sustento.